Dicionário do Rock Argentino


Por Emílio Pacheco
Colecionador e Jornalista

Eu tinha 24 anos em 1985 quando escutei no rádio do carro o locutor anunciando uma música de um roqueiro argentino, um tal de Charly Garcia. Nunca tinha ouvido falar nele, mas o rock "Nos Siguen Pegando Abajo" me fisgou na hora. Fiquei intrigado. Rock argentino? Por que não? Depois disso, tanto a Atlântida FM quanto a Ipanema passaram a divulgar músicas de Charly. E o mais importante: os discos (ainda em vinil) começaram a aparecer nas lojas. A princípio, contentei-me com uma coletânea. Mas logo foi anunciado um show de Charly Garcia em Porto Alegre, no Teatro da Ospa.

No dia 19 de junho de 1986, eu estava lá, na primeira fila, com um de meus sobrinhos. Gostei tanto do que ouvi que tratei de voltar na noite seguinte, ainda que só conseguisse lugar no mezanino. Não importava. Eu já estava conquistado por esse ídolo portenho, que foi imediatamente para o alto do meu ranking, logo abaixo de Beatles e David Bowie. 

E voltei às lojas de Porto Alegre para garimpar mais discos. Agora as coletâneas já não me bastavam. Eu queria tudo, não só da carreira solo como das bandas que ele integrou nos anos 70: Sui Generis, Porsuigieco, Maquina de Hacer Pájaros e Seru Giran. Não era a primeira vez que eu fazia um levantamento retroativo da obra de algum músico que não acompanhara na época. Mas, nos outros casos, no mínimo, eu tinha uma vaga lembrança de ver os discos nas lojas ou ler alguma nota nas revistas de música. Desta vez, não. O rock argentino até então havia sido totalmente ignorado pela mídia brasileira. Descobrir esse universo inteiramente novo era quase como investigar a música de outro planeta. Enquanto nossos telescópios estavam apontados para Estados Unidos e Inglaterra, uma verdadeira revolução musical acontecia logo ali, ao sul da fronteira.

Poster do show no Teatro da OSPA

Tentei imaginar como devia ter sido a repercussão do som
folk com letras contestadoras do Sui Generis em 72 e 73 na Argentina, aquelas músicas todas tocando nas rádios de Buenos Aires e fazendo sucesso. "Cancion Para Mi Muerte", "Confesiones de Invierno", "Rasguña las Piedras"... Procurei me colocar no lugar dos fãs argentinos aguardando cada novo disco, comparecendo aos shows, curtindo a Máquina de Hacer Pájaros, o Seru Giran ... 

Outro dado supercurioso é que Charly morou em Búzios por algum tempo nos anos 70 e o primeiro LP do Seru Giran foi gravado no estúdio Eldorado, em São Paulo, com produção de Billy Bond. Sim, ele mesmo, que nós conhecemos como o vocalista do Joelho de Porco que substituiu Próspero Albanese por algum tempo no final dos anos 70 (e participou do LP da Som Livre, além de lançar dois álbuns solo para o mercado brasileiro logo depois).

Mas nem só de Charly Garcia vive o rock argentino. Outro nome importante é o de Luis Alberto Spinetta, que começou em 1968 no Almendra, depois integrou várias outras bandas, como Pescado Rabioso, Invisible e Spinetta-Jade. Hoje todos sabemos quem é Fito Paez, mas no show de Charly Garcia no Teatro da Ospa em 1986 ele era apenas um tecladista convidado. Houve também Los Gatos, Manal e muitos outros. Agora que comprei o "Diccionário del Rock Argentino" na Feira do Livro, terei um bom ponto de partida para investigar a fundo todo esse tesouro musical.

Foto tirada por Emílio no show de 1987

Depois de tudo o que escrevi, é quase obrigatória a republicação de uma foto que tirei e já havia mostrado antes: Charly Garcia em 1987 no Teatro Presidente. O roqueiro estava em forma, com todo o pique. Não sei se voltará a ser o grande artista que foi um dia, depois de tantas internações. Espero que se recupere. Mas que bom que pude vê-lo em sua melhor fase. Três vezes, aliás (ou cinco, contando os dois shows a que assisti duas vezes). Ah, sim: observem o cameraman no fundo à esquerda. A RBS gravou todo o show em vídeo, sob a orientação de Marcelo Sirotsky (que estava sentado bem na minha frente, na primeira fila). Depois a TV mostrou somente a música "No Soy Un Extraño" (eu tinha isso gravado em VHS, com apresentação de Kleiton Ramil, mas ainda não consegui localizar). Cadê esse tape completo?



Comentários

  1. Amigo Emílio, talvez esse site seja útil em suas pesquisas:

    http://www.rock.com.ar/

    O encontrei há algum tempo atrás, quando procurava informações sobre o Aeroblus.

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  2. O Emílio é a pessoa certa para nos trazer informações do rock portenho.Emílio, gostei de uma banda chamada "Los Piojos" que vi lá, o que acha ??

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  3. Fábio, na verdade eu ainda tenho muito o que aprender sobre rock argentino. Mal estou começando a investigar a obra de Luis Alberto Spinetta, começando pelo Almendra. Mas valeu a dica, vou conferir.

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  4. Emílio, um outro grupo legal dos pampas, mas não argentino e sim uruguaio, é o Dias de Blues. Conhece?

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  5. "Rasguña las Piedras"...rapaz, eu escutei muito esse disco do Sui Generis, lembro que era naqueles gravadores de fita cassete portátil do tamanho de um tijolo, a fita me foi emprestada por argentinos aqui no litoral sul, lá pelos anos 80 e 90 em Capão da Canoa (praia do sul), que era totalmente tomada pelos hermanos, ele tinham até prédios inteiros construídos por eles...

    eu, ao contrário da maioria dos gaúchos, gostava da convivência com eles, seja nas conversas ou no futebol na beira da praia, uma das minhas frustações foi nunca ter conseguido agarrar uma argentina...

    outra banda que me apresentaram foi o Riff, uma das raras bandas de Heavy Metal argentino daquela época...graças a dica do Cadão vou saber mais sobre eles, pois como diz a matéria, a música argentina é completamente ignorada aqui no Brasil...

    e também era argentina, uma das melhores bandas Death Metal mundial, mas que acabou devido a morte de seu líder em 2006, L6b6t6my (Lobotomy), quem gosta do estilo corra atrás que o disco é OBRA-PRIMA...

    grande matéria, abraço!

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  6. olá, amigos! muito legal o texto: pela sinceridade e pelas informações ( para quem conhece ou quer conhecer um pouco mais o rock arg).
    Los 20 mandamientos de la canción, según Charly García
    1. Hacer una canción es muy fácil imposible.
    2. Componer es matemática pura. A mí me interesa la fórmula.
    3. La letra es generalmente un complemento de la música.
    4. Si uno escribe solamente lo que le pasa, es un periodista.
    5. Componer, para mí, es una excusa para grabar. Me gusta más grabar que componer.

    6. Básicamente, componer es como pintar: es usar un espacio. Es como dibujar.
    7. No hay ningún misterio en componer. Como dijo Peter Gabriel: “Si le ponés un revólver a cualquiera que quiere componer, compone”. ¡Si es macho, compone!
    8. Es muy importante saber tocar canciones para hacer canciones. Los grupos que sólo tocan sus canciones no saben tocar otras canciones. Y generalmente sus temas son horribles: están mal hechos. Hay cosas que son 2 + 2 = 4.
    9. Para componer, hay que empezar por la infancia: recordar una gran canción y tratar de hacer una igual. Parte de la melodía de “Desarma y sangra” la hice a los doce años. Todo está atrás, cuando eras chico.
    10. Para hacer un tema como “Promesas sobre el bidet” hace falta una brasilera divina y un bidet. Y son cosas que no están al alcance de todos.
    11. La música solamente existe en este planeta porque hay aire. El universo es todo silencio.
    12. No veo una separación entre lo que me imagino y lo que se percibe que me imagino. Como la música es un artificio, es como estar adentro de las canciones. Cada vez me doy más cuenta de que uno quiere admitir algo que no se puede admitir.
    13. En las letras, antes inventaba cosas que no había vivido, y después las viví.
    14. Puedo componer sin escuchar. Lo tengo en la cabeza, lo escribo y ya está.
    15. Me gusta la abstracción y que eso sea una canción.
    16. Ahora compongo con loops: agarro una parte de un DVD y arranco, porque sé en qué tono están las películas.
    17. Alguien me dijo que en el futuro no iba a haber más artistas de la música. El concepto de artista iba a ser democrático: una máquina en el escenario y gente en los asientos, conectada con una máquina.
    18. Soy muy consciente de la música. Escucho más que todo el mundo. Es como si tuviera visiones de rayos X. No puedo evitar ver todo, y todo es una sinfonía constante.
    19. El peor ruido es un mal disco. La gente no tiene ni idea de eso, pero podés manipularlo. Yo quiero componer, y componer es manipular.
    20. ¿Saben cómo componían los Rolling Stones? El manager se dio cuenta de que no podían seguir tocando covers toda la vida, viviendo de los temas que les hacían Los Beatles, y a ellos no se les había ocurrido componer. Entonces les dio un grabador, una guitarra y una raya, los encerró en el baño y les dijo: “La bolsa la tengo acá afuera, hasta que no hagan una canción, no salen de ahí adentro”. O sea: “La necesidad es la madre de la invención”, como diría Frank Zappa.

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  7. estamos em contato:
    paulokempes@yahoo.com.br (e-mail/msn)
    ¡salu2!

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