
Em 2008 Steve
“Lips” Kudlow e Rob Reiner estavam no evento de premiação do People´s Choice
Awards concorrendo ao prêmio de melhor documentário com Anvil! The Story of
Anvil quando o vocalista reconheceu (e como não reconhecer?) Paul McCartney
sentado em uma das mesas à pouco mais de vinte metros de onde estava.
Lips se conteve
até ser anunciado o vencedor de sua categoria e assim que o resultado foi
divulgado - que eles não venceram cabendo à um documentário sobre golfinhos o
prêmio – ligou o “foda-se” e se levantou para se dirigir à mesa do Beatle,
provavelmente para pedir um autógrafo, quando foi agarrado (literalmente) por
Quentin Tarantino. “Estes bastardos deram o prêmio para alguns peixes, cara!”, gritou o diretor. Lips, agradeceu o apoio, balbuciou algo sobre ser muito bom
encontrar com Tarantino, pediu desculpas e disse que queria muito falar com
Paul.
Ao chegar à mesa
de McCartney, que estava cercado por amigos e sua equipe, viu um assustado Paul
olhar em direção a eles e reconhecer o baterista Rob Reiner sem fazer esforço.“Oh, meu Deus!
São os caras do Anvil! Será que teremos algum rock esta noite?”, gritou Paul, e
desmontou qualquer ação de fã que pudessem ter Lips e Rob naquele momento. Algum
tempo depois, em uma entrevista para o Chicago Tribune, Lips disse que saber
que Paul McCartney os conhecia foi a coisa mais legal que aconteceu a eles
desde a formação da banda, em 1973.
Exageros à parte,
quando se assiste o documentário que concorria ao prêmio do People´s Choice
Awards é quase possível acreditar que aquelas palavras ditas ao jornal eram
verdade. A história do
Anvil é igual a de muitas bandas surgidas durante o boom da NWOBHM (New Wave of
British Heavy Metal), movimento que deu ao mundo, entre outros, Iron Maiden,
Saxon e Manowar.

Logo na abertura,
uma sequência de all stars do rock tece tantos elogios ao grupo que um
desavisado acaba pensando que se trata de mais um filme sobre rock stars
milionários e famosos, mas assim que Lemmy, Lars UIrich, Slash, Tom Araya e
alguns outros somem da tela o que se vê é apenas a história de dois caras que
conseguiram projeção durante um bom período de uma cena iniciante e depois (por
problemas de crise criativa ou apenas saturação do mercado) caíram em certo
nível de ostracismo que, não dificilmente, implode carreiras, destrói pessoas e
pode levar a depressão.
Lips trabalha em
uma espécie de empresa que fornece comida à escolas e fábricas enquanto Rob
Reiner defende uns trocados reformando casas em Ontário, no Canadá. Amigos
desde sempre, o documentário mostra um pouco da origem do grupo, quando os dois
se conheceram, e passa rapidamente pela discografia da banda, retornando ao
ponto em que tocam nos fins de semanas em bares canadenses para não mais que
vinte ou trinta fãs.
Alguns, como Mad
Dog (apelido, claro) os acompanham desde o primeiro disco e diz com orgulho que
além de fã é amigo dos caras, já tendo recebido em sua casa e das mãos de Lips discos,
camisetas, vídeos e até convites para festas em sua casa.
Histórias como as
de uma turnê roubada pelo leste europeu e terminando na Itália seriam
deprimentes se não acabassem tão engraçadas. A agente, uma italiana de meia
idade que também é fã do grupo, fecha shows em bares na Europa com a promessa
de receberem algo em torno de mil e quinhentos euros por show e muita
divulgação, mas na maioria dos lugares por onde passam acabam não recebendo um
centavo sequer e a divulgação não passa de folhas de sulfite escritas com
pincel atômico. No show com maior público, vinte testemunhas aparecem para ver
Lips e Reiner quase irem as vias de fato com o dono do bar, que alega atraso na
chegada da banda ao local para não pagar após o show. Chega a ser engraçado um
dos espectadores se apresentar como advogado e aconselhar os dois a não só
processar o contratante como também a trocar de agente: “Sua agente é uma
bosta!”, diz ele para o grupo.
De volta ao
Canadá, seguem-se discussões sobre o futuro da banda, depoimentos de parentes
(mães, pais, esposas, amigos) sobre a dedicação cega dos dois ao grupo sem
nunca desistir, mesmo estando quase esquecidos.

A redenção começa
quando o antigo e famoso produtor musical Chris Tsangarides os contata para
saber se eles têm material suficiente para fazer um novo álbum e os convida à
sua casa na Inglaterra e – claro – diz o quanto terão que gastar. Sem o
dinheiro necessário, se aventuram por diversos empregos e Lips chega até a
trabalhar em uma empresa de telemarketing indicado pelo fã (e amigo) Mad Dog,
mas por não conseguir mentir sobre a qualidade dos produtos que vende (óculos
de sol) se demite sem conseguir um só dólar em vendas. A situação se resolve de
uma forma muito comum ... para bandas iniciantes: a irmã mais velha de Lips
acaba lhe dando o dinheiro e dá um depoimento comovente sobre como quer que o
irmão seja feliz correndo atrás de seus sonhos, mesmo que ele já esteja com
mais de cinquenta anos de idade.
Tanto sofrimento
contrasta com a felicidade de terem sido convidados a participar de um festival
no Japão, onde a banda viveu alguns dos melhores momentos de sua carreira e ao
chegar por lá, inseguros com o medo de não haver mais do que dez fãs à sua
espera no local do show, se surpreendem com o quanto ainda são populares e
queridos.
Filme mais que
indicado para fãs de rock, heavy e afins e para quem acha que o fato de gravar
(bons) discos (no caso do Anvil, mais de quinze) garante um “para sempre” no
auge. E claro, para quem gosta de boas histórias.
Por Ron Groo
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