Foi-se o tempo em que eram necessários
dias - até mesmo meses - para que o lançamento do álbum de uma banda chegasse até as
mãos dos fãs mais remotos (como eu) e para que esse o replicasse entre seus amigos
através de fitas k7 gravadas à mão. As formas mais primitivas de propagar o lançamento de
um disco qualquer de heavy metal aos poucos foram substituídas pelo download
ilegal e, mais recentemente, pelos serviços de streaming. Então, dessa vez - diferente do final
dos anos 1990 - precisei apenas atualizar o feed do meu aplicativo de música para ter acesso
ao novo disco de uma das minhas bandas favoritas, o Children of Bodom.
Hexed é uma gíria utilizada para
descrever uma pessoa que está completamente fora de si - geralmente “induzida” por substâncias
ilícitas - e dá título ao décimo álbum do quinteto finlandês conduzido por Alexi Laiho.
As primeiras impressões deram-se através da arte da capa - criada por Deins Forkas - do
tracklist e do primeiro single disponibilizado, a música “Under the Glass of Cover”. A
canção, que também ganhou um vídeo de divulgação, apresenta uma banda com uma sonoridade
mais séria e madura, mas sem o ímpeto criativo de outrora, transitando entre todas as
fases do grupo, da mais melódica e virtuosa à mais
crua e moderna, agradando - ou
desagradando - desde os fãs mais antigos até aqueles que surgiram após Are You Dead Yet?.
Passados mais de vinte anos do lançamento
do debut Something Wild (1997), o Children of Bodom tornou-se uma vítima de
algo que eles próprios criaram, e após o lançamento de seus inovadores quatro
primeiros álbuns de estúdio, eles enveredaram por novos caminhos, com uma
sonoridade mais direta e menos elaborada do que aquela praticada nos primeiros
anos de banda, quando deram cara nova ao death metal melódico, utilizando-se de
elementos não experimentados por outras bandas dessa mesma vertente.
Mais duas músicas de trabalho foram
lançadas antes do disco sair em definitivo. Se “Platitudes and Barren Words” segue a
mesma linha do primeiro single, “This Road” me criou algo que eu não gostaria de
criar a respeito deste novo disco: expectativas. “This Road” mostra uma sonoridade mais
encorpada e intrincada, com ótimos riffs e uma excelente linha de baixo, cheia de
mudanças de andamento e clima. Tudo o que fez o COB virar referência naquilo que criaram
está nesta canção, me tirando completamente da neutralidade pela qual eu aguardava o
nascimento de Hexed.
A própria “This Road” abre o disco,
seguida pela também já citada “Under Grass and Clover”. “Glass Houses” é mais direta
que as anteriores, com riffs pesadíssimos e com curtíssimas intervenções melódicas e
duetos de Alexi Laiho e Janne Wirman nas guitarras e teclados, lembrando pouco a principal
característica que a fez conhecida, com uma roupagem mais próxima àquela praticada
em discos como Relentless Reckless Forever. As quebras de ritmo ditadas pelo
baterista Jaska Raatikainen são o destaque dessa faixa.
Ao iniciar “Hecate’s Nightmare” tive
que verificar se meu serviço de streaming não havia me direcionado por engano para o disco The
Dark Ride do Helloween, mas era de fato uma das canções de Hexed. A quarta
faixa me causou uma estranheza muito grande com sua intro “dançante” e
cheguei a pensar que fosse algum dos covers improváveis que o COB costuma fazer de
bandas de fora da cena da música pesada. Se por um lado a banda tenta fazer algo
diferente, com uma abordagem mais próxima a uma balada - dentro de suas características
- como fez em “Angels Don’t Kill”, ou à músicas mais cadenciadas como em “Punch Me I Bleed”,
por outro, falta espontaneidade no experimento e soa completamente forçada. De
qualquer forma, a tentativa foi muito válida e pode
agradar a muitos fãs, mas a mim não
convenceu e após ouvi-la a quantidade de vezes que julguei necessário para falar a
respeito do disco, sempre pulo essa faixa em minhas audições.
“Kick in a Spleen” é uma porrada, com
riffs e pedais duplos poderosíssimos e a mesma sonoridade moderna da fase pós Are You
Dead Yet?, em alguns momentos parecendo até mesmo querer flertar com o entusiasmo
e a sonoridade praticada por bandas de metalcore - não que isso seja um demérito. A música
possui uma quebra de ritmo interessante, seguida de uma ótima intervenção de Janne
Wirman nos teclados, mas solos pouco inspirados.
Ainda assim, é uma das melhores faixas
do disco.
A já citada “Platitudes and Barren
Words”, tem alguns experimentos vocais muito interessantes de Alexi e boas
melodias. A canção, se não acrescenta absolutamente nada a tudo que a banda já criou, ao menos
faz-se mais bem vinda que a maioria das restantes do álbum. Para essa faixa também saiu um
videoclipe típico da banda, remetendo bastante, inclusive, ao clipe de “Sixpounder”.
A faixa-título beira o thrash metal em
alguns momentos. Em outros, flerta com a música clássica (me remetendo muito à Something
Wild) e nela sim podemos ouvir algo mais próximo daquilo que se espera de uma
composição da banda. “Hexed” é a faixa mais longa e que melhor representa a sonoridade do
grupo no disco em que ela carrega o nome, tornando-se minha favorita do álbum,
com riffs pesadíssimos de Alexi e do estreante Daniel Freyberg e uma cozinha precisa dos
sempre competentes Henkka Blacksmith e Jaska Raatikainen, dando a base necessária
para os já conhecidos e tanto esperados solos e duetos frenéticos de Laiho e Wirman.
Os coros do refrão também já são velhos conhecidos e, assim como soaram muito bem
antigamente em “You’re Better Off Dead”, aqui se fazem poderosos e poderiam ser mais
utilizados.
“Relapse - The Nature of my Crime”
começa com um riff completamente heavy,
remetendo-me imediatamente ao
HammerFall (vide “Hearts on Fire”) e mostrando-se uma faixa promissora, que poderia propor
algo novo, mas que de tão preguiçosa, logo retoma a sonoridade das primeiras músicas do
disco. Assim como em Star Wars, “Say Never Look Back” vem com “uma nova esperança”,
iniciando com uma belíssimas melodias e linhas de baixo, mas também não demora a se
tornar mais do mesmo, a não ser por um ou outro riffs
mais inspirados.
A essa altura, muito provavelmente quem
está acompanhando esta resenha pode estar pensando que estou torcendo o bigode
gratuitamente para o disco de uma banda que pouco tenho apreço, quando na verdade
estou sedento por um disco impactante de uma das minhas bandas favoritas de metal.
O Children of Bodom foi um dos precursores do death metal melódico e
dentro deste subgênero ainda foi capaz de se reinventar, e é isso que tenho
esperado há quase 15 anos. Não que tudo que tenha sido lançado neste período seja descartável,
há muita coisa boa, especialmente em Bloodrunk e I Worship Chaos, mas sempre fica
aquela impressão de já ter ouvido aquilo em algum
lugar.
O disco segue com a cadenciada e
melodiosa “Soon Departed”, com alguns bons riffs na linha de “Everytime I Die” e “Prayer
For The Afflicted”, e finaliza com “Knuckleduster”, com intervenções de Wirman que dão toques épicos
à canção, mas nada que salve o álbum da mesmice. (alguém mais sentiu falta de
uma música com “Bodom” no título? Elas nunca decepcionam).
Como bônus, ainda há versões ao vivo
para “I Worship Caos” e “Morrigan” do disco anterior, e uma versão industrial para “Knuckleduster”,
mostrando alguns dos muitos elementos modernos que vem influenciando a
sonoridade da banda nos últimos anos.
Hexed é apenas mais um bom álbum do Children
of Bodom, e em se tratando deles, bom não é grande coisa. De qualquer
forma, tenho ouvido o álbum com frequência, buscando por nuances e elementos novos
que me conquistem e, ao lançarem seu décimo primeiro disco de estúdio, lá estarei
novamente aguardando não por um novo Hatebreeder ou um novo Hate Crew Deathroll, mas
sim por mais um excelente trabalho de uma das bandas mais criativas no metal do
final dos anos 1990, início dos 2000.
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