Review: Alceu Valença & Geraldo Azevedo - Alceu Valença & Geraldo Azevedo (1972)



O primeiro trabalho de Alceu Valença e Geraldo Azevedo é uma pérola escondida da boa música brasileira que combina diversos estilos nordestinos com rock psicodélico. Os arranjos - que seriam feitos por Hermeto Pascoal - acabaram com o experiente maestro tropicalista Rogério Duprat, que optou por utilizar o sistema quadrafônico na gravação. Esta era a coqueluche daquele início de anos 1070 e nada mais era do que utilizar quatro canais independentes de som vindos de quatro pontos diferentes da sala de gravação, ao invés dos tradicionais dois canais. A novidade chamava tanto a atenção do público que o nome deste sistema ficou estampado na capa do disco em tamanho exagerado, por isso que o disco é conhecido como Quadrafônico, mesmo este não sendo seu título. De qualquer forma, o preço dos equipamentos para se executar este álbum seria enorme e o projeto acabou não vingando. 

Voltando ao disco, a gravação do material todo foi um perrengue daqueles. A dupla já vivia no Rio de Janeiro, mas a extinta gravadora Copacabana pediu para que eles fossem gravar em São Paulo. O problema era que as horas de estúdio eram muito poucas, mas Alceu e Geraldo queriam muito este álbum e a solução foi gravar escondidos, de madrugada.   

"Me Dá Um Beijo" abre o LP com uma mescla de baião e rock, mostrando a diversidade, criatividade e talento da dupla que estaria presente em todas as canções. "Virgem Virgínia" é uma balada que conta com as famosas orquestrações de Duprat, que dão o toque tropicalista ao disco, enquanto "Mister Mistério" tranquiliza os ouvidos com um ritmo mais suave e descontraído. "Novena" surge com toda a classe e marca presença - de longe um dos pontos altos do álbum, que consegue viajar e levar os ouvintes para um ambiente de sertão e fé. O DNA do nordeste surge em todo seu esplendor em "Cordão do Rio Preto", que consegue mesclar frevo com psicodelia, tal qual a paranoica e frenética "Planetário", que possui uma letra absurdamente viciante sobre uma mulher que foi ao analista e ainda não voltou.


"Seis Horas" abre o lado B e se refere à vida moderna e ao comportamento artificial das pessoas reféns do cotidiano. "Erosão" tem os arranjos caóticos de Duprat e prepara o ouvinte para "78 Rotações", uma canção praticamente progressiva em que Alceu Valença se aproveita do entrosamento do baixo e piano com a percussão na medida certa para desfilar uma letra poética cheia de referências ao seu estado, Pernambuco. "Talismã" é uma canção acústica e bucólica que usa e abusa de dedilhados (uma característica deste disco) e de acordes mesclados com orquestrações. Uma das melhores do álbum, sem sombra de dúvida.

"Ciranda de Mãe Nina" e "Horrível" encerram o disco com muitas referências ao nordeste nos arranjos e letras. Um desfile de maracatu, frevo, repente, moda de viola e rock psicodélico. Quadrafônico (apesar de não ser este o seu título) é um registro fantástico que passou batido por muito tempo. Disco obrigatório para quem adora MPB e rock nacional daqueles bem arretados.

Destaque do trabalho: "Planetário" tem diversos elementos que estão presentes nas demais canções, e ainda por cima dá vontade de sair chutando tudo. Fico com ela.

Por Aroldo Antonio Glomb Junior 

Aroldo Antonio Glomb Junior tem 41 anos, é jornalista, Athleticano e fanático por boa música desde que completou seus 10 anos de idade. É o autor do projeto SOBRE O SOM DOS SETENTA, que reúne resenhas de diversos discos lançados durante os anos 1970, escrevendo desde clássicos da década até discos mais obscuros, independente do estilo.  

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