Review: Matriarca – Leather Heart (2019)



A cena heavy metal de Florianópolis ganhou recentemente mais um registro de peso no seu cenário em plena ebulição. Acompanhando importantes lançamentos dos últimos anos em terras catarinenses (vide bandas como Red Razor e Raging War, entre tantas outras), a Matriarca, fundada em meados de 2014/2015, lança seu primeiro EP intitulado Leather Heart, que já nasce com o status de um dos discos mais pesados e criativos lançados no estado.

Misturando pitadas de classic rock, heavy netal tradicional e metal extremo naquilo que a própria banda vem chamando de extreme rock and roll, suas variadas influências servem apenas como pano de fundo para a originalidade do som praticado pelo quarteto formado por Lucas Miranda (guitarra, vocal e compositor principal), Willian Bernardo (vocal), Gabriel Porto (bateria) e Daniel Rosick (baixo), e produzido por Júlio Miotto.

Ouvi o disco incansavelmente na oportunidade de seu lançamento e voltei a escutá-lo mais recentemente para escrever a respeito e me certificar de que era realmente tão bom quanto antes ou se não se tratava de mera empolgação momentânea. A surpresa boa é o que o disco fica ainda melhor, mais sólido e convincente a cada nova audição e aqui estão minhas impressões a respeito desses cinco excelentes petardos.

A faixa título abre o disco e pega o ouvinte desatento de surpresa quando os riffs à la Phil Campbell, totalmente calcados no heavy e rock and roll clássicos, são sucedidos pelos vocais demoníacos de Will. O black, death, thrash, rock  e metal são todos jogados no mesmo bolo e dessa receita improvável surge um som arrebatador e surpreendentemente bom. Essa combinação pode não ser novidade para os fãs da música pesada, mas poucas vezes antes um registro com tamanha miscelânea me chamou e prendeu a atenção pela qualidade e por não soar completamente perdido como em outros casos, remetendo-me com propriedade ao Satyricon e ao que o Abbath fez em “Between Two Worlds”, do seu projeto solo I.

“Leather Heart” abre com a faixa homônima onde, afora os vocais, a sonoridade é bastante tradicional e direta, com riffs pesados, solos muito bem posicionados e executados, bateria pesada e sem firulas, baixo rosnante e coros nos moldes do Exodus, como se a banda quisesse preparar o terreno, dando uma introdução a sua fórmula, que seria melhor explorada no decorrer do álbum. Segundo Lucas, compositor da música, seu riff principal surgiu quase sem querer ao apresentar a ideia da sonoridade da banda para o então futuro vocalista, Willian.

“Carried by Southern Wind” surge com uma pitada maior de peso que a anterior, flertando com o hardcore e com destaques particulares notórios. Se a anterior introduziu ao disco, a segunda faixa parece apresentar um por um dos músicos e suas qualidades e características individuais, indo da abertura puxada pela bateria e sua condução bastante variada até os pedais duplos muito bem explorados na parte mais extrema da música, das partes cantadas mais declaradamente até os inspirados urros demoníacos, dos riffs sujos e precisos (e uma pegada que me lembrou o Rage em Soundchaser) ao belíssimo e bem trabalhado solo, da linha cavalgante de baixo até o momento que a banda silencia para a cozinha mostrar seu entrosamento (remetendo à sonoridade do Torture Squad em Æquilibrium). A condução da música em sua parte final é um convite irrecusável a bater cabeça.

Em “Holes to Bury the Dead” a banda pisa no acelerador. O lado mais clássico do rock e do heavy são deixados um pouco mais de lado e o peso come solto num thrash veloz e vigoroso, com destaque para a passagem por volta dos 2:20 que mostra todo o entrosamento dos músicos. Dessa parte em diante a música oscila seus tempos e o clima de maneira impecável, com solos de guitarra e baixo, riffs encorpados, passagens intrincadas e quebras de ritmo de um bom gosto e de uma técnica indiscutíveis. A música deve funcionar muito bem ao vivo, o que pode ser conferido no registro que a banda gravou e disponibilizou no YouTube de sua mais recente apresentação, no próprio canal do grupo.

A minha favorita, “Io, Saturnália” segue o caminho contrário de sua antecessora, começando com uma pegada bem heavy e do meio em diante a banda toda parece ter sido possuída pelos ritos de invocação bradados em “Baco, Ínuo, Príapo, Fama, Profano rito. Maculo da alma” e o som se torna eṕico, sombrio, extremo e demoníaco. A interpretação e a sonoridade são tão bem executadas que a canção chega a ser amedrontadora. Destaque também para os excelentes backing vocals e para a parte lírica muito bem construída que mescla trechos em Inglês, português e latim.

“Insidious Doctrine” foi a primeira composição da banda, mas aqui ela é responsável por fechar o EP com chave de ouro, pesadíssima, encorpada e direta ao ponto, numa mistura interessante de peso e boas melodias, deixando o ouvinte, em especial esse que vos escreve, com as expectativas lá em cima por um primeiro full-length da banda, que, apesar deste lançamento recente, vive algumas incertezas de ordem pessoal em relação a seu futuro. Quem curtir o disco ficará na torcida para que a carreira da Matriarca se consolide e nos brinde com inúmeros outros lançamentos com a qualidade desde EP de estreia.

Por Luis Fernando Ribeiro




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