Charles Bradley: o veterano iniciante da soul music!


Por Márcio Grings

Ele faz um tipo de som ao estilo de artistas como Darondo, Spanky Wilson, Sharon Jones e outros ‘negões e negônas’ de respeito do soul jazz, mas o fato é que Charles Bradley era um ilustre desconhecido até pouquíssimo tempo atrás. Eis que um single da Menahan Street Band lançado em 2008 apresentou o cantor ao mundo, e o resto é história.

E que história de vida, não é mesmo, Charlie? No Time For Dreaming é um excepcional álbum de soul music para apaixonados pela old school do gênero. A sonoridade do CD é totalmente vinculada à era de ouro da música negra, e temos a impressão de que se trata de um álbum esquecido nos porões do tempo. Mas acreditem: foi lançado no último dia 25 de janeiro.

Olhando a estampa do coroa dá pra dizer que ele parece uma mistura de Tony Tornado com James Brown, e apesar de estar estreando em um álbum, o soul man de 62 anos é o que podemos chamar de veterano iniciante. A história é longa, mas vale a pena passar os olhos pelo texto abaixo.


Charles nasceu em Gainesville, Flórida, em 1948, mas foi criado no Brooklyn, em Nova York. Viveu boa parte da sua infância nas ruas. Um dos seus primeiros contatos com a música foi quando teve a oportunidade de ir a um show de James Brown no lendário Apollo. Em seu site, Charles diz que aquele show mudou sua vida. Mas como na vida nada são flores, as dificuldades levaram Charles a sair do Brooklyn, até encontrar emprego em um bar, no estado de Maine. Aprendeu a cozinhar, e até montou uma banda. Era o começo da sua perseguição ao sonho de ser um artista.

Na mesma época, Charles chegou a sentir o gosto dos palcos e fez algumas apresentações. Naquele momento ele sabia que estava destinado a ser um cantor. Porém, o destino tratou de impedir o seu sonho: seus companheiros foram para Guerra do Vietnã, enquanto ele foi forçado a encontrar um trabalho como chef de cozinha em um hospital para doentes mentais.


Quase uma década depois, Charles Bradley decidiu abandonar tudo e partiu para o oeste em busca de seu sonho musical. Percorreu os EUA, indo de Nova York para a Califórnia de carona, chegando até o Canadá. Foi parar no Alasca, onde encontrou emprego como chef de cozinha. Passado um tempo, decidiu fazer o caminho de volta, dessa vez de avião. Na Califórnia, ficou mais de vinte anos trabalhando como chef, e às vezes conseguia uma ou outra apresentação como músico, mas nada que o fizesse apostar sua fichas em uma carreira de verdade. Até que perdeu o emprego e decidiu retornar ao Brooklyn para ficar perto da sua família.

Com o dinheiro que economizou, Charles encheu um caminhão com seus equipamentos musicais, comprados ao longo dos anos, para novamente tentar a sorte na Big Apple. Fez várias apresentações em clubes locais, e um bom tempo depois, enquanto se apresentava como Black Velvet, foi visto por Gabriel Roth, co-produtor da Daptone Records, o qual instantaneamente reconheceu seu talento e o levou diretamente para os estúdios. Charles conseguiria então o seu primeiro single.



Depois, conheceu o compositor e guitarrista Thomas Brenneck. Juntos lançaram dois singles e montaram uma nova banda – a Menahan Street Band. Resumindo, Charles finalmente teve oportunidade de mostrar seu talento. Foi quando em 2008 lançou um single comemorativo, e entre os músicos presentes estava o então desconhecido Charles Bradley. A música “The World (Is Going Up In Flames)” ganhou forma e vida na sua voz, seu talento foi reconhecido e o lançamento do álbum era questão de tempo.


Da capa com visual retrô a aquilo que ouvimos vazar das caixas de som, No Time For Dreaming é um senhor disco de soul. Além das canções, rolam algumas vinhetas ou temas instrumentais pela Menahan Street Band, que faz interlúdios espertos e dá refresco e beleza ao contexto do trabalho.

Só preciso de dois sons pra convencer o leitor/ouvinte do requinte da obra: tasque no player “The World (Is Going Up In Flames” ou “Heartaches and Pain”, última faixa do CD, e você saberá do que estou falando.

Que Charles Bradley não pare por aí!

Comentários

  1. Muito bom !!!
    É impressão minha ou está havendo um real e consistente novo interesse pela soul|black music com timbres dos anos 60 e 70 ?????

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  2. Sim Fábio, está havendo um revival da soul music, e ele é forte e consistente, tanto no mainstream, com artistas como Cee-lo Green, como mais afastado dos holofotes, que é o caso do Charles Bradley.

    Bom para nós, não é mesmo?

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  3. Forte candidato a ser um dos melhores discos do ano.

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  4. Acabei de comprar esse disco versão nacional, saiu pela OI Música, digipack c/ encarte, letras e no verso é um poster, paguei R$ 29,00 na FNAC, recomendo porque faz muito bem, bom demais quem curte soul deveria pensar nele.

    O Cadão já que este blog não se restringe a um único estilo musical gostaria de ver algo publicado sobre What's Going On, do Marvin Gaye. Além de ser fã de hard rock, heavy metal & subgêneros eu me amarro em blues, soul, jazz & funk e a minha coleção possui um número mais do que generoso destes estilos

    E mais, você sabe onde eu posso arrumar os discos do Shuggie Otis, pois eu já procurei em vários lugares e nada.

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