A explosão dos realitys shows que tem como recorte temático a descoberta de novos ídolos da música comprovam que a indústria (não a fonográfica) do entretenimento buscou uma nova forma de show que envolve o público emocionalmente, dando lhe quase sempre (ou sugerindo isso) o poder de escolher seu mais novo ídolo.
Pra gente falar deste fenômeno, vamos voltar um pouquinho no tempo. Quando a indústria cultural surge quase que simultaneamente com a revolução industrial, o valor subjetivo da arte perde, segundo alguns teóricos, sua maneira imensurável de se guiar. O teor comercial dos quadros, das peças, das esculturas, por assim dizer, minou o valor do suor, a abstração e a mensagem clara ou oculta daquela fala. Mesmo que não houvesse um discurso sócio-cultural batendo de frente com a economia que também regia as artes, sempre teve quem torcesse o nariz para os apelos do show business.
Desde então o espetáculo tornou-se mais impressionante emocional do que o desempenho de quem está no palco. A técnica passou a ter seus conceitos questionados até por aqueles que só a conheciam de ouvir falar. O valor sensorial passou a ser o árbitro das decisões racionais como “fulana canta bem”, “sicrana canta mal” e por aí vai.
O cenário colorido, as luzes e holofotes, as escalas em seus tons mais acentuados e o exagero da palavra “emoção” em cada retórica escolhida pelos jurados e co-participantes do show contribuem para ativação do sonho de cada participante. Sonho este que pode começar com capítulos dramáticos mediantes os desafios que lhe são apresentados.
No nosso país com discurso assistencialista e com roupa de quem paga à prestação mas parece que pagou à vista, sempre todo o espetáculo é acompanhado por uma “história de luta e superação” para legitimar a via-crúcis do êxito. Assim boa parte da audiência pode vereditar (neologismo meu): “Ah, coitado, ele merece por tudo que passou na vida”. O talento técnico passa a ser subjugado pela "vida sofrida", mas que tem esperança de redenção no fim
da temporada.
Lá fora – especialmente nos Estados Unidos – é apenas um braço do american way of life, cada dia mais desgastado pelas realidades escancaradas que nos chegam pelos meios de comunicação. Mesmo assim, quem não quer brilhar na terra do Tio Sam e vislumbrar uma carreira internacional? Aqui é utopia. Mesmo os grandes precisam de peculiaridades nas suas carreiras para serem reconhecidos cantando em português. Por isso não são poucos os filhotes de Mariah Carey espalhados pelos palcos de realitys da vida. Os malabarismos vocais são tão chatos e vazios que mesmo a pronuncia impecável não mascara a total falta de identificação com o que está sendo cantado.
Nossa cultura tem este dinâmico dom chamado de, fazendo os devidos empréstimos biológicos, "mimetismo". Essa mania dogmática de querer importar os formatos e buscar numa verossimilhança a credibilidade do real. Tipo: se é parecido é tão bom quanto. Na verdade sob uma diversidade absurda, o mundo mainstream procura igualar um pouco de tudo.
Perdemos a oportunidade de dar lugar à diversidade cultural das regiões riquíssimas do país para importarmos o brilho do gringo, a luz de fora. O Brasil, mais do que nunca, tornou-se uma nação onde mal sabemos falar e escrever nosso idioma, mas entendemos bem o que muito americano diz, suas intenções e poder. Aliás, muitos artistas do meio pop julgam que a consolidação de uma carreira internacional é o modelo mais interessante de felicidade artística.
Estamos perto de não vermos mais canções que falam sobre o nosso povo, nossa terra e jeito, por conta de uma identidade misturada às tonalidades cada dia mais estrangeiras. Basta que se saiba que um dos artistas populares mais bem sucedidos de terra brasilis é o maior "versionador" de canções que não são nossas.
E há quem ache bom.
(por Daniel Júnior)
Pra gente falar deste fenômeno, vamos voltar um pouquinho no tempo. Quando a indústria cultural surge quase que simultaneamente com a revolução industrial, o valor subjetivo da arte perde, segundo alguns teóricos, sua maneira imensurável de se guiar. O teor comercial dos quadros, das peças, das esculturas, por assim dizer, minou o valor do suor, a abstração e a mensagem clara ou oculta daquela fala. Mesmo que não houvesse um discurso sócio-cultural batendo de frente com a economia que também regia as artes, sempre teve quem torcesse o nariz para os apelos do show business.
Desde então o espetáculo tornou-se mais impressionante emocional do que o desempenho de quem está no palco. A técnica passou a ter seus conceitos questionados até por aqueles que só a conheciam de ouvir falar. O valor sensorial passou a ser o árbitro das decisões racionais como “fulana canta bem”, “sicrana canta mal” e por aí vai.
O cenário colorido, as luzes e holofotes, as escalas em seus tons mais acentuados e o exagero da palavra “emoção” em cada retórica escolhida pelos jurados e co-participantes do show contribuem para ativação do sonho de cada participante. Sonho este que pode começar com capítulos dramáticos mediantes os desafios que lhe são apresentados.
No nosso país com discurso assistencialista e com roupa de quem paga à prestação mas parece que pagou à vista, sempre todo o espetáculo é acompanhado por uma “história de luta e superação” para legitimar a via-crúcis do êxito. Assim boa parte da audiência pode vereditar (neologismo meu): “Ah, coitado, ele merece por tudo que passou na vida”. O talento técnico passa a ser subjugado pela "vida sofrida", mas que tem esperança de redenção no fim
da temporada.
Lá fora – especialmente nos Estados Unidos – é apenas um braço do american way of life, cada dia mais desgastado pelas realidades escancaradas que nos chegam pelos meios de comunicação. Mesmo assim, quem não quer brilhar na terra do Tio Sam e vislumbrar uma carreira internacional? Aqui é utopia. Mesmo os grandes precisam de peculiaridades nas suas carreiras para serem reconhecidos cantando em português. Por isso não são poucos os filhotes de Mariah Carey espalhados pelos palcos de realitys da vida. Os malabarismos vocais são tão chatos e vazios que mesmo a pronuncia impecável não mascara a total falta de identificação com o que está sendo cantado.
Nossa cultura tem este dinâmico dom chamado de, fazendo os devidos empréstimos biológicos, "mimetismo". Essa mania dogmática de querer importar os formatos e buscar numa verossimilhança a credibilidade do real. Tipo: se é parecido é tão bom quanto. Na verdade sob uma diversidade absurda, o mundo mainstream procura igualar um pouco de tudo.
Perdemos a oportunidade de dar lugar à diversidade cultural das regiões riquíssimas do país para importarmos o brilho do gringo, a luz de fora. O Brasil, mais do que nunca, tornou-se uma nação onde mal sabemos falar e escrever nosso idioma, mas entendemos bem o que muito americano diz, suas intenções e poder. Aliás, muitos artistas do meio pop julgam que a consolidação de uma carreira internacional é o modelo mais interessante de felicidade artística.
Estamos perto de não vermos mais canções que falam sobre o nosso povo, nossa terra e jeito, por conta de uma identidade misturada às tonalidades cada dia mais estrangeiras. Basta que se saiba que um dos artistas populares mais bem sucedidos de terra brasilis é o maior "versionador" de canções que não são nossas.
E há quem ache bom.
(por Daniel Júnior)
Gostei do formato do The Voice Brasil, quanto ao gosto popular, sabemos que sempre foi pouco criterioso, não como exigir muito de quem tem pouca ou quase nenhuma formação cultural.
ResponderExcluirO que mais me irrita nestes programas é que são concursos puramente de interpretação. As mesmas músicas dos mesmos artistas. Nenhum abre espaço para artistas ou bandas com trabalhos próprios. Por isso nunca sai absolutamente nada concreto ao final de cada concurso. Eu adoro Tim Maia, Raul Seixas... Mas não dá pra ficar vendo um concurso de quem deixa mais complexo e cheio de firulas estas composições.
ResponderExcluirMuito bem colocado Felipe. No fim das contas esses programas vão criar "ídolos" artificiais, que não convencem já no primeiro disco e saem de cena.
ResponderExcluirO lado positivo é que músicas de caras bons, como Tim e Raul, aparecem na TV aberta no domingo a tarde. Já é alguma coisa.
Este tipo de espetáculo é uma fraude e como disse o garoto ai acima é sempre a mesma música e isso no mínimo é uma palhaçada.
ResponderExcluirUm ídolo geralmente tem composições próprias e se afirma como tal através delas e não para ir lá ficar cantando aqueles porcarias.
Isso por um lado reflete bem oque é o Brasil, que na verdade tem vergonha de suas matrizes européias, africanas e indígenas e sempre foi educado para ter vergonha e repúdio do seu passado e o resultado vemos claramente a falta de identidade e o efeito colateral é essa busca desmedida pelo modelo do país de primeiro mundo.
Esse problema da falta de identidade é problema educacional e não é muito difícil de se resolver. Mas algo fica bem claro e se as pessoas não prestam a atenção no seguinte as novas gerações que estão vindo pela frente estão cada vez mais aculturadas dentro de um processo imbecilizante e infantilizador e os elos com a cultura brasileira estão desaparecendo e caras como: Tim Maia, Nilton Nascimento, Chico Buarque, Jorge Ben e entre outros que falavam muito a respeito do Brasil de uma forma poética podemos dizer assim vão desaparecer daqui a pouco a maioria desses caras já estão beirando os 70 anos.
Quem vai retratar o Brasil da maneira que eles retraram? Nx Zero, Luan Santana, Restart, Fresco e mais essas tranqueiras que estão despontando atualmente.
Sabe o que é vergonhoso? é que este tipo de reality show escancara uma série de deficiências da sociedade brasileira cuja primeira é absoluta falta de educação, o baixo nível cultural que revela os anos de exploração do povo.
E a cada geração que passa, esses níveis vão caindo de maneira grotesca, pois experimente perguntar para um garoto, um adulto quantos livros ele lê por ano e ai a resposta já aparece.