Quando estava introduzindo sua fase fusion, por volta
de In a Silent Way (1969) e Bitches Brew (1970), Miles
Davis teve de aporrinhar seus pianistas para que usassem teclados eletrônicos.
Ou melhor, teve de aporrinhar Chick Corea, Joe Zawinul e Keith Jarrett - porque
o versátil Herbie Hancock nunca se vexou com o jazz plugado. Pelo contrário,
mesmo na fase acústica ele já gostava de gadgets: levava um protótipo de
gravador portátil aos shows e o deixava embaixo do piano.
Depois, Hancock gravou álbuns em que fez recombinações de
seu jazz classudo e climático com fragmentos de boogie elétrico - Crossings (1972) e Sextant (1973),
em que os créditos das programações de Moog e ARP vão para Patrick
Gleeson. Ecléticos sim, até afro-tecno-primitivo-futuristas (numa estranha
junção de codinomes tribais e processamento eletrônico), mas ainda assim discos
"de jazz'.
Nada que alertasse para o balanço sem volta de Head
Hunters. Por trás de uma daquelas estantes gigantes de teclados e efeitos -
piano, Rhodes, clavinete, órgão, sintetizadores, mellotron, echoplex -, como um
Rick Wakeman negão, Hancock comandou o mais fulminante destacamento do
jazz-funk: Bennie Maupin no sax, Paul Jackson no baixo, Harvey Mason na bateria
e Bill Summers na percussão.
Na capa ele desaparece atrás de uma máscara tradicional
africana onde V.U.'s e potenciômetros substituem os búzios. A primeira coisa
que se ouve é uma levada sintética de baixo que é suingue e galhofa puros. Faça
a experiência: toque os primeiros compassos de "Chameleon" em
qualquer festinha black, electro-rock ou hip-hop e as mentes seguirão as
bundas. Até o início dos anos 1980 Herbie testou a receita em meia dúzia de
álbuns, alguns deles realmente comerciais, enquanto cultivava o jazz acústico
em paralelo.
Só para dar uma ideia do imaginário do cara, na
ilustração da capa de Thrust (1974) ele pilota uma espaçonave sobre
Machu Picchu. Então, em 1983, veio Future Shock, nova obra-prima com Bill
Laswell e o hino break "Rock It" fazendo dançar os b-boys em todo o
universo.
Texto escrito por Alex Antunes e publicado na Bizz #195, de
novembro de 2005
lembro até hoje a primeira vez que ouvi Chamaleon! Sensacional
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