Dando sequência à série dedicada aos nomes esquecidos e pouco reconhecidos do hard rock setentista, listei mais dez bandas muito interessantes surgidas naquela época e que valem muito a pena. Talvez vocês já conheçam algumas, talvez não, mas o que vale é mergulhar mais uma vez no poeirento universo do rock pesado produzido durante a década de 1970.
Para ler as duas primeiras edições da série, clique aqui.
Prepare a sua air guitar e venha comigo!
Cactus
Um dos primeiros supergrupos de que se tem notícia, o Cactus inicialmente contaria com a cozinha do Vanilla Fudge, Tim Bogert e Carmine Appice, devidamente turbinada pela guitarra de Jeff Beck e pelos vocais de Rod Stewart. Infelizmente essa formação não vingou devido a um acidente de carro sofrido por Beck, o que influenciou na decisão de Stewart em se juntar com Ron Wood e formar os Faces. Como curiosidade, vale dizer que após a recuperação do guitarrista o trio remanescente efetivou o desejo de tocar junto no Beck, Bogert & Appice, mas isso é um papo para outro dia.
Com o declínio da dupla, Tim e Carmine foram atrás de novos membros, e encontraram os parceiros ideais no guitarrista Jim McCarty (ex-Mitch Ryder´s Detroit Wheels) e no vocalista Rusty Day, ex-Amboy Dukes. Esse clássico line-up gravou três ótimos discos no biênio 1970/1971 (Cactus, One Way ... or Another e Restrictions), até a saída de McCarty no final de 1971.
O som do Cactus é um hard cru, com muita influência de blues. A cozinha de Tim Bogert e Carmine Appice, pra lá de entrosada pelos anos no Vanilla Fudge e aliada a técnica ímpar dos dois músicos, é um dos principais destaques, mas o fato é que todo o line-up é animal, com grandes riffs faiscando na guitarra de Jim McCarty e os vocais rasgados de Rusty Day.
Clique e ouça uma música da banda.
May Blitz
Hard rock clássico, com longas passagens instrumentais, onde destacam-se muito bem colocadas intervenções acústicas. Gosto muito do modo de tocar do guitarrista Jamie Black, entregando notas que soam puras e limpas aos meus ouvidos. Por outro lado, os vocais, também a cargo de Black, na minha opinião poderiam ser melhores, mas nada que prejudique o disco.
As melodias caminham por caminhos muito interessantes, com as músicas tendo várias partes independentes que formam um todo muito vigoroso e cativante. No primeiro disco, batizando com o nome do grupo e lançado em 1970, destaque para "Somoking The Day Away" (com uma passagem acústica no meio que é de arrepiar), "I Don´t Know?", "Squeet", "Fire Queen" e a viajandona "Virgin Waters".
Já o segundo e último álbum do grupo, The 2nd Of May, traz algumas diferenças em relação ao primeiro disco dos caras. O som está mais evoluído, transitando não apenas no hard rock calcado no blues, mas arriscando até mesmo algumas passagens por estilos como jazz e folk. Essa evolução fica ainda mais evidente pela ótima produção, muito melhor que a do primeiro registro do May Blitz.
O álbum abre com "For Mad Men Only", hardão com batida reta, muita energia e um grande solo de Black. As coisas começam a mudar de figura com a deliciosa "Snakes And Ladders", construída sobre um groove psicodélico e hipnótico. Já "The 25th Of December 1969" é uma balada saudosista e bastante emocional, com um trecho central influenciadíssimo pelos grupos de jazz rock que estavam bombando naquela época. O jazz marca presença também em "In Part", que conta com uma flauta doce e um longo solo de bateria de Tony Newman.
Mostrando mais uma vez o quanto estavam consumindo o que estava rolando no então nascente jazz rock, o trio compôs "Mad Grim Nits", única faixa instrumental de sua carreira, e que traz solos que remetem ao que Miles Davis fez no álbum "Jack Johnson". "High Beech" acalma os ânimos, e seus violões nos transportam para mundos mais coloridos. Uma das melhores músicas da curta carreira do grupo, uma pequena pérola perdida, doce e repleta de lirismo.
Fechando o play, um par de grandes faixas. "Honey Coloured Time" tem um riff que é irmão de "Smoking the Day Away", composição que abre o álbum de estréia dos ingleses. O legal em "Honey Coloured Time" é que a canção evolui sobre caminhos insólitos, em um arranjo muito interessante que traz, novamente, passagens que são puro jazz. A viajante "Just Thinking" encerra o disco, e paga tributo aos melhores momentos do rock psicodélico produzido na ilha da rainha durante os anos 60.
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Jericho
A banda israelense Jaricho lançou apenas um disco, e esse álbum é um dos grandes tesouros perdidos da década de setenta.
O grupo, na verdade, surgiu como Churchill´s em 1965 em Tel Aviv, e lançou um álbum em 1968 intitulado apenas com o nome da banda. Após algumas mudanças de formação, passou a se chamar Jericho Jones, e, sob essa alcunha, soltou a bela bolacha Junkies Monkeys & Donkeys em 1971.
Já na Inglaterra, para onde haviam mudando um tempo antes, o grupo passou a se chamar apenas Jericho, e gravou essa pedrada lançada em 1972. O play é um desbunde pra quem curte hard rock setentista. Jericho, o disco, traz cinco faixas de um hard rock complexo, com longas passagens instrumentais e alguns toques de progressivo. A faixa de abertura, "Ethiopia", é um proto-metal competente, mas os melhores momentos do trabalho estão em "Don´t You Let Me Down", na ótima "Featherbed", na sensacional "Justin and Nova" - que conta inclusive com um arranjo de cordas - e no encerramento, com "Kill Me With Your Love".
Sem dúvida alguma, um dos melhores álbuns de hard rock lançados durante a década de setenta. Uma pena que o grupo não conseguiu uma projeção maior, mas o talento dos caras ficou eternizado em seus discos.
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Twenty Sixty Six and Then
Um dos discos mais cultuados pelos arqueólogos apreciadores de bandas obscuras setentistas, Reflections on the Future, primeiro e único álbum da banda alemã Twenty Sixty Six and Then, é uma verdadeira pérola perdida que aos poucos vem sendo redescoberta por uma geração de novos ouvintes.
O curioso nome do grupo é uma alusão à histórica Batalha de Hastings, ocorrida em 14 de outubro de 1066. Neste combate, as tropas inglesas comandadas pelo Rei Haroldo II foram derrotadas pelo exército de Guilherme II, Duque de Normandia, marcando o fim da dinastia de reis anglo-saxões na Inglaterra.
A banda era formada pelo vocalista inglês Geff Harrison, pelo guitarrista Gagey Mrozeck, pelo baixista Dieter Bauer, pelo batera Konstantin Bommarius e pela dupla de tecladistas Steve Robinson e Veit Marvos, também responsáveis por instrumentos como vibrafone, sintetizadores e mellotron. Infelizmente, a qualidade de sua música é inversamente proporcional ao seu tempo de vida: o grupo durou apenas da primavera de 1971 ao verão de 1972, tempo suficiente para lançar uma verdadeira obra-prima.
Reflections on the Future, lançado em 1972 pela United Artists, é uma preciosidade sônica clamando para ser descoberta. Gravado no outono de 1971 no Dierks Studio, do lendário produtor Dieter Dierks, localizado na pequena cidade de Stommeln, próxima à Colônia, o álbum contém apenas cinco faixas. O estilo dos caras é um hard progressivo calcado em hipnotizantes passagens de Hammond e guitarras pesadas, tudo costurado pelo vocal carregado de influências soul de Harrison. Um som de personalidade forte, e que cai como uma luva nos apreciadores do Deep Purple devido ao guitarrista Gagey Mrozeck ter um estilo similar ao de Ritchie Blackmore e, é claro, aos teclados inspirados, na melhor escola Jon Lord.
O play abre com “At My Home”, um hard rock com ótimas passagens de teclado temperado por uma bem-vinda flauta, a cargo de Wolfang Schonbrot, amigo da banda. O disco segue com “Autumn”, uma faixa densa com letra melancólica sobre a morte.
A seguir temos um dos melhores momentos do disco. “Butterking” é uma peça com pouco mais de sete minutos, onde os trechos característicos do Hammond e os riffs de guitarra são entrecortados por inusitados interlúdios de piano carregados com toda a tradição do ragtime. Uma jornada sonora de andamento nada previsível, que mostra toda a criatividade da banda.
A faixa-título é uma epopéia de mais de quinze minutos com extensas passagens instrumentais de muito bom gosto, culminando em um final com tempero psicodélico.
Fechando o trabalho, “How Do You Feel”, a mais curta de todas, com pouco mais de três minutos editados a partir da versão original, que se estendia inicialmente por mais de treze minutos de duração. O plano inicial do grupo era lançar um single para promover o álbum, mas a prematura dissolução da banda inviabilizou o projeto.
Em 1989 a excelente gravadora alemã Second Battle – que originalmente operava como uma loja de discos em Berlim – relançou Reflections on the Future em uma edição limitada e numerada de 1.000 cópias em vinil, mantendo a belíssima arte da capa original, criada por Gunter Karl. A reedição da Second Battle apresentou a banda para uma nova geração de ouvintes, atiçando o culto pelo grupo.
Em 1991, a mesma Second Battle lançou Reflections on the Past, um vinil de três lados que logo se transformou em item de colecionador por trazer material inédito e outtakes, além de três faixas retiradas de um ensaio realizado pelos caras em maio de 1971: os onze minutos de “The Way I Feel Today”, um versão de “At My Home” beirando os dez minutos, e a inédita “Spring”. Reflections on the Past traz também os duas faixas que iriam estar no nunca lançado primeiro e único single do grupo, “Winter” e “I Saw the World”.
A Second Battle ainda brindou os fãs com o lançamento de mais um item dos caras, desta vez intitulado apenas como Reflections!, em 1993. Disponibilizado apenas em CD, Reflections! é uma espécie de “best of” dos dois lançamentos anteriores.
O Twenty Sixty Six & Then encerrou as suas atividades no verão de 1972. Geff Harrison e Gagey Mrozeck juntaram-se ao Kin Ping Meh e participaram do terceiro disco do grupo, Kin Ping Meh 3, lançado em 1973. Steve Robinson tocou com o Nine Days Wonder e com o Aera. Já o tecladista Veit Marvos tocou e gravou ao lado de nomes como Emergency, Tiger B. Smith e Midnight Circus. E o baterista Konstantin Bommarius tocou com o Abacus e gravou o álbum Rock´n´Roll Testament, lançado pelo grupo alemão Karthago em 1975.
Uma grande banda, com grandes sons, que registrou a sua obra para a eternidade em um ótimo disco. Os anos sessenta e setenta estão repletos de histórias como a do Twenty Sisty Six & Then. Artistas de talento inegável, injustamente relegados à obscuridade, mas que vem sendo redescobertos gradativamente pelos colecionadores e garimpeiros de preciosidades. Um terreno fértil, que rende contatos imediatos com sons arrepiantes.
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Días de Blues
O Días de Blues foi uma banda uruguaia formada em Montevidéu em 1972. O grupo surgiu após a separação do Opus Alfa, de onde vieram o baterista Jorge Graf e o vocalista e baixista Jorge Barral. A eles juntou-se o guitarrista e também vocalista Daniel Bertolone, e juntos gravaram esse único e raríssimo disco, que chegou ao mercado naquele mesmo ano.
O som do Días de Blues é um blues pesado e repleto de riffs típicos do hard rock, com influências de nomes como Cream e Led Zeppelin. A mixagem, que deixou o som bem cru, coloca mais charme ainda no disco, deixando tudo bem na cara e com ar de "ao vivo" no estúdio. Entre as faixas, destacaria a abertura com "Amasijando los Blues", a deliciosa e acústica "Dame Tu Sonrisa Loco", o hard rock de "No Podram Conmigo", "Estan Desubicados", "Esto Es Nuestro" e a longa "Toda Tu Vida", que encerra o álbum.
Este debut e único disco do Días de Blues foi lançado com duas capas diferentes, sendo uma para a versão original uruguaia e outra para a versão argentina (posso estar enganado, mas tenho quase certeza de que o disco também saiu no Brasil naquela época - caso contrário, me corrijam). Ambas são muito raras e desejadas, principalmente a uruguaia, alcançando valores consideráveis entre os colecionadores. Existe uma versão em CD do álbum, lançada pela ótima gravadora italiana Akarma em 2000, e que é consideravelmente mais fácil de ser encontrada.
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Incredible Hog
Nascido em Londres em 1972 pelas mãos do vocalista, guitarrista e compositor Ken Gordon e do baixista Jim Holmes, o Incredible Hog é uma típica pérola perdida setentista. Gordon e Holmes, colegas de escola, já haviam tocado juntos no Speed Auction, mas sem conseguir maiores repercussões. Cansados e insatisfeitos com os rumos do grupo, decidiram criar eles mesmos uma nova banda em meados de 1972. Fãs de histórias em quadrinhos, batizaram o conjunto como Incredible Hog, uma homenagem à revista Incredible Hulk, publicada pela Marvel Comics.
Após testarem inúmeros bateristas, encontraram no sul-africano Tony Awin o line-up perfeito. Com essa formação fizeram alguns shows pelo circuitos de bares ingleses, mas a dificuldade e a enorme concorrência tornavam o agendamento de novas apresentações uma verdadeira luta. O Incredible Hog encontrou a solução para esse problema de uma forma inusitada: abriu o seu próprio clube, batizado como The Pig Sty, em Forest Gate, na capital inglesa. Lá realizaram inúmeros shows, ganhando confiança, experiência e força coletiva.
As vibrantes performances do trio chamaram a atenção de publicações como a Melody Maker, tornando o Incredible Hog cada vez mais conhecido e comentado entre a galera rocker londrina. Infelizmente esse prestígio não bateu na porta das gravadoras, já que nenhuma companhia foi atrás do grupo. Inconformado, o líder Ken Gordon foi até o escritório da Dart Records com a demo tape da banda embaixo do braço e se recusou a sair enquanto alguém não ouvisse a sua música. O resultado? Gordon ficou um dia dentro da gravadora e foi retirado pela polícia, mas a sua persistência teve resultado, já que um dos cabeças da Dart ficou curioso com a história, ouviu a fita e, passadas duas semanas, ofereceu um contrato para o Incredible Hog.
Roger Watson, profissional com experiência em grupos de comedy rock, foi indicado pela gravadora para produzir o álbum, o que gerou alguns atritos com a banda, que frequentemente ia em uma direção enquanto Watson indicava outro caminho. Felizmente, essa tensão entre os dois lados acabou sendo benéfica, resultando em um disco excelente. Volume 1 traz dez faixas com um hard rock coeso, ácido em alguns momentos, com uma soridade crua embalada em arranjos contagiantes. O grande destaque do play é Ken Gordon, tanto por suas interpretações únicas quanto por sua guitarra, a força motriz do grupo. Entre as faixas destacaria "Lame", "Wreck My Soul", a linda balada "Execution", a furiosa "Another Time", "Warning", "Walk The Road" e "There´s a Man". O fato é que "Volume 1" tem muito daquilo que hoje em dia se convencionou chamar de "classic rock", com riffs empolgantes de guitarra, linhas vocais cativantes e uma cozinha pesada, o que faz com que o disco reserve momentos de enorme prazer para qualquer apreciador de hard, blues e rock setentista.
Paradoxalmente, apesar de ter sido aclamado pela crítica da época, o álbum não bateu junto ao público, que praticamente o ignorou. Isso, somado a um praticamente inexistente trabalho de divulgação por parte da gravadora, fez com que Gordon, Holmes e Awin desanimassem e encerrassem as atividades do Incredible Hog no final de 1973. Ken Gordon virou um músico de estúdio, tocando em trabalhos de nomes como The Rubettes, The Tremeloes e Heavy Metal Kids. Jim Holmes transformou-se em produtor do lendário Scarf Studios, e atualmente é dono de uma companhia de teatro. Já Tony Awin trabalhou com o Crazy World Of Arthur Brown e com o James Last, e atualmente é um renomado músico de estúdio.
O álbum saiu com três capas diferentes. A original inglesa da gravadora Dart trazia um irreverente porco mostrando a língua e apenas o nome da banda. A versão alemã, lançada pela Telefunken (Cat# SLE 14 738-P), tinha uma ilustração de uma porca toda produzida, enquanto que a espanhola, publicada pela Carnaby (Cat# CPS 9476), mostrava uma foto da banda em um cenário soturno, que parece ser um cemitério. As três são extremamente raras, e, quando encontradas em suas edições originais, alcançam valores estratosféricos entre os colecionadores. A excelente gravadora alemã Repertoire lançou em 1994 o álbum em CD (Cat# REP 4511-WP), saciando a fome dos aficcionados, enquanto a espanhola Wah Wah colocou no mercado uma edição em vinil de 180 gramas em 1999 (Cat# LPS002). Se você encontrar qualquer uma delas compre na hora, porque irá estar adquirindo uma jóia rara para a sua coleção.
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Armageddon
O Armageddon (não confundir com o homônimo alemão) foi um grupo formado e liderado por Keith Relf, ex-vocalista dos Yardbirds e do Renaissance. Relf estava interessado em tocar um som mais pesado, na linha dos nomes que estavam surgindo na Europa e nos Estados Unidos naqueles primeiros anos da década de 1970.
Para isso, chamou o guitarrista Martin Pugh (Steamhammer) e o baixista Louis Cennamo (Steamhammer, Renaissance). Após testar vários bateristas sem sucesso, deixou a Inglaterra pra trás e se mandou para Los Angeles com Pugh e Cennamo e dois objetivos: conferir a cena hard rock que rolava na Califórnia e encontrar um baterista para completar o seu novo grupo. Em LA Relf conheceu Bobby Caldwell (Captain Beyond) em um clube, convidou-o para uma jam e pronto: nascia o Armageddon.
O quarteto começou a ensaiar algumas músicas que Relf já tinha prontas, viu nascer novas idéias em ensaios e foi para o estúdio, onde gravou um dos melhores discos de hard rock dos anos setenta. Com apenas cinco faixas, Armageddon, o disco, em nada lembra os trabalhos anteriores de Keith Relf. O que sai dos alto falantes é um vigoroso hard, com um estupendo trabalho da guitarra de Martin Pugh e com a classe e o talento habituais de Bobby Caldwell. Entre as músicas, destaque imenso para a abertura com "Buzzard", com um excelente riff de Pugh e ótimos vocais de Relf, mas todas as faixas (eu disse TODAS) são excepcionais, e cativam imensamente até hoje. Grande álbum, clássico indiscutível.
Infelizmente o Armageddon não seguiu adiante em virtude da morte prematura de Keith Relf, eletrocutado em um acidente doméstico no dia 14 de maio de 1976, aos 33 anos.
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Marcus
Esse único registro do grupo norte-americano Marcus é um dos mais raros e obscuros álbuns do hard rock setentista. Natural de Detroit, a banda era formada pelo vocalista Marcus Malone, pelo trio de guitarristas-solo Gene Bloch, Randall David e Jack Weber, pelo baterista Dandy "Star" Holmes e pelo lendário baixista Tim Bogert, ex-Cactus, Vanilla Fudge e Beck Bogert & Appice.
O álbum é uma pedrada, um verdadeiro clássico perdido. A qualidade de suas oito composições espanta e nos faz pensar como uma banda tão fantástica como essa não alcançou uma repercussão maior. O fato é que a gravadora do grupo, a United Artists, investiu muito pouco, praticamente nada, na promoção do álbum, o que, somado ao fato de o disco ter sido lançado em pleno auge da disco music e com uma capa que mais remete a um trabalho de funk do que de hard rock, fez com que as lojas norte-americanas colocassem o play na seção de funk e r&b, "escondendo-o" dos ouvintes de música pesada, que certamente iriam pirar com o trabalho.
Marcus, o álbum, abre com "Black Magic", um soco no estômago que conta com um riff semelhante ao de "Space Truckin´" do Deep Purple, com um timbre de guitarras pesadíssimo, bem na linha de "Miss Misery", do Nazareth. De cara já fica escancarado o poder do paredão de guitarras formado por Bloch, David e Weber, e o talento de Marcus Malone, dono de um timbre muito agradável.
O disco prossegue com "Salmon Ball", que coloca um certo tempero funk no heavy rock dos caras. "Kelly" é uma bonita balada, onde o destaque são os ótimos vocais de Malone. O clima volta a ferver com "Gypsy Fever", outra que explora, com grande talento, o resultado da união do funk com o hard.
Uma das melhores vem a seguir. "Pillow Stars" já abre com um peso gigantesco, parecendo aqueles sons tão habituais em álbuns de grupos da New Wave of British Heavy Metal. Mas, quando pensamos que um riff irá entrar e detonar tudo, somos supreendidos por um andamento meio jazzy, que evolui para grandes melodias de guitarra, com Malone cantando em tons bem altos, acompanhado por ótimos backing vocals. Um heavy metal sensacional!
Um ótimo riff introduz "Highschool Ladies Streetcorner Babies", com um andamento que nos leva de volta aos discos lançados pelo Aerosmith nos anos setenta. "Dream Wheel" tem elementos do que viria a ser conhecido como AOR, com ótimos coros. E, fechando o disco, "Rise Unto Falcon" chega a lembrar algo de Judas Priest.
Extremamente difícil de ser encontrado, o álbum recebeu uma reedição em CD em 2000, lançada pela gravadora inglesa Zoom Club, e mesmo essa versão é rara de se conseguir. O fato é que, indiscutivelmente, Marcus é um disco obrigatório e que agradará em cheio quem curte um inspirado e competente heavy metal com sabor setentista.
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Murasaki
Considerado uma espécie de Deep Purple japonês, o Murasaki foi formado na cidade de Okinawa em 1970. Liderado pelo tecladista George Murasaki, o grupo lançou poucos álbuns em sua carreira, sendo que os principais são a estreia auto-intitulada de 1975, Impact de 1976 e Doin´ Our Thing at the Live House de 1977.
O som dos caras é influenciadíssimo não só pelo Purple mas também por outros nomes como o Uriah Heep, ou seja, é um hard rock orientado para o teclado, com grandes melodias e longas passagens instrumentais.
Particularmente, considero o segundo disco, Impact, o melhor trabalho dos caras, com ótimas faixas como "Fly Me Away", "Let Me Go", "Mother Nature´s Plight" e "Just a Rock´n´Roll Band".
As versões originais dos álbuns do Murasaki são raríssimas e muito disputadas entre os colecionadores, alcançando valores muitas vezes obcenos quando em ótimo estado.
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Winterhawk
Esse grupo norte-americano tem uma história muito interessante. Formado por quatro descendentes de índios, o Winterhawk lançou apenas dois discos (Electric Warriors em 1979 e Dog Soldier em 1980), ambos explorando, tanto liricamente quanto em termos musicais, sua rica herança cultural.
O grupo foi formado em San Francisco, e durante a sua carreira abriu shows para nomes como Tina Turner, Santana, Country Joe and the Fish, Steve Miller, Van Halen e Motley Crue. Liderado pelo vocalista e guitarrista Nik Alexander, o Winterhawk executa um hard rock selvagem, com bons riffs de guitarra e uma agressividade que, em alguns momentos, os aproxima do heavy metal.
Electric Warriors abre com a arrepiante "Prayer", que, como o nome diz, é uma prece que dá início à celebração. A segunda faixa, "Got to Save It", é um hardão sangrento, enquanto a balada "Black Whiskey" acalma um poucos os ânimos. Destaque para as melodias de guitarra de "Dark Skin Lady", com uma grande interpretação vocal de Alexander. O grupo sabe explorar as suas características culturais próprias, colocando elementos da cultura indígena em faixas como "Selfish Man", que tem passagens que parecem sair de uma cerimônia pele-vermelha.
Fechando o play, "Custer´s Dyin´" narra a saga do general George Armstrong Custer, famoso militar norte-americano que massacrou milhares de índios cheyennes e sioux, mas sobre a ótica dos índios e não dos brancos. A composição soa como um acerto de contas entre os nativos do novo continente e seus algozes, e fecha o trabalho em alto nível, inclusive com a inserção de alguns cantos típicos de tribos indígenas.
Um disco curioso e único, que vale a pena ser conhecido.
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Por Ricardo Seelig
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Prepare a sua air guitar e venha comigo!
Cactus
Um dos primeiros supergrupos de que se tem notícia, o Cactus inicialmente contaria com a cozinha do Vanilla Fudge, Tim Bogert e Carmine Appice, devidamente turbinada pela guitarra de Jeff Beck e pelos vocais de Rod Stewart. Infelizmente essa formação não vingou devido a um acidente de carro sofrido por Beck, o que influenciou na decisão de Stewart em se juntar com Ron Wood e formar os Faces. Como curiosidade, vale dizer que após a recuperação do guitarrista o trio remanescente efetivou o desejo de tocar junto no Beck, Bogert & Appice, mas isso é um papo para outro dia.
Com o declínio da dupla, Tim e Carmine foram atrás de novos membros, e encontraram os parceiros ideais no guitarrista Jim McCarty (ex-Mitch Ryder´s Detroit Wheels) e no vocalista Rusty Day, ex-Amboy Dukes. Esse clássico line-up gravou três ótimos discos no biênio 1970/1971 (Cactus, One Way ... or Another e Restrictions), até a saída de McCarty no final de 1971.
O som do Cactus é um hard cru, com muita influência de blues. A cozinha de Tim Bogert e Carmine Appice, pra lá de entrosada pelos anos no Vanilla Fudge e aliada a técnica ímpar dos dois músicos, é um dos principais destaques, mas o fato é que todo o line-up é animal, com grandes riffs faiscando na guitarra de Jim McCarty e os vocais rasgados de Rusty Day.
Clique e ouça uma música da banda.
May Blitz
Hard rock clássico, com longas passagens instrumentais, onde destacam-se muito bem colocadas intervenções acústicas. Gosto muito do modo de tocar do guitarrista Jamie Black, entregando notas que soam puras e limpas aos meus ouvidos. Por outro lado, os vocais, também a cargo de Black, na minha opinião poderiam ser melhores, mas nada que prejudique o disco.
As melodias caminham por caminhos muito interessantes, com as músicas tendo várias partes independentes que formam um todo muito vigoroso e cativante. No primeiro disco, batizando com o nome do grupo e lançado em 1970, destaque para "Somoking The Day Away" (com uma passagem acústica no meio que é de arrepiar), "I Don´t Know?", "Squeet", "Fire Queen" e a viajandona "Virgin Waters".
Já o segundo e último álbum do grupo, The 2nd Of May, traz algumas diferenças em relação ao primeiro disco dos caras. O som está mais evoluído, transitando não apenas no hard rock calcado no blues, mas arriscando até mesmo algumas passagens por estilos como jazz e folk. Essa evolução fica ainda mais evidente pela ótima produção, muito melhor que a do primeiro registro do May Blitz.
O álbum abre com "For Mad Men Only", hardão com batida reta, muita energia e um grande solo de Black. As coisas começam a mudar de figura com a deliciosa "Snakes And Ladders", construída sobre um groove psicodélico e hipnótico. Já "The 25th Of December 1969" é uma balada saudosista e bastante emocional, com um trecho central influenciadíssimo pelos grupos de jazz rock que estavam bombando naquela época. O jazz marca presença também em "In Part", que conta com uma flauta doce e um longo solo de bateria de Tony Newman.
Mostrando mais uma vez o quanto estavam consumindo o que estava rolando no então nascente jazz rock, o trio compôs "Mad Grim Nits", única faixa instrumental de sua carreira, e que traz solos que remetem ao que Miles Davis fez no álbum "Jack Johnson". "High Beech" acalma os ânimos, e seus violões nos transportam para mundos mais coloridos. Uma das melhores músicas da curta carreira do grupo, uma pequena pérola perdida, doce e repleta de lirismo.
Fechando o play, um par de grandes faixas. "Honey Coloured Time" tem um riff que é irmão de "Smoking the Day Away", composição que abre o álbum de estréia dos ingleses. O legal em "Honey Coloured Time" é que a canção evolui sobre caminhos insólitos, em um arranjo muito interessante que traz, novamente, passagens que são puro jazz. A viajante "Just Thinking" encerra o disco, e paga tributo aos melhores momentos do rock psicodélico produzido na ilha da rainha durante os anos 60.
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Jericho
A banda israelense Jaricho lançou apenas um disco, e esse álbum é um dos grandes tesouros perdidos da década de setenta.
O grupo, na verdade, surgiu como Churchill´s em 1965 em Tel Aviv, e lançou um álbum em 1968 intitulado apenas com o nome da banda. Após algumas mudanças de formação, passou a se chamar Jericho Jones, e, sob essa alcunha, soltou a bela bolacha Junkies Monkeys & Donkeys em 1971.
Já na Inglaterra, para onde haviam mudando um tempo antes, o grupo passou a se chamar apenas Jericho, e gravou essa pedrada lançada em 1972. O play é um desbunde pra quem curte hard rock setentista. Jericho, o disco, traz cinco faixas de um hard rock complexo, com longas passagens instrumentais e alguns toques de progressivo. A faixa de abertura, "Ethiopia", é um proto-metal competente, mas os melhores momentos do trabalho estão em "Don´t You Let Me Down", na ótima "Featherbed", na sensacional "Justin and Nova" - que conta inclusive com um arranjo de cordas - e no encerramento, com "Kill Me With Your Love".
Sem dúvida alguma, um dos melhores álbuns de hard rock lançados durante a década de setenta. Uma pena que o grupo não conseguiu uma projeção maior, mas o talento dos caras ficou eternizado em seus discos.
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Twenty Sixty Six and Then
Um dos discos mais cultuados pelos arqueólogos apreciadores de bandas obscuras setentistas, Reflections on the Future, primeiro e único álbum da banda alemã Twenty Sixty Six and Then, é uma verdadeira pérola perdida que aos poucos vem sendo redescoberta por uma geração de novos ouvintes.
O curioso nome do grupo é uma alusão à histórica Batalha de Hastings, ocorrida em 14 de outubro de 1066. Neste combate, as tropas inglesas comandadas pelo Rei Haroldo II foram derrotadas pelo exército de Guilherme II, Duque de Normandia, marcando o fim da dinastia de reis anglo-saxões na Inglaterra.
A banda era formada pelo vocalista inglês Geff Harrison, pelo guitarrista Gagey Mrozeck, pelo baixista Dieter Bauer, pelo batera Konstantin Bommarius e pela dupla de tecladistas Steve Robinson e Veit Marvos, também responsáveis por instrumentos como vibrafone, sintetizadores e mellotron. Infelizmente, a qualidade de sua música é inversamente proporcional ao seu tempo de vida: o grupo durou apenas da primavera de 1971 ao verão de 1972, tempo suficiente para lançar uma verdadeira obra-prima.
Reflections on the Future, lançado em 1972 pela United Artists, é uma preciosidade sônica clamando para ser descoberta. Gravado no outono de 1971 no Dierks Studio, do lendário produtor Dieter Dierks, localizado na pequena cidade de Stommeln, próxima à Colônia, o álbum contém apenas cinco faixas. O estilo dos caras é um hard progressivo calcado em hipnotizantes passagens de Hammond e guitarras pesadas, tudo costurado pelo vocal carregado de influências soul de Harrison. Um som de personalidade forte, e que cai como uma luva nos apreciadores do Deep Purple devido ao guitarrista Gagey Mrozeck ter um estilo similar ao de Ritchie Blackmore e, é claro, aos teclados inspirados, na melhor escola Jon Lord.
O play abre com “At My Home”, um hard rock com ótimas passagens de teclado temperado por uma bem-vinda flauta, a cargo de Wolfang Schonbrot, amigo da banda. O disco segue com “Autumn”, uma faixa densa com letra melancólica sobre a morte.
A seguir temos um dos melhores momentos do disco. “Butterking” é uma peça com pouco mais de sete minutos, onde os trechos característicos do Hammond e os riffs de guitarra são entrecortados por inusitados interlúdios de piano carregados com toda a tradição do ragtime. Uma jornada sonora de andamento nada previsível, que mostra toda a criatividade da banda.
A faixa-título é uma epopéia de mais de quinze minutos com extensas passagens instrumentais de muito bom gosto, culminando em um final com tempero psicodélico.
Fechando o trabalho, “How Do You Feel”, a mais curta de todas, com pouco mais de três minutos editados a partir da versão original, que se estendia inicialmente por mais de treze minutos de duração. O plano inicial do grupo era lançar um single para promover o álbum, mas a prematura dissolução da banda inviabilizou o projeto.
Em 1989 a excelente gravadora alemã Second Battle – que originalmente operava como uma loja de discos em Berlim – relançou Reflections on the Future em uma edição limitada e numerada de 1.000 cópias em vinil, mantendo a belíssima arte da capa original, criada por Gunter Karl. A reedição da Second Battle apresentou a banda para uma nova geração de ouvintes, atiçando o culto pelo grupo.
Em 1991, a mesma Second Battle lançou Reflections on the Past, um vinil de três lados que logo se transformou em item de colecionador por trazer material inédito e outtakes, além de três faixas retiradas de um ensaio realizado pelos caras em maio de 1971: os onze minutos de “The Way I Feel Today”, um versão de “At My Home” beirando os dez minutos, e a inédita “Spring”. Reflections on the Past traz também os duas faixas que iriam estar no nunca lançado primeiro e único single do grupo, “Winter” e “I Saw the World”.
A Second Battle ainda brindou os fãs com o lançamento de mais um item dos caras, desta vez intitulado apenas como Reflections!, em 1993. Disponibilizado apenas em CD, Reflections! é uma espécie de “best of” dos dois lançamentos anteriores.
O Twenty Sixty Six & Then encerrou as suas atividades no verão de 1972. Geff Harrison e Gagey Mrozeck juntaram-se ao Kin Ping Meh e participaram do terceiro disco do grupo, Kin Ping Meh 3, lançado em 1973. Steve Robinson tocou com o Nine Days Wonder e com o Aera. Já o tecladista Veit Marvos tocou e gravou ao lado de nomes como Emergency, Tiger B. Smith e Midnight Circus. E o baterista Konstantin Bommarius tocou com o Abacus e gravou o álbum Rock´n´Roll Testament, lançado pelo grupo alemão Karthago em 1975.
Uma grande banda, com grandes sons, que registrou a sua obra para a eternidade em um ótimo disco. Os anos sessenta e setenta estão repletos de histórias como a do Twenty Sisty Six & Then. Artistas de talento inegável, injustamente relegados à obscuridade, mas que vem sendo redescobertos gradativamente pelos colecionadores e garimpeiros de preciosidades. Um terreno fértil, que rende contatos imediatos com sons arrepiantes.
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Días de Blues
O Días de Blues foi uma banda uruguaia formada em Montevidéu em 1972. O grupo surgiu após a separação do Opus Alfa, de onde vieram o baterista Jorge Graf e o vocalista e baixista Jorge Barral. A eles juntou-se o guitarrista e também vocalista Daniel Bertolone, e juntos gravaram esse único e raríssimo disco, que chegou ao mercado naquele mesmo ano.
O som do Días de Blues é um blues pesado e repleto de riffs típicos do hard rock, com influências de nomes como Cream e Led Zeppelin. A mixagem, que deixou o som bem cru, coloca mais charme ainda no disco, deixando tudo bem na cara e com ar de "ao vivo" no estúdio. Entre as faixas, destacaria a abertura com "Amasijando los Blues", a deliciosa e acústica "Dame Tu Sonrisa Loco", o hard rock de "No Podram Conmigo", "Estan Desubicados", "Esto Es Nuestro" e a longa "Toda Tu Vida", que encerra o álbum.
Este debut e único disco do Días de Blues foi lançado com duas capas diferentes, sendo uma para a versão original uruguaia e outra para a versão argentina (posso estar enganado, mas tenho quase certeza de que o disco também saiu no Brasil naquela época - caso contrário, me corrijam). Ambas são muito raras e desejadas, principalmente a uruguaia, alcançando valores consideráveis entre os colecionadores. Existe uma versão em CD do álbum, lançada pela ótima gravadora italiana Akarma em 2000, e que é consideravelmente mais fácil de ser encontrada.
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Incredible Hog
Nascido em Londres em 1972 pelas mãos do vocalista, guitarrista e compositor Ken Gordon e do baixista Jim Holmes, o Incredible Hog é uma típica pérola perdida setentista. Gordon e Holmes, colegas de escola, já haviam tocado juntos no Speed Auction, mas sem conseguir maiores repercussões. Cansados e insatisfeitos com os rumos do grupo, decidiram criar eles mesmos uma nova banda em meados de 1972. Fãs de histórias em quadrinhos, batizaram o conjunto como Incredible Hog, uma homenagem à revista Incredible Hulk, publicada pela Marvel Comics.
Após testarem inúmeros bateristas, encontraram no sul-africano Tony Awin o line-up perfeito. Com essa formação fizeram alguns shows pelo circuitos de bares ingleses, mas a dificuldade e a enorme concorrência tornavam o agendamento de novas apresentações uma verdadeira luta. O Incredible Hog encontrou a solução para esse problema de uma forma inusitada: abriu o seu próprio clube, batizado como The Pig Sty, em Forest Gate, na capital inglesa. Lá realizaram inúmeros shows, ganhando confiança, experiência e força coletiva.
As vibrantes performances do trio chamaram a atenção de publicações como a Melody Maker, tornando o Incredible Hog cada vez mais conhecido e comentado entre a galera rocker londrina. Infelizmente esse prestígio não bateu na porta das gravadoras, já que nenhuma companhia foi atrás do grupo. Inconformado, o líder Ken Gordon foi até o escritório da Dart Records com a demo tape da banda embaixo do braço e se recusou a sair enquanto alguém não ouvisse a sua música. O resultado? Gordon ficou um dia dentro da gravadora e foi retirado pela polícia, mas a sua persistência teve resultado, já que um dos cabeças da Dart ficou curioso com a história, ouviu a fita e, passadas duas semanas, ofereceu um contrato para o Incredible Hog.
Roger Watson, profissional com experiência em grupos de comedy rock, foi indicado pela gravadora para produzir o álbum, o que gerou alguns atritos com a banda, que frequentemente ia em uma direção enquanto Watson indicava outro caminho. Felizmente, essa tensão entre os dois lados acabou sendo benéfica, resultando em um disco excelente. Volume 1 traz dez faixas com um hard rock coeso, ácido em alguns momentos, com uma soridade crua embalada em arranjos contagiantes. O grande destaque do play é Ken Gordon, tanto por suas interpretações únicas quanto por sua guitarra, a força motriz do grupo. Entre as faixas destacaria "Lame", "Wreck My Soul", a linda balada "Execution", a furiosa "Another Time", "Warning", "Walk The Road" e "There´s a Man". O fato é que "Volume 1" tem muito daquilo que hoje em dia se convencionou chamar de "classic rock", com riffs empolgantes de guitarra, linhas vocais cativantes e uma cozinha pesada, o que faz com que o disco reserve momentos de enorme prazer para qualquer apreciador de hard, blues e rock setentista.
Paradoxalmente, apesar de ter sido aclamado pela crítica da época, o álbum não bateu junto ao público, que praticamente o ignorou. Isso, somado a um praticamente inexistente trabalho de divulgação por parte da gravadora, fez com que Gordon, Holmes e Awin desanimassem e encerrassem as atividades do Incredible Hog no final de 1973. Ken Gordon virou um músico de estúdio, tocando em trabalhos de nomes como The Rubettes, The Tremeloes e Heavy Metal Kids. Jim Holmes transformou-se em produtor do lendário Scarf Studios, e atualmente é dono de uma companhia de teatro. Já Tony Awin trabalhou com o Crazy World Of Arthur Brown e com o James Last, e atualmente é um renomado músico de estúdio.
O álbum saiu com três capas diferentes. A original inglesa da gravadora Dart trazia um irreverente porco mostrando a língua e apenas o nome da banda. A versão alemã, lançada pela Telefunken (Cat# SLE 14 738-P), tinha uma ilustração de uma porca toda produzida, enquanto que a espanhola, publicada pela Carnaby (Cat# CPS 9476), mostrava uma foto da banda em um cenário soturno, que parece ser um cemitério. As três são extremamente raras, e, quando encontradas em suas edições originais, alcançam valores estratosféricos entre os colecionadores. A excelente gravadora alemã Repertoire lançou em 1994 o álbum em CD (Cat# REP 4511-WP), saciando a fome dos aficcionados, enquanto a espanhola Wah Wah colocou no mercado uma edição em vinil de 180 gramas em 1999 (Cat# LPS002). Se você encontrar qualquer uma delas compre na hora, porque irá estar adquirindo uma jóia rara para a sua coleção.
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Armageddon
O Armageddon (não confundir com o homônimo alemão) foi um grupo formado e liderado por Keith Relf, ex-vocalista dos Yardbirds e do Renaissance. Relf estava interessado em tocar um som mais pesado, na linha dos nomes que estavam surgindo na Europa e nos Estados Unidos naqueles primeiros anos da década de 1970.
Para isso, chamou o guitarrista Martin Pugh (Steamhammer) e o baixista Louis Cennamo (Steamhammer, Renaissance). Após testar vários bateristas sem sucesso, deixou a Inglaterra pra trás e se mandou para Los Angeles com Pugh e Cennamo e dois objetivos: conferir a cena hard rock que rolava na Califórnia e encontrar um baterista para completar o seu novo grupo. Em LA Relf conheceu Bobby Caldwell (Captain Beyond) em um clube, convidou-o para uma jam e pronto: nascia o Armageddon.
O quarteto começou a ensaiar algumas músicas que Relf já tinha prontas, viu nascer novas idéias em ensaios e foi para o estúdio, onde gravou um dos melhores discos de hard rock dos anos setenta. Com apenas cinco faixas, Armageddon, o disco, em nada lembra os trabalhos anteriores de Keith Relf. O que sai dos alto falantes é um vigoroso hard, com um estupendo trabalho da guitarra de Martin Pugh e com a classe e o talento habituais de Bobby Caldwell. Entre as músicas, destaque imenso para a abertura com "Buzzard", com um excelente riff de Pugh e ótimos vocais de Relf, mas todas as faixas (eu disse TODAS) são excepcionais, e cativam imensamente até hoje. Grande álbum, clássico indiscutível.
Infelizmente o Armageddon não seguiu adiante em virtude da morte prematura de Keith Relf, eletrocutado em um acidente doméstico no dia 14 de maio de 1976, aos 33 anos.
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Marcus
Esse único registro do grupo norte-americano Marcus é um dos mais raros e obscuros álbuns do hard rock setentista. Natural de Detroit, a banda era formada pelo vocalista Marcus Malone, pelo trio de guitarristas-solo Gene Bloch, Randall David e Jack Weber, pelo baterista Dandy "Star" Holmes e pelo lendário baixista Tim Bogert, ex-Cactus, Vanilla Fudge e Beck Bogert & Appice.
O álbum é uma pedrada, um verdadeiro clássico perdido. A qualidade de suas oito composições espanta e nos faz pensar como uma banda tão fantástica como essa não alcançou uma repercussão maior. O fato é que a gravadora do grupo, a United Artists, investiu muito pouco, praticamente nada, na promoção do álbum, o que, somado ao fato de o disco ter sido lançado em pleno auge da disco music e com uma capa que mais remete a um trabalho de funk do que de hard rock, fez com que as lojas norte-americanas colocassem o play na seção de funk e r&b, "escondendo-o" dos ouvintes de música pesada, que certamente iriam pirar com o trabalho.
Marcus, o álbum, abre com "Black Magic", um soco no estômago que conta com um riff semelhante ao de "Space Truckin´" do Deep Purple, com um timbre de guitarras pesadíssimo, bem na linha de "Miss Misery", do Nazareth. De cara já fica escancarado o poder do paredão de guitarras formado por Bloch, David e Weber, e o talento de Marcus Malone, dono de um timbre muito agradável.
O disco prossegue com "Salmon Ball", que coloca um certo tempero funk no heavy rock dos caras. "Kelly" é uma bonita balada, onde o destaque são os ótimos vocais de Malone. O clima volta a ferver com "Gypsy Fever", outra que explora, com grande talento, o resultado da união do funk com o hard.
Uma das melhores vem a seguir. "Pillow Stars" já abre com um peso gigantesco, parecendo aqueles sons tão habituais em álbuns de grupos da New Wave of British Heavy Metal. Mas, quando pensamos que um riff irá entrar e detonar tudo, somos supreendidos por um andamento meio jazzy, que evolui para grandes melodias de guitarra, com Malone cantando em tons bem altos, acompanhado por ótimos backing vocals. Um heavy metal sensacional!
Um ótimo riff introduz "Highschool Ladies Streetcorner Babies", com um andamento que nos leva de volta aos discos lançados pelo Aerosmith nos anos setenta. "Dream Wheel" tem elementos do que viria a ser conhecido como AOR, com ótimos coros. E, fechando o disco, "Rise Unto Falcon" chega a lembrar algo de Judas Priest.
Extremamente difícil de ser encontrado, o álbum recebeu uma reedição em CD em 2000, lançada pela gravadora inglesa Zoom Club, e mesmo essa versão é rara de se conseguir. O fato é que, indiscutivelmente, Marcus é um disco obrigatório e que agradará em cheio quem curte um inspirado e competente heavy metal com sabor setentista.
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Murasaki
Considerado uma espécie de Deep Purple japonês, o Murasaki foi formado na cidade de Okinawa em 1970. Liderado pelo tecladista George Murasaki, o grupo lançou poucos álbuns em sua carreira, sendo que os principais são a estreia auto-intitulada de 1975, Impact de 1976 e Doin´ Our Thing at the Live House de 1977.
O som dos caras é influenciadíssimo não só pelo Purple mas também por outros nomes como o Uriah Heep, ou seja, é um hard rock orientado para o teclado, com grandes melodias e longas passagens instrumentais.
Particularmente, considero o segundo disco, Impact, o melhor trabalho dos caras, com ótimas faixas como "Fly Me Away", "Let Me Go", "Mother Nature´s Plight" e "Just a Rock´n´Roll Band".
As versões originais dos álbuns do Murasaki são raríssimas e muito disputadas entre os colecionadores, alcançando valores muitas vezes obcenos quando em ótimo estado.
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Winterhawk
Esse grupo norte-americano tem uma história muito interessante. Formado por quatro descendentes de índios, o Winterhawk lançou apenas dois discos (Electric Warriors em 1979 e Dog Soldier em 1980), ambos explorando, tanto liricamente quanto em termos musicais, sua rica herança cultural.
O grupo foi formado em San Francisco, e durante a sua carreira abriu shows para nomes como Tina Turner, Santana, Country Joe and the Fish, Steve Miller, Van Halen e Motley Crue. Liderado pelo vocalista e guitarrista Nik Alexander, o Winterhawk executa um hard rock selvagem, com bons riffs de guitarra e uma agressividade que, em alguns momentos, os aproxima do heavy metal.
Electric Warriors abre com a arrepiante "Prayer", que, como o nome diz, é uma prece que dá início à celebração. A segunda faixa, "Got to Save It", é um hardão sangrento, enquanto a balada "Black Whiskey" acalma um poucos os ânimos. Destaque para as melodias de guitarra de "Dark Skin Lady", com uma grande interpretação vocal de Alexander. O grupo sabe explorar as suas características culturais próprias, colocando elementos da cultura indígena em faixas como "Selfish Man", que tem passagens que parecem sair de uma cerimônia pele-vermelha.
Fechando o play, "Custer´s Dyin´" narra a saga do general George Armstrong Custer, famoso militar norte-americano que massacrou milhares de índios cheyennes e sioux, mas sobre a ótica dos índios e não dos brancos. A composição soa como um acerto de contas entre os nativos do novo continente e seus algozes, e fecha o trabalho em alto nível, inclusive com a inserção de alguns cantos típicos de tribos indígenas.
Um disco curioso e único, que vale a pena ser conhecido.
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Por Ricardo Seelig
Caramba, Ricardo...só aqui mesmo no seu blog, encontram-se essas pérolas. Uma banda melhor que a outra, eu já tinha ouvido falar da Cactus...mas nunca tinha ouvido nada. Post Genial. Um abraço.
ResponderExcluirPuts Ricardo agora vc quebrou tudo cara, vc colocou só petardo nessa lista,m achei a melhor até agora,falta muitas ainda.
ResponderExcluirmais essa lista é 10000000 comprem sao todos lps perfeitos.
Parabens Ricardo;
Tô me deliciando com as dicas. Fantásticas.
ResponderExcluirEssa sequencia de posts é uma das minhas favoritas. Ainda estou caçando os álbuns das primeiras listas (ja ouvi os da primeira e estou trabalhando na segunda, rs) e acho ótimo encontrar álbuns tão competentes quando se trata de boa música.
ResponderExcluirJá favoritei, vou ouvir as músicas destacadas e depois partir para os albuns.
Abraços e valeu!
Muito bom !!!!
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