Thin Lizzy e seu Roadie Collection!


Por Ricardo Seelig

Roadie Collection é uma seção da revista Roadie Crew onde um colaborador da revista tem que apontar quais seria os discos imperdíveis, excelentes e bons de uma banda, além de um álbum que merece o status de "cuidado".

Abaixo você lê a minha opinião sobre a discografia da banda irlandesa Thin Lizzy, publicada na edição #143 da Roadie Crew, de dezembro de 2010.

Dona de uma das sonoridades mais singulares e apaixonantes do hard rock, o Thin Lizzy, ao lado do Wishbone Ash, foi responsável pelo desenvolvimento de uma das características mais marcantes do heavy metal: as guitarras gêmeas. Liderada pelo baixista e vocalista Phil Lynott, a banda elevou os arranjos de guitarra a um patamar até então inédito, transformando a arte de tocar o instrumento em uma atividade similar a de um artesão. Composições repletas de balanço e melodias marcantes, aliadas aos vocais únicos de Lynott, transformaram o Thin Lizzy em uma das maiores bandas do hard rock setentista.

Infelizmente, o grupo acabou trucidado pelas drogas, principalmente pela dependência em heroína de Lynott e do guitarrista Scott Gorham – o vocalista acabou falecendo em 4 de janeiro de 1986 em decorrência de complicações causadas pelo vício.

Após a morte de Lynott o Thin Lizzy encerrou as suas atividades, retornando apenas em 1996 com John Sykes assumindo os vocais e o comando da nova formação. Sykes deixou a banda em 2009, e em 2010 o grupo foi todo reformulado, contando agora com Ricky Warwick (vocais, The Almighty), Scott Gorham e Vivian Campbell (guitarras), Darren Wharton (teclado), Marco Mendonza (baixo) e Brian Downey (bateria).

Prepare-se para mergulhar na discografia de uma das mais influentes e importantes bandas da história da música pesada!

Imperdíveis: Jailbreak (1976)

Jailbreak simboliza o que é o Thin Lizzy. Suas nove faixas trazem Phil Lynott, Scott Gorham, Brian Robertson e Brian Downey no auge, esbanjando criatividade e talento. Sexto álbum do grupo, transformou o Thin Lizzy em um dos grandes nomes do hard rock da década de setenta, e foi o responsável pela banda estourar comercialmente no mercado mais importante do mundo, o norte-americano.

O disco apresenta uma qualidade quase sobrenatural em suas composições. “Jailbreak” abre os trabalhos unindo peso e melodia como só o Thin Lizzy sabia fazer. “Running Back”, com um pianinho cafajeste muito bem encaixado, e “Romeo and the Lonely Girl”, com linhas vocais inspiradíssimas, são duas pérolas pop que grudam na cabeça de imediato. A transcendental “Warriors” contém algumas das passagens de guitarra mais criativas já criadas por uma banda de rock, transportando o ouvinte por paisagens repletas de melodia.

O lado B abre com a imortal “The Boys Are Back in Town”. Sobre um instrumental que une peso e muito groove, Phil Lynott canta de maneira sublime, trajando as vestes de um trovador coberto de couro da cabeça aos pés. Vale mencionar que Lynott considerava “The Boys Are Back in Town” muito agressiva para ser lançada como single, e a princípio foi contra o seu lançamento neste formato. O tempo mostrou que o vocalista estava errado, já que a faixa acabou se transformando no maior sucesso da carreira do Thin Lizzy.

“Cowboy Song” é um hard estradeiro e poeirento, feito sob medida para pegar a estrada sem destino. Fechando o disco, “Emerald” traz duelos faiscantes entre Robertson e Gorham em uma das canções mais emblemáticas da banda.

Um dos melhores discos gravados nos anos 1970 e clássico incontestável do hard rock, Jailbreak é o melhor álbum do Thin Lizzy e porta de entrada perfeita para o som da banda. Cinco estrelas com um pé nas costas!

Nightlife (1974)

Quarto álbum dos irlandeses, Nightlife marca a estreia da formação que iria transformar o Thin Lizzy em um dos gigantes do rock setentista. Substituindo o guitarrista original Eric Bell, a dupla Scott Gorham e Brian Robertson chegou mostrando serviço.

O álbum já começa de maneira sublime, com o groove cheio de segundas intenções de “She Knows”. A faixa-título é um blues nada convencional, e conta com uma das melhores performances vocais de Phil Lynott. O hard rock típico do grupo, repleto de melodia e balanço, surge em todo o seu esplendor em “It´s Only Money”. Já “Still in Love With You”, em que Lynott faz um dueto com o vocalista escocês Frankie Miller, é uma das mais belas baladas já compostas, dona de uma beleza doída, que atravessa o coração de quem já amou alguma vez na vida. O solo desta faixa, cortesia de Gary Moore, traduz com perfeição o desamparo de um coração partido.

“Slowdown” é a música mais sexy gravada pelo Thin Lizzy em toda a sua carreira e incita ao coito imediato, enquanto a instrumental “Banshee” tem uma das mais belas melodias registradas pela banda, e seu único defeito é ser curta demais. Composta em homenagem à mãe de Lynott, “Philomena” despe a persona de rock star do líder do Thin Lizzy e o mostra como realmente era: um cara normal como eu e você, com qualidades e defeitos. A poderosa “Sha La La” contém algumas das melhores melodias de guitarra gravadas pelo grupo, e ao vivo costumava se estender com longos solos de Gorham e Robertson.

Nightlife é um álbum que, como um bom vinho, foi ficando melhor com o tempo. Um discaço, e ponto final.

Excelentes: Johnny the Fox (1976)

Gravado no mesmo ano que Jailbreak, Johnny the Fox herdou também a sua inspiração e qualidade. A sonoridade é bastante similar ao álbum anterior, e não poderia ser diferente.

O disco abre com “Johnny”, repleta de balanço e grandes solos. A pesada “Rocky” conta com ótimos riffs, enquanto a antológica “Don´t Belive a Word” deixa claro o nível criativo altíssimo em que a banda se encontrava naquele momento. “Fool´s Good” é um daqueles hards cadenciados que o Thin Lizzy fazia como ninguém, enquanto “Johnny the Fox Meets Jimmy the Weed” é um proto rap-rock turbinado por elementos jazzísticos, resultando em uma das composições mais originais gravadas pela banda. “Old Flame” traz a melancolia para o primeiro plano, que é devidamente colocada para escanteio com a espetacular “Massacre”, regravada pelo Iron Maiden nos anos oitenta.

Como curiosidade, Phil Collins participa do álbum tocando percussão. Johnny the Fox é um excelente disco, um registro contundente do Thin Lizzy em seu auge.

Vagabonds of the Western World (1973)

Terceiro LP do Thin Lizzy, Vagabonds of the Western World foi lançado em setembro de 1973 e é o último disco do grupo a contar com a guitarra de Eric Bell. Já explorando as harmonias e melodias características de guitarra que se tornariam a sua marca registrada, mas ainda mantendo uma sonoridade mais crua do que aquela que alcançaria nos seus próximos álbuns, o Thin Lizzy encanta e cativa enormemente nas faixas do LP.

"The Hero and the Madman" é um hard perfeito para se ouvir na estrada, com quilômetros de asfalto à frente. "The Rocker" contém um dos riffs mais agressivos já gravados, além de solos faiscantes de Eric Bell, um grande e inventivo instrumentista. A música que dá nome ao álbum tem linhas vocais belíssimas e muito bem construídas, que abrem caminho para um hard rock poderoso, levado pela interpretação única de Lynnot, que canta como se estivesse conversando com um velho amigo em uma mesa de bar. Já "Little Girl in Bloom" é uma jóia pop perdida no meio do disco, perfeita para ouvir ao lado de quem você gosta. E, claro, há "Whiskey in the Jar", releitura de uma canção folclórica irlandesa e que anos mais tarde seria regravada pelo Metallica, mas que encontrou a sua versão definitiva aqui. O disco fecha com “Broken Dreams”, um blues chapado de outra dimensão.

Clássico indiscutível e obrigatório na coleção de qualquer pessoa que goste de música.

Bad Reputation (1977)

Como a capa entrega, Bad Reputation foi gravado com a banda como um trio, já que Brian Robertson estava afastado devido a uma contusão sofrida em uma briga – o guitarrista participou de apenas duas faixas do álbum, “Opium Trail” e “Killer Without a Cause”.

“Soldier of Fortune” abre o disco com cachoeiras de guitarras gêmeas. A faixa-título une o rock ao funk de maneira eficientíssima, e contém uma das melhores performances do baterista Brian Downey, pouco falado mas peça fundamental no som do Thin Lizzy. A linda e ensolarada “Southbound”, uma das melhores músicas da banda, é daquelas faixas capazes de colocar um sorriso permanente no rosto do ouvinte. O embalo volta à ordem do dia com “Dancing in the Moonlight”, um dos maiores sucessos do grupo, e que conta com um sax muito bem encaixado. Um riff agressivíssimo introduz “Killer Without a Cause”, faixa que une peso com passagens vocais repletas de melodia, enquanto “The Woman´s Gonna Break Your Heart” recicla o riff de “Wild One”, do álbum Fighting, de 1975 – mas, mesmo assim, é uma das melhores faixas de Bad Reputation.

Um grande álbum, e, na minha opinião, o melhor exemplo da união do hard rock com elementos funk que sempre caracterizou o som do Thin Lizzy.

Bons: Fighting (1975)

Segundo trabalho com a formação Lynott, Gorham, Robertson e Downey, Fighting mostra a banda lapidando a principal característica da sua música: as primorosas e onipresentes guitarras gêmeas. O disco abre com “Rosalie”, de Bob Seger, transformada em um potente rock de bar. “Suicide” é um hard rock malandro turbinado por excelentes riffs e solos de guitarra – uma redundância quanto o assunto é Thin Lizzy. As melodias de guitarra que tornaram a banda famosa marcam presença em “Wild One”, enquanto a faixa que dá nome ao disco é um hard repleto de balanço.

“King´s Revenge” mescla uma base acústica com guitarras pesadas, e o resultado desce redondo. Já “Freedom Song” é um hard cadenciado sensacional, um clássico perdido com belíssimos duetos e solos de Gorham e Robertson e uma interpretação irretocável de Lynott. Fechando o play, “Ballad of a Hard Man”, composição de Scott Gorham que contém um de seus melhores riffs.

Disco imediatamente anterior a Jailbreak, Fighting mostra todas as características que seriam exploradas com perfeição cirúrgica no próximo trabalho, transformando o Thin Lizzy em um dos gigantes do hard setentista.

Black Rose: A Rock Legend (1979)

A estrada e os excessos de todos os tipos começam a cobrar o seu preço neste álbum, que mesmo assim foi muito bem sucedido comercialmente, alcançando a segunda posição nas paradas inglesas. Um dos grandes atrativos do disco é a presença do guitarrista Gary Moore, chapa das antigas de Lynott, que o convocou para substituir Brian Robertson.

“Do Anything You Want To” é hard rock puro, feito sob medida para levantar estádios. A balada “Sarah”, escrita para a então recém-nascida filha de Phil Lynott, é de uma doçura e sensibilidade tocantes. O balanço da excelente “Waiting for an Alibi”, lançada como single em fevereiro de 1979, e o peso de “Got to Give It Up”, dona de um grande refrão, são outros ótimos momentos.

Mas o melhor foi guardado para o seu final, com a faixa que dá nome ao disco, que reúne trechos originais com passagens de músicas tradicionais irlandesas rearranjadas por Lynott e Moore, alcançando um resultado final que está entre os melhores momentos da carreira do Thin Lizzy.

A produção um pouco exagerada e o número excessivo de faixas apenas medianas fazem com que Black Rose: A Rock Legend fique um nível abaixo dos trabalhos anteriores. Como curiosidade, vale citar que Axl Rose possui a capa do álbum tatuada em seu braço direito, e que Jimmy Bain, baixista com passagens pelo Rainbow e Dio, toca na faixa “With Love”.

Cuidado: Renegade (1981)

Com Lynott e Gorham afundados em drogas, e encontrando uma enorme dificuldade para adequar o seu som ao gosto da juventude da época, que estava muito mais a fim do peso e velocidade das bandas da nascente New Wave of British Heavy Metal, o Thin Lizzy cometeu em Renegade o ponto mais baixo de sua discografia. Ainda que o disco tenha bons momentos, como a abertura com “Angel of Death”, “The Pressure Will Blow” e o boogie de “Leave this Town”, bem na linha do ZZ Top, suas faixas deixam claro o momento complicado que a banda vivia. Pra complicar, ainda tem “Fats”, composição que chupa na cara dura a linha de baixo de “Dancing with the Moonlight”.

Curiosamente, Renegade é o álbum mais popular do Thin Lizzy no Brasil, e a razão é muito simples: quando saiu, o disco teve um encalhe gigantesco nas lojas, e os lojistas começaram a vender o LP a um preço muito menor que o praticado, fazendo com que muita gente tivesse o seu primeiro contato com o grupo através deste trabalho.


Famosa pelos seus shows repletos de energia, o Thin Lizzy lançou três álbuns ao vivo em sua carreira. O primeiro deles é Live and Dangerous (1978), considerado um dos melhores 'live albums' da história mas envolto em dúvidas sobre sua autenticidade, já que muitas de suas faixas receberam generosos overdubs.

O bom Life Live (1983) é uma despedida digna de Lynott, enquanto o recente One Night Only (2000) mostra a banda sob o comando de John Sykes. Há ainda os excelentes lançamentos póstumos The Peel Sessions (1994) - que traz faixas gravadas ao vivo no famoso programa do DJ John Peel entre 1972 e 1977 - UK Tour 75 (2008) e Still Dangerous (2009).

Os dois primeiros discos, Thin Lizzy (1971) e Shades of a Blue Orphanage (1972), mostram uma banda ainda em busca de sua identidade, e valem mais como registro histórico.

Para quem não conhece o grupo, a excelente coletânea Dedication (1991), é uma ótima pedida. E, para os colecionadores, a dica é o box Vagabonds Kings Warriors Angels (2002), que em quatro CDs esmiuça a trajetória do conjunto.

Comentários

  1. Nada como a posteridade pra que as coisas de valor sejam reconhecidas....

    Banda maravilhosa.... o pior disco é bom...por aí já se tem uma idéia do poder de fogo dos caras

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  2. Banda absolutamente perfeita. Subestimada merecia cpnuistas muito maiores. Discografia fantástica principalmente entre 74 e 83 . Não me conformo com as críticas negativas de CHINATOWN e RENEGADE. Pra mim esses álbuns estão no mesmo patamar dos clássicos dos anos 70 . E mais...o tão criticado Snowy White é tão espetacular quanto Gorhan / Robertson / Moore.

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  3. Banda absolutamente perfeita. Subestimada merecia cpnuistas muito maiores. Discografia fantástica principalmente entre 74 e 83 . Não me conformo com as críticas negativas de CHINATOWN e RENEGADE. Pra mim esses álbuns estão no mesmo patamar dos clássicos dos anos 70 . E mais...o tão criticado Snowy White é tão espetacular quanto Gorhan / Robertson / Moore.

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  4. Me lembro quando saiu esse roadie collection na época que eu ainda consumia essa revista e fiquei meio desapontado com o total descaso com Thunder and Lightning, que nao foi citado em momento algum na sessão. Acho que mesmo que não seja um disco que simbolize a fase áurea da banda, é uma obra que mostrou que conseguiram dar a volta por cima musicalmente se adaptar a época. Infelizmente acabou ali e só resta curtir a discografia e imaginar o que o genial Phill Lynnot ainda poderia fazer.

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