Há incontáveis razões que fazem de Sinsemilla,
estreia internacional do Black Uhuru, um álbum como nenhum outro. Emblemático,
foi lançado no começo de uma década crucial para o reggae, pouco antes da morte
de Bob Marley (1981), e também antecedendo o surgimento do dancehall e sua
variação toast,o ragga (1985) - gêneros que seguramente devem sua existência à
liberdade estética trazida por essa obra angular.
Estranho, apresentava um reggae seco e pesado, de outra
ordem ou categoria, ainda que bastasse juntar as peças para perceber ali as
melhores escolas do ska, do rock steady, do dub, assim como do funk, do soul e
do rock. Dá pra dizer que o melhor da música jamaicana dos anos 1960 e 1970,
bem como outras influências que bateram na ilha, estava ali resumido e
embrulhado para presente.
Por trás desse resultado faiscante estavam Sly Dunbar
(bateria) e Robbie Shakespeare (baixo), os embaixadores do groove jamaicano,
que a partir daí consolidaram internacionalmente sua fábrica de ritmos
(gravaram com Bob Dylan, Rolling Stones, Joe Cocker, Bill Laswell, e seguem na
moda). E neste disco em especial como produtores, Sly & Robbie fizeram com
que o trio vocal, então formado por Michael Rose, Derrick Simpson e Puma Jones,
reinventasse o jeito jamaicano de harmonizar, com timbres exóticos e
vocalizações carregadas de lamúria e fado, pontuando o ataque devorador de uma
senhora banda. Estão ali Ansel Collins (teclados), Radcliffe 'Dougie' Bryan
(guitarra líder), Bertram “Ranchie” McLean (guitarra rítmica) e Uziah “Sticky”
Thompson (percussão), que já eram lendas na época.
Hoje, em tempos de banalização do discurso rasta e seus
bordões, os temas das oito faixas de Sinsemilla talvez soem meio
carne-de-vaca, a começar pela faixa-título, expressão que vem do espanhol
"sem semente", virtude de um tipo forte de maconha. Mas no início da
década de 1980, ora, tinham lá o seu frescor. E nem é preciso perder tempo com
isso, porque não é a poesia que faz do álbum esse símbolo augusto: o tesouro
está em sua sonoridade, em seus arranjos, nos riffs explosivos de guitarra, na
voz de Michael Rose, no quase transe inspirado pelos backing de Puma Jones
(morta de câncer em 1990), e, acima de tudo, na massa firme e criativa de Sly
& Robbie.
Red (1981), Chill Out (1982) e Anthem (1983)
costumam ser bastante reconhecidos - o terceiro, inclusive, faturou o Grammy de
melhor álbum de reggae. Mas, cá entre nós, Sinsemilla é o ovo e a
galinha.
Texto escrito por Otávio Rodrigues e publicado na Bizz #196,
de dezembro de 2005
Sinsemilia é uma pérola do reggae raiz... quem gosta de reggae devia ouvir black uhuru!
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