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O prazer de seguir escrevendo em um mundo cada vez mais acelerado, em que o vídeo domina e “ninguém mais lê”


Há mais de vinte anos escrevo sobre música. Foram incontáveis de textos, milhares de discos analisados, incontáveis horas ouvindo, pensando e tentando traduzir em palavras aquilo que a música provoca. A Collectors Room nasceu desse impulso: da vontade de conversar sobre o que ouço, de descobrir e compartilhar sons que me transformam. Mas, com o tempo, o mundo mudou. E às vezes me pego pensando se ainda há espaço para esse tipo de conversa.

Vivemos em uma era em que tudo precisa ser rápido, curto e visual. A reflexão virou exceção. A paciência, artigo de luxo. O algoritmo dita o ritmo, e a profundidade nem sempre encontra espaço. Mas escrever continua sendo um ato prazeroso. Exige silêncio, tempo, escuta. Demanda atenção, cuidado e dedicação. E talvez por isso escrever tenha se tornado, paradoxalmente, um gesto de resistência.

Não é sobre desânimo, nem sobre desistir. É sobre aceitar que o que movia as pessoas no início dos anos 2000, quando meus primeiros textos foram publicados no Whiplash — a Collectors Room começou como site próprio em outubro de 2008 — não é o mesmo que as move em 2025. O consumo de música se tornou descartável, as opiniões se diluíram em posts de 30 segundos, e o que antes era uma conversa apaixonada agora parece um ruído distante. Mas ainda há quem queira ouvir. Ainda há quem leia.

Apesar de muitas pessoas afirmarem que ninguém mais lê, o número de acessos da Collectors Room aumentou aproximadamente quatro vezes nos últimos meses, mostrando que ainda há um público ávido por conteúdo de qualidade e reflexão aprofundada. Isso reforça que escrever e ler continuam sendo caminhos valiosos para aprender, se conectar e compartilhar conhecimento sobre os temas que gostamos.

Prefiro escrever a gravar vídeos. Prefiro o silêncio do teclado ao ruído das câmeras. Prefiro o prazer de escolher cada palavra e construir um texto com atenção ao invés de seguir o imediatismo das timelines. Talvez isso me torne menos relevante no mundo de hoje. Mas, sinceramente, nunca comecei esse projeto por relevância. Comecei por paixão — e essa paixão continua sendo o que sustenta a Collectors.

É justamente isso que mantém tudo de pé: o amor por aquilo que, mesmo quando parece ultrapassado, ainda faz sentido. Enquanto houver discos para ouvir, histórias para contar e alguém do outro lado disposto a se conectar por meio delas, a Collectors Room continuará existindo — mesmo que em silêncio, mesmo que à margem, mas sempre fiel àquilo que a originou: o prazer de ouvir música e tentar entender o que ela faz com a gente.

Comentários

  1. Te acompanho há muitos anos, uns quinze mais ou menos, e sigo te lendo. É enorme a lista de bandas que conheci aqui. Pode continuar escrevendo que eu continuo te lendo. Obrigado por manter o blog de pé depois de tantos anos.

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  2. Sim, ainda há espaço! Sou leitor e visitante assíduo, Collectors está em meu favoritos há pelo menos uns 15 anos, desde o começo provavelmente. Sou leitor constante, já tiveram momentos que gostei menos, que discordei mais, mas sempre voltei. Mas sou um leitor discreto — quase nunca comento por aqui. É uma pena que essa discrição acabe se refletindo em pouco engajamento para os algoritmos. Então, de alguma forma, peço desculpas pelo silêncio. Notei também que, nas últimas semanas, você aumentou o número de publicações. Continue! Agradeço por me apresentar tantas bandas, álbuns e HQs.

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  3. Eu acompanho o site há sei lá quantos anos, mas nunca fui de comentar, exceto uma vez ou outra. Você já pensou em reunir a comunidade num fórum? Uma maneira muito fácil seria criar um subreddit no Reddit, facilitando bastante o engajamento.

    Quanto a música, eu sempre usei as revistas e sites para conhecer novas bandas. Conheci o Candlemass, por exemplo, há 20 anos ao ler a Roadie Crew (ou foi Rock Brigade?). Sem contar as matérias, e é por isso que continuo acompanhando sites como este, onde se desenvolve mais profundamente os assuntos abordados.

    Hoje em dia, são pouquíssimos aqueles que ainda escrevem profundamente sobre qualquer assunto; o padrão se tornou artigos curtos que chamam para vídeos longos no Youtube, com raras exceções sendo algo de qualidade. Eu gosto de ler desde que me entendo por gente, mas sempre revistas e artigos de internet, então essa necessidade acabou passando para os livros, o que foi bom no fim das contas kkkk

    Enfim, considere criar um subreddit para o público do CR interagir e fortalecer a comunidade invisível que está sempre por aqui.

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