Heavy metal no Brasil? Apoie o que você gosta, e isso basta!



Por João Renato Alves


Apoie a cena nacional! Valorize as bandas de sua região! Abaixo os paga-pau de gringo! Quem aqui nunca ouviu isso? Pois bem, meus caros, sejam apresentados a estratégias fascistas de propaganda. Sim, nós que somos de um país que lutou por anos contra as amarras de um regime militar, agora temos que lidar com a síndrome de vira-lata de músicos ruins e despreparados, que não possuem sequer vergonha na cara ao perguntar o motivo de preferirmos um Black Sabbath a eles. O curioso é que os caras ouvem as mesmas bandas estrangeiras e se inspiram – quando não copiam na cara dura – nelas para escrever suas canções. Mas ainda assim se julgam vítimas de uma injusta predileção por parte do público, que prestigia originais a cópias, na maioria mal feitas.


Com certeza vários de vocês que estão lendo esse texto já foram submetidos a uma sessão de tortura que é o discurso inflamado de um desses tipos. Lá pelo meio do show, depois de uma meia-dúzia de músicas próprias que ninguém lembra mais no minuto seguinte e um cover do Iron Maiden, começa a ladainha: “Valeu, vocês estão aqui porque apoiam a cena, não ficam puxando o saco de gringo que vem pra cá só pra tomar dinheiro” e outras frases prontas do gênero. É mais ou menos como colocar a culpa por sua falta de capacidade na inteligência alheia. Uma vez, em um show, cheguei a ouvir protesto contra o tio que ficava vendendo cerveja do lado de fora, que não estava ajudando. Agora analisem ...


Mas a piada das piadas é a boa e velha “cinco mil em um show gringo e nem cem em show nacional / pagam duzentos reais para ver bandas de fora e não querem pagar dez para ver banda daqui”. O recente retrospecto de fracassos de eventos com bandas internacionais e o constante sucesso de quem tem competência já depõe contra isso. Agora, é claro que eu deixaria de assistir o Dr. Sin para ver o Kiss. Mas não trocaria um show dos irmãos Busic por um Poison. Ou seja, mera questão de preferências, não dá para apontar isso como regra. Quem faz esse tipo de comparação escancara o viralatismo.


Vamos encarar uma coisa de uma vez por todas: não existe cena nacional! O Brasil é um país muito grande para ser encaixado em algo do tipo. Existe a cena do Rio Grande do Sul, a de São Paulo, a do Rio de Janeiro, a da Bahia e assim por diante. São, no mínimo, 27 cenas espalhadas pelo país – para mim até mais, se analisarmos a fundo o tema. Nações menores, como Suécia, Alemanha e Finlândia, podem fazer isso. Nossa realidade é mais próxima a dos Estados Unidos, onde tivemos cenas regionais, como a thrash da Bay Area, o hard rock da Sunset Strip e por aí vai. Mas isso não deve ser visto como algo ruim. Ao contrário, quanto maior o espaço, melhor para todos. Essas realidades diferentes podem facilmente se misturar e interagir, ainda mais com a realidade atual das comunicações. O problema é que ao invés de os interessados fortalecerem o espaço menor, somos obrigados a lidar com textos mal escritos sobre a “revolussam du metau nassionau”. É aí que toda a ideia desmorona.


O que os mesmos pregadores do nacionalismo exacerbado não entendem é: não há público que sustente cena quando fatores externos não colaboram. Especialmente quando os próprios músicos que estão nela não passam de lavadeiras invejosas para com a roupa alheia. Quem vive essa realidade sabe muito bem a inveja que existe entre as bandas, com um querendo puxar o tapete do outro. O cara prefere se ver na pior e levar todo mundo junto a assistir alguém crescer. No rock está cheio desse tipo de figura, e aposto que vocês conhecem várias pessoas assim. Os que ainda não experimentaram esse tipo de situação, uma dica: vá a um festival e preste atenção na postura das bandas quando uma está no palco. É como aquelas menininhas que vão a festas e ficando olhando para a roupa das outras.


Por isso, digo a todos que leram até aqui: ofereçam apoio a quem vocês gostam! Seja brasileiro, americano, alemão, paquistanês, não deixem o fator geográfico se tornar mais importante que o musical. Não comprem esse discurso furado de “é daqui, tem que incentivar”. Se você aprova, é válido. Se não gostar, mande às favas. Quem possui talento, cedo ou tarde vai acabar aparecendo de uma forma ou outra. Se nem todos conseguem seu lugar nos holofotes, saiba que a maioria esmagadora não mereceu mesmo. A tal cena possui mais bandas ruins que boas em qualquer lugar do mundo, não seria diferente aqui. E isso é normal. Não leve como ofensa você, músico, que estiver lendo isso aqui. Se o fã é paga-pau de gringo, muita banda é cópia dos mesmos.


E viva o rock sem fronteiras!

Comentários

  1. Excelente! Tenho banda mas não posso deixar de concordar 100%!

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  2. Texto sensacional! Ri muito com a “revolussam du metau nassionau”. Hahaha
    Parabéns mesmo! Concordo com cada vírgula e sempre tento fazer mais do que apoiar. O problema é que é muito difícil encontrar pessoas que queiram trabalhar com seriedade. A maioria só quer reclamar e boicotar o trabalho alheio, como foi dito no texto.
    Mas eu sou brasileira e não desisto nunca! Estamos aí!
    Parabéns mais uma vez!

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  3. Estou fora da ‘cena’ há quase 15 anos e a coisa continua a mesma, a mesma ladainha que perdura desde sempre, impressionante. Já presenciei muito que se fala no texto, e olha que foi há quase 15 anos... Será que só no Brasil que isto ocorre? Quando meu amigo Guido Girsch esteve por aqui a cerca de uns cinco anos atrás me contou de como era o relacionamento das bandas underground na Alemanha e países vizinhos um ‘plano utópico’ para a nossa realidade, porém nunca presenciei nada assim, foram só as palavras Guido.

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  4. Grande besteira essa história de "tem que curtir o que é daqui", eu curto o que é bom.
    Babaquice, essas gazelas ficarem chorando ao invés de fazer um som que todo mundo goste.
    Rock não tem fronteiras, quer dizer, música não tem fronteiras.
    Alguém já viu alguma banda da Argentina chorando assim?
    Crescer é assumir o que se faz, se alguém não gosta do su som é pq é ruim e não pq não é gringo.

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  5. Muitas verdades em tão poucos bytes. Parabéns ao redator que conseguiu expor uma situação que todos percebem, mas que ninguém fala.

    Apoio várias bandas nacionais por gostar pacas, entre elas o Dr.Sin, Golpe de Estado, Patrulha do Espaço, mas faço isso porque realmente gosto dessas bandas, não por levantar a bandeira de um "movimento" que nunca se moveu.

    Parabéns Cadão, o blog tá supimpa!

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  6. Valeu galera, é por aí mesmo. E uma coisa que eu estava comentando com o João Renato ontem à noite por telefone é que, apesar de São Paulo ter inegavelmente a maior cena metal do país, ela não é a única e, muito menos, dona da uma verdade absoluta. Há diferenças regionais gritantes, como, por exemplo, a preferência história dos mineiros por sons mais extremos.

    O que eu acho também é que os principais veículos especializados do país, sejam eles revistas ou sites, focam muito na realidade de São Paulo e dão pouca atenção para as bandas do resto do país. Assim como qualquer bandeca de fora é vista como grande por uma parcela de fãs brasileiros, qualquer coisa que venha de São Paulo e é abraçada pelos principais veículos da mídia especializada brasileira é vendida como a salvação da lavoura e como algo muito maior do que ela realmente é. Existem boas bandas em todo o Brasil, assim como existem grupos péssimos em todos os estados, então seria muito interessante divulgar isso e não ficar apoiando apenas os mesmos medalhões de sempre.

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  7. Eu acho que o que está bem escrito no texto está certo. Mas não devemos generalizar o assunto por causa de algumas declarações de músicos que criam uma imagem utópica da "cena". Eu realmente gostaria de estar "competindo" com banda gringa, mas a realidade é bem diferente e temos problemas sérios para levar nossos projetos pra frente e que não tem nada a ver com o que está escrito no texto. Sou vocalista da banda Rei Lagarto. Até 2003 quando a banda encerrou suas atividades pela primeira vez, faziamos cerca de 100 show por ano, conseguindo dinehiro para a máquina girar de forma correta. Quando voltamos em 2007 encontramos uma realidade totalmente diferente. As casas de shows tinham em seu cast 100% de bandas tributos ou covers - não quero desmerecer o trabalho dos músicos dessas bandas, estão trabalhando e ganhando o seu - mas o espaço que tinhamos antes simplesmente desapareceu. É caro manter uma banda com um mínimo de qualidade. R$15,000,00 pra produzir um CD, R$5,000,00 para um clipe, site, produção de show e etc. Vender CD não rola mais. O público agora já se acostumou a sair de casa sabendo o que vai ouvir. Chegamos ao ponto de ouvir as pessoas falarem : Banda de som próprio é chato, sem ao menos conhecer a banda em questão. Como uma banda pode resistir e perpetuar seu trabalho numa condição dessas. Então, o problema existe, eu vejo muitas bandas legais demais que passam despercebidas, não por falta de qualidade mas por falta de oportunidade. Sem recursos boas bandas nunca chegarão a ter nível para brigar em qualidade com ninguém. Esse é um problema sério e não tem nenhuma relação com gostar mais da banda gringa. Eu gosto mais das bandas gringas. Mas fico muito chateado em ver o pouco caso com que são tratadas boas bandas dentro do nosso underground. Na Europa a coisa rola por existem circuitos de bandas pequenas, muito bem organizados. Na Europa valoriza-se o músico. Tenho contato com pessoas de lá, tudo funciona de forma totalmente diferente. Existem shows e o público consome produtos das bandas. Até 2003 era assim - pelo menos em SP e interior - agora a coisa ficou feia. Essa é minha opinião. Abraços.

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  8. O principal problema que eu vejo é banda cover roubando espaço que deveria ser para bandas autorais. Aqui em Floripa estavam cobrando 70 reais para um tributo ao Bon Jovi. Para, né?

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  9. Exatamente Ricardo! Isso condiciona o público a sair de casa sabendo o que vai ouvir. Antes era bem diferente. A pessoa ia para o bar conhecer uma banda, ter a supresa da banda ser boa ou nunca mais assistir se fosse ruim.Hoje isso acabou e eu não consigo imaginar a situação melhorando. O Rei Lagarto conseguiu algum espaço pelo que fez há 10 anos. Mas é quem está começamdo hoje? Fica tocando na garagem e fadado a divulgar seu som nos MySpace's da vida? Banda conquista público em cima do palco!!

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  10. A única coisa que concordo nessa campanha sobre o Metal Nacional é certo preconceito que certas bandas relatam quanto ao "problema" delas serem brasileiras para o publico... Conheço muita gente do publico de metal que tem um "nojo" não explicado de música feita no Brasil....e isso acaba sendo também direcionado de uma forma ou outra para as bandas brasileira de metal... mesmo algumas muito boas acabam sofrendo
    desta síndrome de vira-lata por parte do público

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  11. Muito bacana a discussão galera. Há muito tempo tento entender e ter de forma mais clara essa questão. Por algum motivo tem havido uma demanda por bandas cover, e isso tem perdurado por anos...já as casas de eventos, bares, etc, por sua vez, têm dado espaço para esses grupos. Acredito que o termo nem seja "dar espaço", afinal, um negócio na maioria das vezes só existe se houver dinheiro envolvido para movimentá-lo e para isso os empresários precisam de suas casas cheias, ou ao menos de uma renda mínima para que possam operar. Se a demanda é por um produto X, um empresário não seria louco de dar as costas, caso contrário estaria fadado à falência.
    Acredito que muito da Lei da oferta e da procura se aplica aqui.

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  12. Acho que passa um pouco pela preguiça de uma geração de ouvintes, que não tem mais o hábito de pesquisar e ir atrás de bandas novas, preferindo receber de mão beijada sempre as mesmas coisas.

    Costumo brincar com amigos meus dizendo que a coisa mais fácil do mundo é ser DJ de classic rock ou criar um programa de rádio nesse estilo: basta tocar as mesmas músicas de sempre, que todo mundo conhece de cor e salteado, e pronto.

    É preciso se aventurar um pouco mais. É claro que, por exemplo, o Machine Head do Purple é um clássico e "Smoke on the Water" é demais, mas já deu. O Purple tem ótimos álbuns que merecem ser redescobertos pelos fãs, como o Come Taste the Band, por exemplo. E esse raciocínio vale para todas as bandas clássicas. Iron Maiden não só "Fear of the Dark", por exemplo ...

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  13. Acho que passa um pouco pela preguiça de uma geração de ouvintes, que não tem mais o hábito de pesquisar e ir atrás de bandas novas, preferindo receber de mão beijada sempre as mesmas coisas.

    Costumo brincar com amigos meus dizendo que a coisa mais fácil do mundo é ser DJ de classic rock ou criar um programa de rádio nesse estilo: basta tocar as mesmas músicas de sempre, que todo mundo conhece de cor e salteado, e pronto.

    É preciso se aventurar um pouco mais. É claro que, por exemplo, o Machine Head do Purple é um clássico e "Smoke on the Water" é demais, mas já deu. O Purple tem ótimos álbuns que merecem ser redescobertos pelos fãs, como o Come Taste the Band, por exemplo. E esse raciocínio vale para todas as bandas clássicas. Iron Maiden não só "Fear of the Dark", por exemplo ...

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  14. Putz...

    Acho que passa totalmente pela preguiça...

    Infelizmente, na música, a grande maioria é totalmente preguiçosa...

    principalmente no meio Metal... nesse então qualquer mudança, por vezes minima, gera ondas de ódio...

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  15. nunca li tanta besteira junta. a pessoa nao e obrigada a gostar de bandas nacionais, mas para critica-las devemos ao menos ouvi-las. funciona assim: e nacional, nao ouvi e nao gostei!!!e essa atitude que deve ser criticada, o resto e chororo de musico incompetente.

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  16. João Renato, como eu gostaria de ter escrito esse texto!

    Xenofobia em bandas de Rock do Brasil é o maior paradoxo da arte que conheço. Cantam em inglês, usam e abusam dos trítonos (artifício musical inexistente na nossa música), vestem roupas de couro negro em pleno sol fortalezense (juro que já vi isso aqui no meu Ceará). É uma incongruência tão medonha quanto Hitler ser descendente de judeus e ter feito o que fez.

    O Fabiano Negri disse uma coisa importante: todo cuidado é pouco com as generalizações. Tem cenas que são tão sufocadas, que uma manifestação dessas não passam de um pedido de socorro desesperado.

    Também concordo com o Seelig. Essa coisa que propagam aos quatro ventos de que vivemos na “Sociedade da Informação” é pura balela. As pessoas estão mais preguiçosas e com menos vontade de conhecer e discutir. Já ouvi muita gente me dizer: “Lama, você nunca mais me indicou nada!”

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  17. eu tenho certo xodó pelos meus discos de bandas brazucas por gosto pessoal mesmo: adoro musica de qualidade em português.De ratos, sarcasmo a raul, e ai não tem como eu não dar uma puxada de sardinha, mas é por gosto pessoal ( alias, perdemos recentemente 3 bandas boas que enfrentaram o publico em nossa língua, bandanos, exxotica e o excelente pedra ), o que não me impede de adorar krisiun, korzus, etc.Quando surgiu o texto do thiago , em uma parte em que ele diz que precisa cantar em inglês que só assim carrega nossa cultura para os gringos...e depois diz que os gringos amam eles, então num ta tudo certo? missão cumprida soldado, ta reclamando de que? achei meio paradoxal, mas só pra me encaixar na discussão, essa questão de bandas covers x autoral ta dificil, qualquer coisa manjadíssima tem mais espaço do que o novo.prefiro um quadro de um artista novato do que ir ver alguém repintando um picasso.

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