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Come Taste the Band (1975): o disco que provou que o Deep Purple era maior que qualquer formação


Lançado em outubro de 1975, Come Taste the Band é um dos discos mais injustiçados — e também mais fascinantes — da longa história do Deep Purple. O álbum marcou o fim da chamada Mark IV, última formação antes do hiato que interromperia as atividades da banda por quase uma década, e é o único disco de estúdio gravado com Tommy Bolin na guitarra. O resultado foi uma obra ousada, plural e surpreendente, que capturou o choque entre o hard rock britânico setentista e as novas sonoridades que despontavam na metade dos anos 1970.

Ritchie Blackmore deixara o grupo em 1975 após o lançamento de Stormbringer (1974), insatisfeito com o flerte cada vez mais intenso com o soul e o funk que David Coverdale e Glenn Hughes traziam para o som da banda. Para substituí-lo, o Deep Purple recrutou o jovem guitarrista norte-americano Tommy Bolin, que vinha de passagens pelo Zephyr, pelo Energy e por uma breve colaboração com o James Gang, além de ter tocado no clássico Spectrum (1973), álbum do baterista Billy Cobham que é uma das maiores obras-primas do jazz fusion. Bolin era um músico versátil, com influência direta do jazz, do fusion e do R&B — e foi justamente essa bagagem que redefiniu a sonoridade do grupo.

Com Bolin, o Deep Purple gravou um disco que respira groove. Faixas como “Comin’ Home” e “Lady Luck” mantêm o vigor do hard rock clássico da banda, mas é nas canções mais híbridas que Come Taste the Band se destaca. “Gettin’ Tighter” é um funk rock de mão cheia, com Hughes e Bolin em absoluta sintonia, enquanto “Dealer” exibe um diálogo entre o blues e o fusion, mostrando o talento absurdo de Bolin como guitarrista e compositor. “You Keep On Moving”, coescrita por Coverdale e Hughes, é o grande momento emocional do disco — um encerramento melancólico e poderoso, carregado de soul e com um refrão que parece se despedir de toda uma era.


Produzido por Martin Birch, o álbum soa quente e orgânico, com uma pegada mais americana do que britânica. As linhas de baixo de Hughes e a bateria de Ian Paice estão entre as mais criativas da discografia do Purple, e a guitarra de Bolin adiciona texturas e harmonias que soavam quase futuristas para os padrões da época. No entanto, a combinação de talentos não resistiu aos excessos: problemas com drogas e conflitos internos tornaram as turnês caóticas, e a banda acabou se dissolvendo no ano seguinte.

Por muito tempo, Come Taste the Band foi visto como um ponto fora da curva, um “erro” em meio aos clássicos do Deep Purple. Mas o tempo fez justiça. Hoje, o álbum é reconhecido como um registro de transição, uma ousadia que antecipou o hard rock mais sofisticado e groovado que viria no final dos anos 1970.

O Deep Purple mostrou que o hard rock podia dialogar com o funk, o soul e o jazz sem perder peso ou identidade — algo que bandas como Whitesnake, Mother’s Finest e até o Van Halen levariam adiante. Come Taste the Band é o retrato de uma banda no limite, mas ainda brilhando intensamente antes do colapso. Um disco que, mais do que encerrar um ciclo, provou que o Deep Purple sempre foi maior do que qualquer formação.

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