Classic Tracks: Fleetwood Mac - The Green Manalishi (With the Two Prong Crown) (1970)


Por Flávio Ottoni
Colecionador
Collector´s Room

"Embarquei numa viagem e nunca mais voltei" - Peter Green

Antes de deixar o Fleetwood Mac em 1970, o guitarrista e membro fundador Peter Green escreveu uma música que, segundo ele, representava metaforicamente o dinheiro e o mal que ele traz. A fonte para tal inspiração veio de um sonho muito intenso e vívido, no qual aparecia um cachorro verde que latia intensamente para ele. O estranho é que, segundo o músico, esse cachorro havia, na realidade, morrido há muito tempo. Durante o sonho, o próprio Green sentia que estava desencarnado de seu corpo, tentando fortemente sair desse estado etéreo ao observar que seu corpo jazia na cama. Depois de algum tempo, no sonho, ele finalmente sente que não está mais desprendido de seu corpo, voltando à condição normal. Quando acorda, amedrontado, observa o quarto completamente escuro, e então surge a ideia de compor a música. Na verdade, esse pesadelo (
bad trip) foi gerado pelo consumo de uma espécie de droga da família da LSD chamada "Green Manalishi", que atua diretamente no cérebro, alterando, profundamente, as percepções sensoriais.

A intensidade instrumental de "The Green Manalishi (with the Two Prong Crown)" - um hard rock folk soturno e psicodélico com andamento de balada - e sua letra destilando desesperança e tristeza refletem o quadro de agonia e descontrole em que o líder do Fleetwood Mac se encontrava, com um comportamento esquizofrênico reforçado por anos de consumo de drogas pesadas. Essa bela e intensa composição alcançou o décimo lugar das paradas britânicas, sendo o lado A do single com o mesmo nome. O lado B é preenchido pela instrumental "World in Harmony", escrita por Green e Danny Kirwan.

Foram feitos vários covers dessa faixa (Therion, Corrosion of Conformity, Nirvana, ...), porém o mais conhecido foi concebido pelo Judas Priest, que executou uma versão hard rock com marcantes riffs de guitarra e a voz possante e cortante de Rob Halford, culminando com o seu grito no final (que traduz bem o clima de agonia da canção). Esse versão se tornou uma das faixas mais importantes e tocadas pela banda, estando sempre presente em todos os set lists de seus shows. Originalmente, foi lançada no álbum "Hell Bent for Leather", e aparece também no ao vivo "Unleashed in the East". Uma regravação com a voz de Tim "Ripper" Owens saiu como bônus do álbum "Demolition".

Voltando ao líder do Fleetwood Mac, pouco antes de escrever "The Green Manalishi ..." Peter Green alertou os integrantes da banda que havia tido uma visão na qual observava um anjo segurando uma criança desnutrida de Biafra, na África. Segundo Green, essa visão era uma iluminação, um chamado para romper com o sistema de vida capitalista que estava destruindo o planeta e a humanidade, com a ganância e a insensibilidade dos indivíduos. Assim, propôs que os integrantes do grupo se envolvessem em projetos de caridade para combater a fome e doassem grande parte do dinheiro que possuíam para esse trabalho de ajuda. 

Inicialmente John McVie aceitou a proposta, mas ao observar que a ideia fora concebida por uma pessoa sob influência de drogas e, portanto, alterada, acabou no final por negá-la. Mick Fleetwood recusou desde o início. Com a recusa, Peter Green escreveu "The Green Manalishi ...", que segundo ele representa todo o mal ocasionado pelo dinheiro, e saiu do conjunto: "Quero mudar minha vida inteira porque não quero mais fazer parte desse mundo condicionado, e por isso estou dando o fora", disse. 

Reza a lenda que logo depois que saiu do grupo Green raspou o cabelo, doou tudo o que tinha e foi viver como um mendigo em Londres. O que realmente se sabe é que após a saída do Fleetwood Mac Green passou grande parte das décadas seguintes recluso para se tratar do vício em drogas e da esquizofrênia. Nesse meio tempo alternou inúmeras vezes momentos de convalescência com períodos de recaída. Nos períodos de sobriedade gravou alguns discos, fez shows esporádicos, tocou como convidado em álbuns de diversos artistas (inclusive do próprio Fleetwood Mac) e trabalhou em alguns bicos (coveiro, assistente hospitalar). Mas foi apenas em 1995 que ocorreu um novo retorno de Green ao cenário musical, com a formação de uma nova banda ,The Splinter Group, que lançou nove discos e foi dissolvida em 2004, após a saída de Peter Green.

Em 1998 Peter foi homenageado e passou a integrar o
The British Blues All Stars. Atualmente, Green está sendo assessorado por uma agência governamental britânica, que ajuda a administrar as finanças de pessoas com problemas mentais. Além disso, está tomando remédios fortes para tratar as suas disfunções, o que ocasiona, segundo ele, problemas de concentração e falta de ânimo para tocar.

Já o grupo que fundou se tornou um dos mais populares e poderosos do planeta na década de 1970, tocando até para a rainha da Inglaterra em pleno Palácio de Buckingham.

Letra:

Now, when the day goes to sleep and the full moon looks
The night is so black that the darkness cooks
Don't you come creepin' around - makin' me do things I don't want to

Can't believe that you need my love so bad
Come sneakin' around tryin' to drive me mad
Bustin' in on my dreams - making me see things I don't wanna see

'Cause you're the Green Manalishi with the two-pronged crown
All my tryin' is up - all your bringin' is down
Just taking my love then slippin' away
Leavin' me here just tryin' to keep from following you



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