Discoteca Básica Bizz#212: Buy Joe Meek & The Blue Men - I Hear a New World (1960)


Num planeta distante, povos alienígenas marcham por terras cercadas por estranhos campos magnéticos e vales inóspitos. Eles chamam-se globbots e saroos, executam danças de acasalamento e cantam como gnomos. Assim era a vida fora da Terra na cabeça do excêntrico Joe Meek, que entrou para a história como um dos primeiros e mais inventivos produtores independentes do pop. Seu álbum I Hear a New World: An Outer Space Music Fantasy (1960) foi uma tentativa de recriar na música o universo da ficção científica.

No fim dos anos 1950, pioneiros do space age pop já andavam brincando com moogs e theremins. Mas enquanto esses davam um leve sabor espacial a clássicos do pop, Meek soava como um autêntico alien tocando em equipamentos de fabricação própria. Antes de entrar no ramo da música ele foi operador de radar da Força Aérea Britânica e passava o tempo livre coletando peças para criar engenhocas. Dali foi parar no IBC Studios, em Londres, onde trabalhou como engenheiro de som. Quando ninguém estava por perto, saturava as gravações de reverbs e distorções, experimentando novas texturas sonoras. Uma dessas intervenções não autorizadas foi o single "Bad Penny Blues", de Humphrey Lyttleton. Surpreendentemente, a mixagem foi aprovada e o single entrou no top 20 britânico.

A partir daí, Meek sentiu-se à vontade para trabalhar à sua maneira e emplacou vários hits. Alguns tinham uma equalização tão estranha que a gravadora se recusava a masterizá-los, temendo que os vinis danificassem as caixas de som dos consumidores. Com a fama se espalhando, Meek montou um estúdio em seu apartamento, fundou o selo Triumph e gravou dezenas de artistas, trabalhando sem parar. Para aguentar o ritmo, se entupia de anfetaminas.


Por essa época, decidiu dar vida à sua fantasia sci-fi que viria a ser I Hear a New World. Para as sessões, escalou uma banda de apoio, a The Blue Men. Com exceção de Meek, ninguém sabia ao certo o que estava fazendo. Facas e garfos foram presos aos instrumentos de cordas. O baterista teve de tocar com moedas espalhadas pelas peles de seu kit. Vocais tiveram a rotação acelerada. Às vezes parecia country, mas ruídos borbulhantes de outro mundo estavam sempre por perto.

Parte de I Hear a New World saiu na época num EP. O plano era lançar o resto num segundo compacto, mas as vendas foram tão irrisórias que Meek engavetou o projeto. Ele estava mais preocupado em vender os nuggets da Triumph para as majors, que pagavam boladas com receio de deixar escapar um grande hit. Em 1962, veio o mais bem-sucedido deles: "Telstar", do The Tornados, que alcançou o topo da parada americana.

Mas os anos de anfetaminas cobraram seu preço. Seu ego foi inflando e transformou-se em paranoia. Certa vez, Phil Spector telefonou para dizer que o admirava. Longe de ficar lisonjeado, Meek bateu o fone na cara do rival americano, acusando-o de roubar suas ideias. Ele acreditava numa conspiração: "infiltrados" da Decca Records estariam espionando-o por meio de escutas escondidas embaixo do papel de parede do estúdio. Tudo foi desmoronando. Meek gastou sua fortuna, passou a tomar LSD e a invocar o fantasma de Buddy Holly para pedir conselhos sobre sua carreira - ele acreditava tanto no sobrenatural que deixava microfones ligados sobre catacumbas a fim de captar sons do além.

Enquanto isso, as produções malucas no seu estúdio não paravam e os vizinhos estavam cada vez mais incomodados. Quando batiam com um cabo de vassoura do andar inferior, reclamando do barulho, Meek reagia deitando os amplificadores contra o chão e colocando o volume no máximo. Foi uma dessas desavenças com a vizinhança que pôs fim à sua trajetória. No dia 3 de fevereiro de 1967, ele saiu de casa armado de um rifle e matou sua síndica, suicidando-se em seguida.

Texto escrito por Luciano Buarque De Holanda e publicado na Bizz#212, de abril de 2007 


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