Por que não, Ringo?


Maurício Rigotto
Escritor e Colecionador

Já está em minhas mãos o melhor CD de rock de 2010 até o momento. Sei que ainda estamos na primeira semana do ano e o disco nem foi lançado ainda (será no dia 12 de janeiro), mas Y Not, de Ringo Starr, já é o primeiro álbum a figurar no rol dos melhores do ano.

Preste a completar setenta anos no próximo mês de julho, Ringo nos brinda com mais um grande disco, fato que vem se repetindo desde que revigorou sua carreira musical nos anos noventa.
Y Not já abre com o grande rock "Fill in the Blanks", no qual Ringo divide os vocais com seu antigo amigo e parceiro (e agora seu cunhado) Joe Walsh (ex-James Gang/Eagles).

A segunda faixa, “Peace Dream”, é mais um apelo por paz e amor de Ringo e é abrilhantada pela participação de seu ex-colega de banda Paul McCartney no contrabaixo. Ringo e Paul não gravavam juntos desde o projeto Beatles Anthology e dos discos Flaming Pie (Paul McCartney, 1997) e Vertical Man (Ringo Starr, 1998).

Segue a autobiográfica "The Other Side of Liverpool", onde Ringo fala sobre sua infância e adolescência quase miseráveis. Segundo suas próprias palavras: “As pessoas acreditam que eu já nasci sendo um beatle vivendo em uma luxuosa mansão, mas eu vivia em um bairro muito pobre, violento e desolado. Eu queria escrever sobre esse período da minha vida, e para mim é melhor fazer uma canção que escrever um livro. Em duas linhas eu posso dizer mais do que em cinco páginas: The other side of Liverpool is cold and damp / Only way out of there / drums, guitar and amp.”

Na faixa seguinte, “Walk With You”, que também é o primeiro single do disco, Paul McCartney divide os vocais com Ringo em uma emocionante meditação espiritual acerca do poder de uma grande amizade. Ringo conta que Paul veio a sua casa para gravar o baixo de “Peace Dream” e Ringo mostrou-lhe essa outra música. Paul pediu os fones e um par de latas e criou na hora a parte em que ele segue o vocal de Ringo, como se fosse uma conversa entre eles. Ringo confessa que mesmo tocando com Paul há cinquenta anos ainda se admira com a genialidade do amigo.

Y Not tem dez faixas e participações de músicos como Richard Marx e Ben Harper. Na última música, “Who’s Your Daddy”, Ringo faz um dueto com a ótima cantora da nova geração Joss Stone, encerrando esse grande disco de rock. Vale mencionar os excelentes timbres de guitarra e demais instrumentos, que valorizam ainda mais as boas canções que permeiam o álbum.

Ringo explica que o título
Y Not (uma corruptela para “why not” – “Por que não?”) surgiu quando ele pensava em quem poderia ser o produtor do disco. Ringo já havia trabalhado com grandes produtores como Richard Perry, Arif Mardin, Don Was e Jeff Lynne, mas ainda não tinha ideia de quem produziria o novo disco, quando casualmente se olhou no espelho e pensou sorrindo: “Por que não eu?”. Ringo nunca havia produzido um álbum e Y Not se tornou um desafio. Quando o disco ficou pronto, Ringo o mostrou primeiro para o seu filho Zak (excelente baterista que tocou no The Who e no Oasis) e ele achou formidável: “Pai, isto é ótimo! Isto é rock! Você deveria fazer sempre isto!”.

Ringo Starr estreou em carreira solo quando sua banda se separou em 1970, ano em que ele lançou os álbuns
Sentimental Journey (onde regravou standards do cancioneiro popular dos anos 1930 e 1940) e Beaucoups of Blues (em que mergulhou nas raízes do country de Nashville). Em 1973 lançou sua obra-prima, o álbum Ringo, com a participação de seus ex-colegas John, Paul e George. Seguiu lançando discos bons e íntegros, como Goodnight Vienna (1974) e Ringo’s Rotogravure (1976), até que em 1977 flertou com o soul e a disco music (em alta na época) em Ringo The 4th. No ano seguinte rendeu-se ao pop comercial no chato Bad Boy. Em 1981, mesmo com a ajuda de George Harrison, Ron Wood e Stephen Stills, lançou outro álbum decepcionante, Stop and Smell the Roses, e em 1983 voltou a lançar outro álbum fraco, Old Wave, com a participação de Eric Clapton e John Entwistle (The Who).

A carreira de Ringo parecia acabada e ele passou a se dedicar ao cinema, participando de vários filmes medianos, e ao tratamento do alcoolismo. Ringo só voltaria a lançar um disco de inéditas em 1992, quando surpreendeu o mundo com o ótimo Time Takes Time. O baterista regravou “Love Me Do” no festivo Vertical Man de 1998, fez o disco natalino I Wanna Be Santa Claus em 1999 e seguiu lançando trabalhos excelentes como Ringorama (2003), Choose Love (2005) e Liverpool 8 (2008).

Por que não?

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