Castiga! - Nas pegadas do groove de Melvin Sparks


Por Marco Antonio Gonçalves
Colecionador

Se a pedida for soul-jazz ou jazz-funk, nada mais estiloso do que dar um mergulho de cabeça na discografia deste guitarrista norte-americano que atende pelo nome de Melvin Sparks. Um dos pioneiros do acid-jazz, Sparks se tornou um dos grandes guitarristas do estilo, figurando seu nome ao lado de feras como Cornell Dupree, Kenny Burrell, George Benson ou Grant Green.

Um obstinado pelo jazz, r&b e blues que aos onze anos de idade já tocava guitarra e se beneficiava do tradicional ensino musical das escolas americanas. Nessa fase de aprendizado, passou pela doutrina do visionário educador musical Conrad O. Johnson (o homem por trás do combo negróide Kashmere Stage Band) e seu talento foi lapidado tal qual um diamante. Sua habilidade com a guitarra, aliás, era medida em performances com a banda do colégio, em companhia de dois parceiros que se tornariam constantes no decorrer de sua carreira: Leon Spencer e John Manning. 

Em 1963 abandonou a high school para tornar-se músico profissional, ingressando no Upsetters, uma banda de rhythm and blues que acompanhava nomes de peso como Little Richard, Sam Cooke, Marvin Gaye e The Supremes. Depois de deixar o Upsetters, Sparks trabalhou em várias sessões, gravando ao lado de alguns dos gênios responsáveis pela evolução da música negra, como Charles Earland, Sonny Stitt, Lou Donaldson, Rusty Bryant, Lonnie Smith, Sonny Phillips e Johnny “Hammond” Smith, dentre outros.

Ao longo de seus mais de quarenta anos de carreira, gravou 12 discos solo (
Groove On Up de 2006 foi o último) e participou de outros 100 álbuns de artistas diversos. Também desenvolveu projetos paralelos bem interessantes, como o Mooreshiva Project, carregando no sotaque groove, só pra variar.


E aproveitando o embalo, agora mesmo estou escutando sua maravilhosa estréia como
band-leader. O disco Sparks! foi lançado em 1970 pela Prestige Blue Note Records e já mostrava com louvor o estilo musical que o guitarrista empregaria em seu trabalho solo: uma combinação ácida de jazz, funk e soul, repleta de grooves dançantes.

A banda contava com alguns dos antigos camaradas do liceu e o entrosamento demonstrado neste registro é potente. Estavam presentes nas sessões de gravação os seguintes músicos: Melvin Sparks (guitarra), Leon Spencer (órgão), Idris Muhammad (bateria), Virgil Jones (trompete), Houston Person (sax tenor) e John Manning (sax tenor). Contendo apenas cinco músicas, o álbum apresenta uma concepção harmônica e melódica daquelas, mostrando quem é que domina o pedaço quando o assunto é el groove terrible

Destaque para as versões instrumentais das clássicas “Thank You” de Sly & The Family Stone, “Charlie Brown” dos Coasters e “Spill the Wine” de Eric Burdon & War, com Sparks esmirilhando com sua praticidade e desenvoltura na guitarra e Leon Spencer comprovando ser um organista completo. “I Didn’t Know What Time It Was” e “The Stinker” completam o álbum, evidenciando toda a riqueza técnica de Sparks, que faz improvisos e alterna fraseados maravilhosos, lembrando, e muito, Grant Green, provavelmente o seu mais imediato precursor. Um primor! 


Outro brilhante registro do guitarrista é Akilah! de 1972, seu terceiro trabalho solo, e que tive a felicidade de encontrar o LP na loja Disco 7 do grande Carlinhos, no centro de São Paulo. Mais uma vez fui dominado pelo jazz ácido e pelo groove contagiante de Sparks e sua banda.

Obra instrumental impecável, que oferece uma seção rítmica vibrante, tendo à frente um time bem parecido com aquele do seu primeiro álbum: Sparks na guitarra, Leon Spencer no órgão, Idris Muhammad na batera e Buddy Caldwell na percussão. Para acompanhar a turma, nada melhor que uma seçãozinha de metais maneira: Sonny Fortune, George Coleman, Frank Wess e Dave Hubbard nos saxofones, Hubert Laws na flauta e Virgil Jones e Ernie Royal nos trompetes … é tudo o que eu gosto!

O disco abre com uma composição do Kool and the Gang, a funkeada “Love the Life You Live” num instrumental contaminado de suingue. Outras preciosidades são os temas “On the Up”, “All Wrapped Up” e a faixa título, que escancaram arranjos mais sólidos que os notados no disco de estréia, com o naipe de metais em maior evidência. A salientar o trabalho impecável da dupla Sparks e Spencer, que mais uma vez rouba a cena. Pra cair no suingue sem dó nem piedade. E se o lance é dar um relax para recuperar o fôlego, “Blues for J.B.” e “The Image of Love” estão aí para completar o serviço. Uma gema!


Outros discos como
Spark Plug (1971), Texas Twister (1973) ou Melvin Sparks (1975) são para matar neguinho do coração de tão bons. É o groove pulsando a milhão. Divirtam-se!

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