Ryan Adams, Iron Maiden e o radicalismo imbecil



Por Ricardo Seelig

O fã de heavy metal se comporta como se fosse dono de uma reserva de mercado. Como se o som que ele ouve e gosta fosse um privilégio digno de poucos. Na sua cabeça, apenas os escolhidos podem ter a dádiva de ouvir o metal pesado. Uma grande besteira, como você bem sabe.

Esse pensamento limitado faz surgir situações pitorescas de tempos em tempos. Uma das principais ocorre quando um artista que não tem nada a ver com o heavy metal decide gravar uma versão para algum clássico do estilo. Nesse momento, a frase “não ouvi e não gostei” passa a ser o padrão entre os headbangers. E a desinformação sobre o “corajoso” que teve a “audácia” de se meter em um estilo que “não é seu” beira o risível.

O caso mais recente nesses moldes envolveu Ryan Adams e o Iron Maiden. Ryan – e não o choroso Bryan Adams, que fique bem claro – é um dos mais respeitados compositores contemporâneos norte-americanos. O início de sua carreira se deu no Whiskeytown, banda que liderou na segunda metade dos anos 90 e foi um dos responsáveis por dar forma ao chamado alt-country – ou country alternativo -, atualização do tradicional gênero norte-americano com uma aproximação muito interessante com o rock. Ao lado do Whiskeytown Ryan gravou ao menos um álbum clássico, Stranger's Almanac, lançado em 29 de julho de 1997.

A banda acabou e Adams deu início a uma prolífica e elogiada carreira solo. Seu primeiro disco, Heartbraker, que chegou às lojas em 5 de setembro de 2000, é um dos melhores trabalhos do novo milênio. O segundo, Gold (2001), é o meu preferido, uma trilha-sonora perfeita para corações partidos que buscam recomeçar a vida. Recomendo também o bom Easy Tiger, de 2007.



Pois bem. Ryan Adams sempre foi um fã de hard rock e heavy metal e nunca escondeu isso. A contracapa de Gold traz duas crianças usando a maquiagem do Kiss. O próprio cantor é fotografado frequentemente usando camisetas de suas bandas preferidas, e uma delas é o Iron Maiden, grupo que tem uma das legiões de fãs mais fiéis – e também mais chatas – da música pesada. E foi justamente do catálogo do grupo de Steve Harris e Bruce Dickinson que Ryan Adams resolveu pinçar uma canção e fazer a sua versão. E o resultado ficou excelente.

A releitura de Adams para a belíssima “Wasted Years”, a melhor composição da carreira do guitarrista Adrian Smith, é arrepiante. Tocada de forma acústica e com a interpretação particular de Ryan, “Wasted Years” teve seu lirismo e melodias ainda mais evidentes, mostrando, de novo e mais uma vez, que uma boa canção sempre será uma boa canção, independente do arranjo que se dê a ela.

Nesse ponto, voltamos lá para o primeiro parágrafo. É claro que a ótima versão de Ryan Adams irritou os fãs do Iron Maiden. Uma minoria curtiu, mas a maioria veio com o discurso pronto de “quem é esse caipira que está estragando o Iron Maiden”? Radicalismo burro de pais de família balzaquianos e gorduchos que se acham os donos da verdade, mas na verdade não passam de eternos adolescentes espinhudos tardios. Já disse aqui e repito: a qualidade de uma música não está limitada ao seu gênero. Existe música boa e ruim em todos os estilos, que o digam Iron Maiden, Ryan Adams, Wilco, Led Zeppelin e outros de um lado, e aberrações adoradas por quarentões que vivem em um país tropical vestidos em coladas calças de couro como Manowar, Poison e afins.

Li até comparações da trajetória de Ryan Adams com a de ícones da música country norte-americana como Garth Brooks e Billy Ray Cyrys, o que é um devaneio sem sentido que só poderia ter saído da mente de alguém sem o menor conhecimento sobre a carreira de Adams.

A música é bela, e é de todos. Qualquer um pode fazer o que quiser com ela. E mais: a vida sem música é muito menos interessante. Então, ao invés de viver seguindo os dogmas de um estilo que, em certos aspectos, tem mais regras que uma religião extremista, relaxe e deixe a música levar você através das sensações que ela pode proporcionar. E, nesse aspecto, a versão de “Wasted Years” de Ryan Adams é daquelas gravações acolhedoras que confortam os dias ruins, acalmam os ânimos exaltados e aquecem os corações solitários.

Ouça abaixo e seja feliz:

Comentários

  1. Uma bela versão da música..

    Música boa é música boa, independente de estilos...
    Excelente matéria.

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  2. Excelente texto! Isso me fez lembrar de uma bela versão (e ousada) que Gavin DeGraw fez para We Are the Champions do Queen. Alguem aqui conhece?

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  3. Leonardo, não conhecia e gostei: http://www.youtube.com/watch?v=1iSvHlWHLhs

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  4. RICARDO CONCORDO EM 100% COM O QUE VC DIZ, SOU FÃ DE HEAVY NETAL, COMECWI NO ROCK ATRAVES DELE, ADORO IRON, SÓ QUE QUE ADORO RYAN ADAMS TAMBEM INCLUSIVE TENHO TODOS OS DISCOS DO CARA, ATÉ OS MAIS FRACOS, E RECOMENDO QUEM NAO CONHECE O CARA É UM DOS MAIORES COMPOSITORES DE 2000 PRA CÁ COM CERTEZA.
    MATOU A PAU NESSE COMENTÁRIO RICARDO.
    ABRAÇO

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  5. Fica aqui uma sugestão de pauta:
    Versões inusitadas para canções de hard rock/metal.

    Vemos muito por ai bandas de Metal fazendo sons pop, mas ao contrário, existe muita coisa bacana.

    Posso contribuir com muitas dicas se for o caso!

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  6. Achei maneiríssima essa versão.
    Antigamente eu tambem pensava que minhas bandas eram intocáveis, mas cresci.
    Sempre quis ter a cabeleira do James Hetfield, aí o cara corta o cabelo! Mas a banda continuou ótima, mesmo lançando Load (um disco polêmico, mas muito bom), novos experimentos nem sempre são decisões acertadas, mas devem ser testados.
    Ryan Adams é muito bom, me amarro naquele disco que tem músicas com nomes de clássicos do rock qu enão me lebro o título agora.
    Que venham versões como essa, pelo menos não é uma merda como as do Yahoo.

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  7. Esse disco que você fala é 'Rock and Roll'. Não gosto, acho a sonoridade muito anos 80.

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  8. Radicalismo sempre é uma merda. Belo texto Cadão.

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  9. Algumas que lembrei:

    Jacob Moon - Subdivisions (Rush)
    Garth Brooks - Hard Luck Woman (Kiss)
    Lionel Ritchie - Long way to go (Def Leppard)
    Tori Amos - Raining Blood (Slayer)
    Macy Gray - Walk this way (Aerosmith)
    Guided by Voices - Highway to Hell (AC/DC)
    Cardigans - Changes (Black Sabbath)
    Cardigans - Sabbath Bloody Sabbath (Black Sabbath)
    Big Country - Paranoid (Black Sabbath)
    Big Country - I'm Eighteen (Alice Cooper)
    Lisa Loeb - Goodbye to Romance (Ozzy)
    Shakira - Back in Black (AC/DC)
    Shania Twain - You shook me all night long (AC/DC)
    The Mission - Dream On (Aerosmith)
    Etta James - Only Women Bleed (Alice Cooper)
    Etta James - Miss you (Rolling Stones)
    Erik Hassle - Nothing Else Matters (Metallica)
    Cher - A World without Heroes (Kiss)
    Lenny Kravitz - Deuce (Kiss)


    Pat Boone - várias
    Richard Cheese - várias

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  10. Caraca!
    Que lista maravilhosa!
    Poderiam lançar um disco: As melhores piores covers da historia!
    A versão poser de Britney pra I love rock n roll tambem merece lugar.
    Eu gosto de Lenny Kravitz com Deuce. Acho que é uma das poucas boas naquele tributo.

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  11. O disco In a Metal Mood do Pat Boone é maravilhoso! Diversão garantida!

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  12. Eu concordo com os comentários, radicalismo é uma merda mesmo e o Ricardo sabe bem como o fã de metal acha que o estilo é para poucos, afinal, já deve ter passado por essa fase quando era adolescente, assim como eu já passei também. Pura idiotice que só me faz rir hoje em dia quando eu lembro.

    Eu nem sabia dessa versão aí, nada contra, só que ouvi agora e não gostei rsrsrs

    Mas eu sou um chato mais chato que isso, eu nem curto os tributos de bandas de metal, acho que nunca conseguiram melhorar algo que já estava maravilhoso, então nem perco tempo mais com cds de covers ou tributos.

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  13. Alguém aí já viu as versões de Tori Amos para Smells Like teen Spirit(Nirvana) e Rainnig Blood(Slayer), outra que eu acho bem legal também é a que o Dinosaur Jr fez para Goi'n Blind(KISS).

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  14. O texto é bem escrito, interessa até o fim, mas fala muita besteira sobre o heavy metal e sobre a música em geral, pior ainda foi o triste exemplo de "música boa" no final...lamentavel essa versão alfa FM, não tem energia, não tem identidade
    . quem não da valor a energia que eu me refiro nunca podera discutir sobre o HEAVY METAL.

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