Esbarrei
no filme primeiro através da trilha sonora, que o Spotify me indicou como
sugestão. Well done, já estava fisgado. Um time de estrelas contemporâneas
reinterpretando clássicos e sons mais obscuros daquela cena folk rock e
psicodélica da Califórnia sessentista me atiçou a curiosidade pelo desconhecido
documentário, dedicado à memória de Tom Petty - muito provavelmente a
causa da sua sentida ausência na trilha sonora do filme.
Echo
in the Canyon celebra a música popular que saiu do bairro de Laurel Canyon,
em Los Angeles, em meados dos anos 1960, quando as pessoas se tornaram
elétricas e The Byrds, The Beach Boys, Buffalo Springfield e The Mamas and
the Papas cimentaram o California Sound. Foi um momento (1965 a 1967)
em que as bandas vieram a Los Angeles para imitar The Beatles, e Laurel Canyon
emergiu como um foco de criatividade e colaboração para uma nova geração de
músicos que logo colocaria um selo indelével na história da música popular
americana.
Apesar de
elogios, o filme foi criticado por omissões flagrantes sobre o período
histórico e movimentos como os direitos civis. Também não são mencionados
outros luminares do rock que residiam na área naquele período, como Jim
Morrison e a cantora e compositora Joni Mitchell. Também se reclama que há
muito do século XXI (especialmente pelos artistas em show e estúdios) e não há material
suficiente do próprio período.
E apesar da
condução blasé até demais de Jakob, o filme tem histórias interessantes,
misturando as mesmas com partes das canções regravadas pelos Byrds, Bufallo
Springfield, Mamas and Papas e outros, em apresentações ao vivo e em estúdio. O
documentário passeia pelas 12 cordas dos Byrds, que criaram um gênero
único e extremamente influente de música, que deu um ar de seriedade ao rock,
com poesias e letras políticas. Mostra os Beatles recebendo os Byrds, então sua
banda favorita, na Inglaterra, e Tom Petty afirmando que o som folk dos Beatles
nasceu da resposta americana ao Fab Four, e aborda a influência dos Beach Boys
na concepção de Sgt. Peppers (1967), onde o quarteto foi influenciado pela
audição do fabuloso Pet Sounds (1966).
Uma cena legal é a que Brian Wilson corrige o tom da música dos Beach Boys que Jacob estava regravando. Interessante ainda ouvir da própria Michele Philips as tretas do Mamas and Papas, especialmente o "trisal" com Denny e Jonh, e a história por trás da música “Go Where You Wanna Go”, que é regravada pela trupe de Jakob. Tem também David Crosby explicando que foi expulso do Byrds porque simplesmente "era um idiota".
O cantor e instrumentista Beck acerta também ao se referir às bandas californianas de 1965 a 1967 como supergrupos, tais como Bufallo Springfield, com todos cantando bem e tocando por vezes mais de um instrumento. Outra sacada das conversas pessoais e espontâneas do filme é a similitude da canção “Let it Rain”, de Eric Clapton, com "Questions", do Bufallo Springfield, ligeiramente confessada por Clapton em um papo aberto contando seu contato com a cena de Laurel Caynon após se apresentar com o Cream, com direito a batida policial e tudo em uma festa promovida por Stephen Stills. Clapton toca, e muito bem, na regravação da música de Stills.
Outro momento
legal são as histórias das sessions nas casas do local. Ao contrário
da cena da costa leste (Nova York), onde os encontros entre os músicos
acontecia em clubes, as jam sessions dos artistas da costa oeste eram
em longos saraus nas casas dos vizinhos. Gente como Frank Zappa, David Crosby,
Jackson Browne, Michelle Philips, Roger McGuinn, Neil Young e Stephen Stills
moravam quase lado a lado, e ainda eram vizinhos do mágico Houdini! Há momentos
hilários como Stills falando sobre o vizinho Zappa parado na rua entre suas
casas e recitando a letra de sua música "Who Are the Brain Police?",
e admitindo timidamente que ele fugiu pelos fundos uma vez quando os policiais
chegaram à sua casa, enquanto Eric Clapton, Neil Young e outros estavam o
visitando. Num desses encontros apareceu Brian Wilson na casa de Stephen Stills
e esse apresentando um acorde na guitarra de uma canção que estava trabalhando
deixou Brian improvisando no piano (devidamente 'aditivado') e foi dormir. Ao
acordar oito horas depois encontrou Brian no piano tocando os mesmos acordes de
antes, sem parar, de forma mais rápida. Tempos doidos ... E, por fim, a
participação de Neil Young é sempre bem vinda. Neil sendo Neil,
tocando de forma alucinada como sempre.
O
filme está disponível somente por aluguel na Amazon gringa, já esteve
na Netflix americana e está dando bobeira numa busca apurada por aí.
Por Ricardo Igreja, do Um Cadinho de Songs
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