Michael Jackson: crítica da biografia 'A Magia e a Loucura'


Por Fabiano Negri

Já faz mais de dois anos que Michael Jackson faleceu, e muitos assuntos sobre sua carreira ainda permanecem obscuros. Uma maneira melhor de entender e tirar suas próprias conclusões sobre a vida e a carreira do maior astro pop de todos os tempos é a leitura da biografia A Magia e a Loucura, de J. Randy Taraborrelli. Construída a partir de entrevistas pessoais, depoimentos de Michael, de pessoas de sua família e de indivíduos que estiveram ligados direta ou indiretamente ao cantor, além de acesso a documentos oficiais, a biografia esmiuça cronologicamente todos os fatores que levaram Michael Jackson, da infância pobre em Gary, Indiana, ao mega-estrelato e, depois, ao declínio.

Uma coisa que fica bem clara é que Michael talvez seja o artista mais perfeccionista e obstinado pelo sucesso de quem eu tenha conhecimento. Muito disso se deve à criação rígida que Joseph Jackson deu aos filhos. No livro ele é tratado apenas como um pai que desejava a qualquer custo o sucesso dos filhos, às vezes errando a mão no excesso de disciplina, mas longe do monstro que a família e a midia têm pintado durante anos. A verdade é que mesmo errando muitas vezes – como no absurdo contrato de praticamante escravidão que ele assinou com a Motown –, Joseph atingiu seu intuito e deixou marcado em seus filhos, principalmente em Michael, o conhecimento de que apenas muito trabalho e aperfeiçoamento podem levar um artista ao topo.

Outro detalhe muito interessante é o paralelo criado entre a carreira de Michael e a indústria musical, deixando bem claro que os sorrisos e abraços em fotos não passam de fachada, escondendo uma relação de ciúmes, falsidade e jogo de poder.

Todos os pontos cruciais da vida pessoal de Michael Jackson são tratados abertamente. Segundo o autor, Michael não era gay, mas tinha sérias sérias dificuldades em se relacionar com mulheres. Também fica bem claro que ele era uma pessoa extremamente desconfiada, e que dificilmente deixava que alguém tomasse decisões por ele.


É interessante observar que, mesmo tendo chegado ao inimaginável sucesso de Thriller, Michael ainda não estava contente, e foi exatamente aí que a situação saiu de controle. Querendo cada vez mais atenção, ele tomou direções cada vez mais erradas em sua carreira. Pra se ter uma ideia, o livro relata que algumas das suas maiores excentricidades - como a câmera hiperbárica em que ele supostamente dormia e o interesse em comprar os ossos do homem-elefante - foram notas inventadas e plantadas pelo próprio Jackson para chamar atenção.

Detalhes constrangedores de sua relação com o garoto Jordie Chandler são colocados de uma forma explícita, revelando um sério distúrbio psicológico, que apesar de levar o cantor a um comportamento estranho e, para muitos, inaceitável, não o enquadram no perfil de pedófilo sustentado pela promotoria nos processos aos quais Michael Jackson respondeu.

As plásticas, o vitiligo, seus casamentos e todos os assuntos polêmicos são abordados da mesma forma. Mesmo sendo opinativo em alguns momentos, o autor expõe as informações de uma maneira em que, no final das contas, o leitor é quem tira suas conclusões.


Mas é claro que, em suas 670 páginas, o livro não possui apenas sombras. Todos os alicerces formadores do estilo inimitável de Michael Jackson cantar e dançar estão lá. James Brown, Diana Ross, Marvin Gaye, Gene Kelly, Fred Astaire e muitos outros grandes nomes fazem parte do balaio de gato que culminou na originalidade de Michael. Sempre esteve claro que ele era o mais talentoso dos irmãos, e que, em algum momento, iria voar longe e só. Mesmo assim, nem mesmo o produtor Quince Jones imaginava que ele chegaria tão longe. O fenômeno de Thriller salvou a indústria fonográfica, moribunda no início dos anos 80.

A importância histórica desse artista, às vezes soterrada por seus escândalos, é inestimável. Seus fracassos foram mais bem sucedidos do que muitos grandes sucessos de várias estrelas pop. Ele era irriquieto, sempre tentando se reinventar. Ele ainda procurava superar a marca de Thriller, só que o tiro de misericórdia em sua vida veio com o segundo processo, esse sim, totalmente forjado, levando-o aos tribunais numa batalha que, apesar de vencida com sua declaração de inocência, agravou seriamente seus problemas de dependência com drogas lícitas.

O livro, cuja primeira edição foi publicada em 1991, teve sua última atualizada em 2005, portanto a fase pós-julgamento não é relatada. Infelizmente, os acontecimento que sucederam a essa época todos conhecemos bem. Um Michael Jackson totalmente fragilizado e cercado de sanguessugas definhou publicamente até sua morte. Porém, acho que devemos nos lembrar do garoto prodígio que encantou o mundo com sua voz e afinação nos anos 70, e que se tornou, quando adulto, no maior fenômeno pop da história.

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