Jay-Z: crítica de Magna Carta ... Holy Grail (2013)

Não me importa o que Jay-Z, ou qualquer outro rapper norte-americano, canta em suas letras. Assim como nunca me importou, de modo geral, o que o Led Zeppelin, o Black Sabbath, os Beatles, o Iron Maiden, cantavam em suas músicas. O que me interessa é a melodia, o refrão, os instrumentos, a colagem, o conjunto. Posso estar errado, mas é assim que eu consumo música. E acredito não ser o único.

Escrevi isso para dizer que, ao ler esse review sobre o novo álbum do marido de Beyoncé, você não irá encontrar uma análise literária sobre o discurso de Jay-Z. A intenção não é essa, e eu nem tenho conhecimento para fazer isso. E, além de tudo, existe uma distância cultural e comportamental que certamente influenciaria esse entendimento. O objetivo é analisar musicalmente o trabalho de Z, a construção que ele entrega em Magna Carta. Aí, a coisa já é outra.

Magna Carta ... Holy Grail é o décimo-segundo álbum de Shawn Corey Carter, provavelmente o mais poderoso - e rico - nome do rap. Como tal, chega cercado de expectativas, e com razão, afinal trata-se do primeiro trabalho solo de Jay-Z em quatro anos, desde The Blueprint 3 (2009) - ele lançou em 2011 o recomendado Watch the Throne ao lado de Kanye West. Produzido por Z ao lado de uma trupe que inclui nomes como Pharrell Williams e Timbaland, Magna Carta é um disco pesado e que transcende o rap. Não se trata de um trabalho exclusivamente do gênero, apesar de poder ser enquadrado como tal. Assim como o último disco do amigo Kanye West, é um trabalho de música eletrônica (menos) contemporânea (mais).

Você, fã de rock como eu, dispa-se de preconceitos. Coloque para rodar “Picasso Baby” e dê de cara com uma base de rachar o chão construída sobre baixo e bateria. Emocione-se com “Holy Grail”, música de abertura, com belíssimas linhas vocais de Justin Timberlake intercaladas com os versos de Carter. Relaxe, coloque o disco para rodar e ouça um trabalho bem feito, com diversos momentos interessantes em suas dezesseis faixas. Sons como “Somewhere in America”, “Versus”, “Jay Z Blue” e “Part II (On the Run)”, essa última com a participação de Beyoncé.

Jay-Z gravou um álbum que tem rap, tem pop, tem jazz, tem funk, tem rock. Em suma, Jay-Z gravou um disco que tem música, porque é exatamente isso que ele faz. Tire as teias de aranha do cérebro, você não vive mais nos anos 1980, quando era comum dizer que um rapper, ou um DJ, não faziam música. Sim, eles fazem, e das boas. Exemplos existem aos montes por aí. Beastie Boys, Chemical Brothers, Moby, Daft Punk, Kanye West, Ice Cube ... a lista não tem fim, e Jay-Z está nela.

Não me importa qual é o discurso de Magna Carta ... Holy Grail. Eu só quero boa música, e isso eu encontro aqui.

Nota 8

Faixas:
1 Holy Grail (Feat. Justin Timberlake)
2 Picasso Baby
3 Tom Ford
4 FuckWithMeYouKnowIGotIt (Feat. Rick Ross)
5 Oceans (Feat. Frank Ocean)
6 F.U.T.W.
7 Somewhere in America
8 Crown
9 Heaven
10 Versus
11 Part II (On the Run) (Feat. Beyoncé)
12 Beach is Better
13 BBC
14 Jay Z Blue
15 La Familia
16 Nickels and Dimes

Por Ricardo Seelig

Comentários

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Excelente resenha, Cadão, ainda não ouvi esse disco, mas resolvi comentar porque interajo com a música da mesma forma que vc, me interessa apenas a música, a boa música, seja ela funk, heavy metal, blues, thrash metal, progressivo... enfim..., a parte literária satisfaço lendo livros,
    abraço

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  3. Achei interessante como começou esclarecendo como você faz a crítica, que é não analisando a letra. Bom, particularmente acho fundamental ver como esse item se encaixa com a melodia e mostra como as duas coisas andam. Mas é como disse, você não é i único a consumir música dessa maneira

    No mais, eu tenho dado pouca atenção no gênero do rap. Tanto que a ultima vez que escutei com atenção e gosto foi justamente o The Black Album. Desde esse já tem anos...

    Enfim, acho que é hora de eu dar uma ouvida após ler essa crítica.

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  4. Acho que no rap...provavelmente o discurso seja muito mais importante do que em alguns tipos de rock e metal... (saliento o alguns...pois por exemplo no folk rock do Dylan é importantíssimo) mas também é muito difícil de acompanhar pra quem não é falante nativo do idioma por motivos óbvios...
    No mais...preconceito é sempre bobagem... todos os estilo de música tem seus grandes artistas e álbuns

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  5. Muito bom.

    Holy Grail é sensacional e Tom Ford é daquelas que dá arrepios.

    Discaço.

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  6. Acho louvável quando um rockeiro faz uma resenha sobre um álbum de um estilo a parte do rock. Isso é pra mostrar que música é o que importa, assim como não existe gostar de um álbum só porque ele é rock, como não existe gostar de música e se prender a um estilo só. Bela resenha para um grande álbum de música! E não só Jay-Z, mas Kanye West e principalmente Justin Timberlake, estão fazendo álbuns incrivelmente ricos musicalmente. O último do Justin Timberlake é incrível, vale a pena conferir sim!

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  7. Excelente resenha!!! Adoro o jeito que só a música importa pra você, literalmente! Não como vários 'pseudo-rockeiros' por aí.

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  8. Legal a resenha, ainda mais se tratando uma música distante do rock. Eu tenho em mente que a letra seja um item importante, inclusive, digo isso pela aproximação que eu tive com o RAP nos últimos anos. Agora, concordo que seja possível atentar-se à melodia como fator principal, pois ela, por si mesma, é uma arte completa. Admiro o site e cada torno-me um usuário mais fiel!!! Abraços.

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  9. Ricardo, já era fã de seus artigos e criticas há um bom tempo, mas ao ler o inicio dessa, especificamente, mesmo não gostando de rap ou não tendo o menor interesse em escutar o álbum, me tornei ainda mais admirador de seu trabalho.

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  10. Que resenha fodona cara!
    Parabéns! To ouvindo o album, está show de bola! Parabéns pelas palavras!

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  11. Falou tudo! Vivemos em uma época em que se classificar estilos (na música ou em qualquer outro meio) se torna a cada dia uma tarefa mais impossível e um álbum como esse do Jay-Z é um belo exemplo disso.

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