Entre o apocalipse e a filosofia: Finita entrega sua obra mais ousada em Children of the Abyss (2025)
A Finita chega ao segundo álbum dez anos após a estreia, Voices From Sanatorium (2015), com a convicção de quem sabe o que quer. Children of the Abyss é o trabalho mais ambicioso da banda gaúcha até aqui, e coloca de vez seu nome entre os projetos mais interessantes do metal brasileiro contemporâneo. Vale mencionar que, neste intervalo de uma década, a banda soltou também os EPs Lie (2018) e Above Chaos (2022), além do ao vivo Live at Metal Sul Festival (2020).
Com quinze anos de estrada, a Finita vem de Santa Maria e construiu sua identidade explorando o lado mais sombrio do metal, mas sem se limitar a um único rótulo. Em Children of the Abyss, essa característica se amplia: o disco é um mergulho conceitual que mistura filosofia, religião e literatura em uma narrativa sobre escuridão, apocalipse e o distanciamento dos deuses. O resultado é um álbum que não se contenta em ser apenas música pesada — é uma obra pensada para funcionar como uma experiência completa.
A sonoridade traz ecos do metal extremo, mas também abre espaço para elementos do gótico, do metal sinfônico e de atmosferas cinematográficas. Há um pouco da pompa do Epica, da dramaticidade do Septicflesh, da melancolia do Tristania e até da grandiosidade do Therion, mas sempre filtrados por uma identidade própria. O contraste entre vocais guturais e melódicos reforça esse caráter híbrido, enquanto as orquestrações ampliam a sensação de estar diante de uma trilha sonora sombria.
Faixas como “Goddess of Disharmony” e “Fortuna”, esta cantada totalmente em português, capturam a essência do álbum, equilibrando peso e melodia em arranjos complexos. “War Curse” soa como um black metal sinfônico, com vocais guturais poderosos. Já “Witch’s Laugh” se destaca pela dramaticidade com direito a um trecho da letra recitado em português, enquanto “Quicksand” sintetiza bem a proposta conceitual, com riffs fortes e atmosfera carregada, além de ritmos brasileiros ao fundo. A performance vocal de Luana Palma é um ponto alto em todo o disco, dando intensidade e dinâmica às músicas. A banda toda é muito competente e é completada por Bruno Portela (guitarra), Fernando Back (baixo e vocal), Guilherme Pereira (teclado) e Pablijo Castro (bateria).
Mais do que consolidar a trajetória da Finita, Children of the Abyss é um passo à frente no metal nacional. Poucas bandas brasileiras investem em álbuns conceituais com essa profundidade, e menos ainda conseguem equilibrar agressividade e sofisticação sem perder identidade.
Children of the Abyss mostra uma banda no auge criativo, consciente de suas influências mas determinada a expandir limites. É o disco que coloca a Finita no radar não só dos fãs brasileiros, mas também de quem acompanha o que acontece de novo no metal mundial.
Comentários
Postar um comentário
Você pode, e deve, manifestar a sua opinião nos comentários. O debate com os leitores, a troca de ideias entre quem escreve e lê, é que torna o nosso trabalho gratificante e recompensador. Porém, assim como respeitamos opiniões diferentes, é vital que você respeite os pensamentos diferentes dos seus.