Discoteca Básica Bizz #176: Dead Kennedys - Fresh Fruit for Rotting Vegetables (1980)



Nos EUA de Ronald Reagan, era preciso peito para batizar uma banda de Kennedys Mortos. Imagine alguém entrar numa loja no Brasil e dar de cara com um disco da banda Fernandas Montenegros Esquartejadas ou Algozes do Frei Damião. O choque seria o mesmo.

E Jello Biafra queria mesmo chocar. Quando ainda era conhecido por Eric Boucher, o rapaz já era revoltado: contra o governo, contra os direitistas, os militares, os yuppies, a sociedade de consumo, o rock. Depois que se mudou para a liberal São Francisco, no fim dos anos 1970, Eric resolveu expelir todo esse ódio em forma de música. O resultado foi o Dead Kennedys.

Seu primeiro LP, Fresh Fruit for Rotting Vegetables, caiu na cena californiana como uma bomba atômica. Até então o punk americano tinha tradição de bandas festeiras, tipo Circle Jerks e Ramones. Política não era o forte. Não havia um Clash ou um Sham 69 na terra do Tio Sam. Mas Jello e seus colegas - o guitarrista East Bay Ray e o baixista Klaus Flouride - mudaram tudo isso.


Fresh Fruit for Rotting Vegetables foi o primeiro manifesto anarquista do punk americano. Com sua voz de personagem de desenho animado, Jello conclamava o povo a matar os pobres ("Kill the Poor"), linchar os síndicos ("Let's Lynch the Landlord"), tomar drogas ("Drug Me"), roubar correspondência ("Stealing People's Mail"), exterminar crianças ("I Kill Children") e visitar o Camboja ("Holiday in Cambodia"). Falava também de guerra química, golpes militares e conspirações direitistas. Tudo isso embalado por uma ironia corrosiva e por uma explosiva combinação de punk, surf music e experimentalismo.

O Dead Kennedys nunca se encaixou na teoria simplista de que punk se faz só com dois acordes e um pulmão forte. Suas músicas têm arranjos elaborados e mudanças inesperadas de ritmo e andamento.

Jello colheu exatamente o que plantou: discórdia e incompreensão. Foi processado por obscenidade, teve discos recolhidos, brigou na justiça e incomodou muita gente. Era uma mosca na sopa da sociedade americana, um câncer - necessário.

Jello levou o lema "faça você mesmo" ao extremo: montou a própria gravadora - a Alternative Tentacles - e lançou todas as bandas de que gostava. Chegou a candidatar-se a prefeito de São Francisco, propondo que os policiais usassem nariz de palhaço. Teria o meu voto, fácil.

Texto escrito por André Barcinski e publicado na Bizz #176, de março de 2000

Comentários

  1. Essa banda perdeu totalmente meu respeito, pra ela só valida com Jello Biafra, o resto é buraco. Parabéns pela ótima resenha como sempre. Vida Longa.

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