Cada Dia Mais Sujo e Agressivo mostra um Ratos de Porão tecnicamente mais apurado, com instrumentais mais elaborados e uma produção que permite que cada elemento sonoro se destaque. As guitarras de Jão trazem riffs rápidos e cortantes, enquanto a cozinha formada por Jabá (baixo) e Spaghetti (bateria) sustenta o peso e a velocidade característicos do crossover thrash. João Gordo, por sua vez, entrega vocais ainda mais intensos e raivosos, traduzindo em gritos toda a insatisfação presente nas letras.
O álbum carrega influências tanto do hardcore europeu e americano quanto do thrash metal que crescia no cenário global, com nomes como Slayer e D.R.I. sendo referências diretas. A fusão desses estilos se reflete na variação rítmica entre momentos extremamente velozes e passagens mais cadenciadas, criando uma dinâmica que mantém o ouvinte em constante estado de tensão.
Entre as canções, destaque para a clássica “Plano Furado”, que critica as inúmeras tentativas frustradas de controlar a inflação galopante que assolava o Brasil nos anos 1980. “Ignorância” fala sobre a sociedade da época, mas sua letra parece cantar o que está acontecendo neste momento no Brasil e no mundo. “Morte e Desespero”, com participação dos amigos do Sepultura nos backing vocals, é uma das canções mais thrash do RDP. Em “Não Há Outras Vidas”, a banda até flerta com algo mais contemplativo na introdução mais calma, que na sequência evolui para um metal de entortar cabeças.
No início dos anos 1990, o Ratos de Porão já havia se consolidado como uma referência no cenário crossover thrash mundial, especialmente após Brasil (1989), álbum que chamou a atenção do público estrangeiro. Com isso, Cada Dia Mais Sujo e Agressivo foi regravado em inglês sob o título Dirty and Aggressive, visando um público internacional mais amplo.
A versão regravada mantém a energia do álbum original, mas apresenta algumas diferenças sutis, especialmente na sonoridade. A produção soa mais polida e moderna em relação à gravação de 1987, e a adaptação das letras para o inglês, apesar de preservar a essência das mensagens originais, por vezes modifica algumas expressões e nuances. No entanto, a brutalidade e a crítica social permanecem intactas, reforçando o compromisso da banda com sua postura contestadora. A gravadora Cogumelo reuniu as duas versões do álbum em uma edição em CD digipack lançada há alguns anos, e que é a mais recomendada para quem quer conhecer o trabalho.
Cada Dia Mais Sujo e Agressivo é um dos discos mais importantes da discografia do Ratos de Porão e ajudou a banda a consolidar sua identidade sonora, pavimentando o caminho para lançamentos posteriores, como Brasil (1989), que ampliaria ainda mais o reconhecimento do grupo internacionalmente. O disco continua relevante, tanto musicalmente quanto liricamente. A mistura de peso, velocidade e crítica social faz com que ele permaneça como um dos pilares do punk/metal nacional, influenciando gerações de bandas.
Com Cada Dia Mais Sujo e Agressivo, o Ratos de Porão provou que era possível unir a ferocidade do hardcore punk com a precisão técnica do thrash metal sem perder a essência anárquica e contestadora. É um álbum que soa tão sujo, agressivo e necessário hoje quanto em 1987.
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