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AC/DC e a era dos canhões: o poder e a estranheza de For Those About to Rock (1981)


For Those About to Rock (We Salute You)
(1981) é um disco que vive numa zona estranha dentro da discografia do AC/DC. Sucessor direto do monolito Back in Black (1980) — um dos álbuns mais vendidos de todos os tempos — ele nasceu condenado a carregar um peso impossível: como seguir um dos maiores fenômenos do rock sem parecer uma versão diluída de si mesmo? Não havia resposta fácil. Mas, em vez de tentar repetir a fórmula, o AC/DC entregou um álbum mais sombrio, pesado e ritualístico, com uma atmosfera que aponta para um grupo ainda lidando com a morte recente de Bon Scott, o impacto meteórico do sucesso e a necessidade de se firmar com Brian Johnson no vocal.

Produzido novamente por Mutt Lange, For Those About to Rock é o fechamento de uma trilogia que redefiniu o som da banda entre 1979 e 1981. Se em Highway to Hell eles encontraram seu shape definitivo e em Back in Black elevaram tudo à estratosfera, aqui surge um AC/DC mais denso, quase cerimonial. Lange trabalha as guitarras de Angus e Malcolm com uma precisão quase militar, coloca as bases rítmicas como paredes de concreto e empurra a voz de Johnson para um tom mais grave e carregado, ampliando o clima de tensão que percorre o disco.

A faixa-título é um capítulo à parte. Uma das músicas mais icônicas da história da banda, “For Those About to Rock (We Salute You)” parece pensada para arenas antes mesmo de a banda dominar arenas. Os canhões — hoje peça obrigatória nas turnês — não são mero adorno, mas parte essencial da construção de um encerramento épico. É a faixa que define o álbum, mas não é a única que merece atenção.

“Put the Finger on You” exibe um AC/DC mais melódico sem perder a malícia. “Let’s Get It Up” carrega um groove irresistível. “Evil Walks” e “Night of the Long Knives” trazem uma pegada mais sombria, quase um flerte pesado com temas de paranoia e decadência — um lado pouco comentado, mas muito presente nessa fase. “Spellbound”, que fecha o álbum, é uma das faixas mais subestimadas da banda: lenta, densa, quase hipnótica, com um clima noturno que reforça o tom soturno do disco.


Apesar de ter alcançado o primeiro lugar nos Estados Unidos — algo que Back in Black ironicamente não conseguiu — For Those About to Rock sempre viveu na sombra de seu antecessor. Não tem a mesma coleção de clássicos imediatos e nem pretende isso. Seu impacto é diferente: consolidou Brian Johnson como vocalista definitivo, encerrou uma fase de ouro com Mutt Lange e mostrou que o AC/DC poderia seguir adiante mesmo sem a urgência e o trauma que marcaram a banda.

Com o tempo, o álbum se tornou um daqueles discos que crescem quando revisitados sem pressa. Não é um compilado de hits, mas um trabalho coeso, sólido e com identidade própria — uma obra que ajuda a entender a transição do AC/DC de uma banda de pubs e grandes clubes para uma verdadeira instituição do rock. A trilha de canhões que ecoa na faixa-título virou símbolo, ritual, saudação e celebração.

Quase meio século depois, For Those About to Rock segue firme como um exemplo poderoso de que a intensidade do AC/DC não depende de velocidade ou pirotecnia, mas de personalidade, atitude e daquela insistência teimosa em fazer o que só eles sabem fazer. E, por isso, aqueles que são do rock foram — e seguem sendo — devidamente saudados.


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