Sou um cara fora de moda. Pra começar, ainda compro CDs.
E, veja só: costumo ouvi-los em casa, ao invés de deixá-los apenas expostos na
estante. Tem outra coisa que também faço e não vejo muito por aí: não elogio
uma banda brasileira só por ela ser brasileira. Não acredito que o
corporativismo e o relativismo sejam o caminho para a construção de uma cena
cada vez mais criativa, relevante e forte aqui no Brasil. No meu modo
de ver, isso deve ser feito de outra maneira: com bandas criativas, que pensem
fora da caixa e que, por isso mesmo, merecem todo espaço possível para
divulgação de seus trabalhos.
Esse é o caso do Maestrick. Formado em 2004 em São José
do Rio Preto, o grupo – que conta atualmente com Fabio Caldeira (vocal, teclado
e piano), Renato Somera (baixo e voz gutural) e Heitor Matos (bateria) -, lançou
no final de 2018 o seu segundo álbum, Espresso Della Vita: Solare, que acabou
de chegar em minhas mãos. O disco é o sucessor de Unpuzzle! (2011) e mostra uma
clara evolução em relação à estreia. Adair Daufembach responde pela guitarra (e
também pela produção, ao lado da banda) e Rubinho Silva pelos violões, em
participações especiais.
O Maestrick abriu o leque em Espresso Della Vita: Solare.
A sonoridade, que já dava pistas de querer romper os limites do prog metal,
aqui faz isso sem cerimônias. A inclusão de elementos de música brasileira,
como a viola que introduz “Rooster Race”, ganha a companhia de uma melodia que
é o mais puro som de Liverpool na deliciosa “Daily
View”. E as experimentações seguem por todo o trabalho, mostrando uma inquietação
criativa muito positiva. Orquestrações e camas de teclados discretas pontuam a maioria das músicas,
enquanto melodias e pontes que não escondem a influência do Queen aparecem aqui
e acolá, como demonstra “Keep Trying”.
A veia prog surge forte na grandiosa “The Seed”, com
rupturas de dinâmicas e andamentos quebrados bem na escola mais ortodoxa do
gênero. Os belos coros que introduzem e encerram a canção são outro destaque
naquela que é, provavelmente, a música mais progressiva do disco, superando os 15
minutos de duração e com lindas passagens instrumentais (aliás, a melodia de piano
que surge na parte final me lembrou de maneira sutil a arrepiante “Tubular
Bells”, de Mike Oldfield, presente na trilha do filme O Exorcista, de 1973).
Este é o alicerce central do disco.
A grandiosidade de “The Seed” é quebrada por “Far West”,
bem mais direta e com um trecho central em que a banda traz a música circense
para a ordem do dia. Em “Penitência” o grupo canta em português uma espécie de
repente prog metal sensacional, mostrando mais uma vez o quanto a presença de
ritmos regionais e de um tempero étnico são caminhos sempre bem-vindos para
destacar uma banda. Uma música linda! Essa abordagem é retomada em “Hijos De La
Tierra”, com a letra trazendo trechos em espanhol e inglês.
O CD vem em um belo digipack feito da maneira que deve ser
feito, e não como algumas gravadoras brasileiras tem produzido ultimamente,
como a vergonhosa edição nacional do último álbum do Ghost, Prequelle, por
exemplo, cujo digipack parece feito de papel sulfite. Aqui a coisa é outra, com
papel de alta qualidade, impressão excelente e um longo encarte de 23 páginas com todas as letras e ilustrações exclusivas para cada uma delas. Vale
mencionar que a Som do Darma (empresa de agenciamento e assessoria de imprensa) e
a Die Hard (loja de discos de São Paulo) ajudaram a viabilizar o projeto.
Espresso Della Vita: Solare é um trabalho riquíssimo, com
uma pluralidade musical desconcertante e onde o Maestrick faz questão de
mostrar que consegue trilhar pelos mais variados caminhos, porém sem
nunca fazer essas escolhas soarem pedantes ou desnecessárias. Um álbum muito
bonito e acima da maioria do que se produz aqui no Brasil, com um resultado
final que mais uma vez impressiona e mostra o quanto essa banda é incrível.
Um disco assim dá vontade de elogiar por dias e merece todos os
aplausos possíveis, tendo ele sido gravado por uma banda brasileira ou não.
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