Além de adorar ouvir música, sempre gostei muito de ler
sobre música. Na minha adolescência, lá nos anos 1980, devorava religiosamente
as poucas publicações mensais sobre música que o Brasil possuía na época:
Somtrês, Bizz e Rock Brigade. Os textos de críticos como Leopoldo Rey, Lu
Gomes, Maurício Kubrusly, Celso Pucci, Ana Maria Bahiana, Sergio Martins, André
Forastieri, André Barcinski, Fernando Souza Filho, Ricardo Franzin e outros,
foram responsáveis não apenas por me guiar no mundo da música, como também
tiveram grande participação na formação do meu caráter.
Nunca me incomodei com uma crítica negativa para um disco de
uma banda que eu gostava muito. Pelo contrário: ao me deparar com uma matéria
assim, procurava entender o ponto de vista do autor sobre o porque de ele ter
chegado a tal conclusão. Sempre usei as críticas, as opiniões dos autores, como
referência para os caminhos que escolhia seguir na música, porém nunca como
verdades absolutas. E sempre respeitei a opinião destas pessoas, sempre tive
uma atitude humilde porque sei que, mesmo passados quase trinta anos e ter
ouvido milhares de discos nesse tempo todo, continuo sabendo e conhecendo muito
menos do que eles. No final das contas, sou apenas um colecionador de discos
que montou um site/blog porque gosta de escrever sobre música. Sempre será assim.
Hoje, minhas referências no jornalismo musical brasileiro
continuam a ser o farol que ilumina a pesquisa infinita por novos sons que guia
a vida de todo colecionador. Sergio Martins é uma sumidade, uma enciclopédia.
Um cavalheiro a serviço da música, sempre atencioso e pronto para me orientar e
dar dicas quando necessárias. Na minha opinião, e dentro do que eu conheço, é
um dos melhores jornalistas culturais do Brasil. Regis Tadeu é outra
referência. Ácido, irônico, dono de uma escrita brilhante e de um conhecimento
musical profundo, além de ser um cara extremamente gente boa. Bento Araújo é
outro cara que me inspira muito, levando a cabo a poeira Zine, uma publicação
que mostra o seu ponto de vista sobre a música e cresceu por seus próprios
méritos.
Há outros nomes, claro. Paulo Cavalcanti, editor da Rolling
Stone, é um deles. Marcelo Costa, do Scream & Yell, é um dos caras que mais
respeito. João Renato Alves, da Van do Halen, é outro que gosto muito. E
Guilherme Gonçalves, Rodrigo Carvalho e Thiago Cardim, meus companheiros aqui
na Collectors, formam um trio que me inspira a nunca ficar parado, tentando
acompanhar a qualidade e a excelência dos seus textos.
Fora da música, dois outros indivíduos merecem menções
festivas. Rob Gordon, autor do blog Championship Vinyl, me deixa maravilhado com os
seus textos. Enorme talento! E Érico Assis, do Omelete e tradutor de inúmeros
livros que estão nas livrarias, me assombra com o seu gigantesco conhecimento sobre quadrinhos e cultura pop.
Conviver com esses diferentes pontos de vista enriquece quem
se dispõe a trazer visões muitas vezes conflitantes para dentro do seu
universo. Não concordo com muito do que esses nomes citados acima escrevem quando
analisam um disco, uma banda, um filme, um livro e a própria vida. Porém, as
suas visões individuais sempre me fazem perceber que há muita coisa para
aprender e incorporar ao meu ponto de vista. Não dá para ficar parado
acreditando que há apenas uma maneira de ver as coisas, principalmente em se
tratando de algo cultural e que possui um grande aspecto subjetivo em sua
análise, como é o caso da música.
É por isso que me entristece, de maneira geral, a forma como
a geração atual reage a uma opinião conflitante com a sua. Uma crítica, um
texto, sobre o seu artista favorito, apresenta apenas uma visão sobre aquele
assunto. Ele mostra o lado do autor, de quem o escreveu, e vem carregado com a
bagagem do escritor, do crítico. Que é, claro, diferente de quem está lendo –
afinal, são duas pessoas distintas. Quando isso acontece, e aconteceu muito
comigo durante toda a minha vida, sempre procurei entender o outro lado, como
escrevi antes. Mas essa postura não é mais percebida nos leitores atuais. Ao
invés de procurar entender o motivo de tal pessoa escrever aquela opinião, o
caminho mais fácil parece ser o dos xingamentos, das ofensas gratuitas, do desmerecimento
da opinião alheia.
O aspecto mais legal em escrever sobre
música é justamente a troca que acontece entre o escritor e o leitor. Ambos se
beneficiam com essa relação. Então, quando isso não ocorre, e em seu lugar
vemos uma avalanche de comentários ofensivos, é bastante broxante. A música é
um campo imenso. Ela não se resume ao universo que cada um ouve. Ela é muito
maior. Eu, por exemplo, tenho pouquíssimo conhecimento sobre música clássica, mas,
mesmo assim, dentro da minha admitida ignorância, fico maravilhado ao ler os
livros do crítico norte-americano Alex Ross, O Resto é Ruído e Escuta Só. Há
todo um mundo novo nas páginas dessas duas obras, apresentado a um leitor leigo
como eu através de um texto apaixonado e repleto de informações. E, como todo
mundo sabe, quem gosta de escrever se delicia, antes de tudo, com um texto bem
escrito, algo que Ross faz com perfeição.
Falta para a geração atual de leitores uma postura menos
monocromática. As coisas não são apenas pretas ou brancas. Não há apenas uma
linha reta a seguir. Há infinitas formas de fazer música, e conservar a
curiosidade ao se deparar com algo novo é fundamental para
que possamos crescer e nos desenvolver como ouvintes. Ouvir as experimentações
de uma banda como o Gentle Giant, por exemplo, abre novas possibilidades imediatas.
E essa quebra de barreiras vai mostrando, devagar e de forma constante, o
quanto a música e os sons sempre podem ser surpreendentes.
Mantenha o seu ouvido sempre destemido. Não tenha medo do
que é novo, do que é diferente. Não crie preconceitos com uma forma de arte tão
magnífica, tão apaixonante, quanto a música. Deixe ela te surpreender todos os
dias. Garanto que, com essa atitude, você viverá, assim como eu, uma aventura
incrível todos os dias.
Por Ricardo Seelig
Em primeiro lugar, honrado fico por ter sido citado entre vários grandes nomes. Em relação à questão das críticas, sem demagogia, prefiro mil vezes ler um texto bem construido com opinião discordante à minha a um arremesso de confetes sem embasamento - o que acontece muito por aí, infelizmente.
ResponderExcluirSobre os que se ofendem com críticas a seus artistas preferidos, infelizmente é o que citei na Van esses dias: algumas bandas têm torcida, ao invés de fãs. E isso é muito ruim, pois gera um sentimento de guerra, como se a pessoa se sentisse obrigada a defender aquilo com unhas e dentes. Esse tipo de postura jamais vai gerar algo bom.
João Renato Alves
Acho que somos contemporâneos, e entendo os textos sobre álbuns e bandas da mesma forma que você, acho inclusive que opiniões que vão de encontro à minha são, pelo menos, instrutivas. Não se pode mais comentar algo que não seja no sentido da bajulação, sob pena de uma saraivada de agressões. Cresci no rock'n roll e aprendi que ele não tem preconceitos, tem opiniões.
ResponderExcluirMuito bacana o texto, fez eu me lembrar do tempo em que era um leitor assíduo da Rock Brigade. Também sempre gostei muito dos textos do Fernando Souza Filho e do Ricardo Franzin. Mas outros projetos me distanciaram da revista, e não sei mais se ainda é publicada, e onde escrevem os citados redatores. Você pode me ajudar, Ricardo, caso saiba onde esses jornalistas trabalham atualmente?
ResponderExcluirMuito obrigado, abraços!
...
ResponderExcluirMuito bom o texto, Ricardo. Acompanho você desde a época de Why Dontcha? e da comunidade da PoeiraZine no Orkut. E poucas vezes concordei com as suas opiniões ou mesmo nem chego tão perto de ter as mesmas preferências, mas é - e sempre foi - muito perceptível isso que você escreveu aqui, ao longo dos anos e com o desenvolvimento do seu texto.
ResponderExcluirAcho que junto com a série "As novas caras do Heavy Metal" esse foi o texto mais intencional na Collectors Room e seu, muito mais que os ditos 'polêmicos', que o povo tanto gosta de lembrar.
Parabéns pelo trabalho e espero logo ter a mesma motivação para começar um blog inspirado como o seu.
Grande Abraço!
Concordo contigo em tudo. Também sou dessa época. Forastieri e Barcinski, principalmente, tiveram uma grande influência na formação da minha personalidade, na minha maneira de compreender o mundo e a música.
ResponderExcluirAcho, sim, que a nova geração passa por uma decadência sem tamanho na forma de relacionar-se com opiniões e de interpretar e compreender a música e a arte. A superficialidade campeia e isso é muito triste.
Helena Novais.
Gostei muito de vc falar do Sérgio Martins.
ResponderExcluirEu sou adolescência 90. E era pobre e não tinha TV a cabo, apesar de acompanhar na casa de amigos.
Zeca Camargo (Showbizz, MTV, Usina do Som) e Pedro Só (Showbizz, Usina do Som) sempre foram coisas boas pra mim, além da Isabela Boscovi (Veja) e o Sergio Martins (Veja).
Quando o Lado B, Gás Total, Fúria Metal acabaram na MTV ... imediatamente a galera correu pra Pensata da Folha (Lúcio Ribeiro) e pro Scream & Yell (Marcelo Costa). Daí, veio muita coisa sempre.
Só que eu sempre fui mais de rádio e net. De TV, era menos. De leitura, pouco ... pq tinha que pagar pelas revistas. Eu era muito quebrado. Mas a rádio em rock na minha cidade sempre foi muito forte e era a melhor e maior referência pra mim.
Eu comprava muita revista em sebo, tipo milhares de meses depois e ia seco nas resenhas pra poder escolher como gastar minha mesada do mês. Também ia nas bancas de jornais maiores e lia as resenhas sem o dono da banca me cobrar que comprasse. Pindaíba total. Como o rol de discos esgotava, eu pegava muita coisa emprestada ... pop das primas, rock dos tios ... coisas com amigos na escola. A minha salvação foi uma locadora de cd's que tinha no meu bairro no qual tu locava 1 cd no fim de semana (mesma lógica de alugar fita VHS) e tu levava o cd pra casa pra gravar a sua K7. Cheguei a ter 300 k7, que foi algo que me expandiu muito pq eu podia arriscar. Eu não ia gastar 15 reais num cd que não conhecesse. Inúmeras vezes eu fui comprar discos nos quais eu já sabia todo o conceito, por causa das revista, mas nunca tinha escutado. Tlz, por isso, eu fique tão deslumbrado hoje com allmusic.com, lastfm, wikipedia, discogs, whosampled, setlist.fm, whocoveredwho, rateyourmusic (que peguei como dica aqui no blog).
Lembro que os primeiros blogs com downloads de cd's o pessoal chamava de "discoblogs", pra indicar que eram blogs que não eram só de textos, mas de downloads. Kkkkkkkk
Rock Brigade, Metalhead, dentre outras, eu sempre comprava em sebos, assim como as revistas de letras traduzidas e de cifras.
É por isso que me entristece, de maneira geral, a forma como a geração atual reage a uma opinião conflitante com a sua. Uma crítica, um texto, sobre o seu artista favorito, apresenta apenas uma visão sobre aquele assunto. = eu chamo isso de efeito favoritos/bookmark. A net tem de tudo, mas se vc não segmentar, não sai do lugar ou fica perdido correndo atrás do vento. A lógica, desde sempre é as comu do orkut e FB do tipo "odeio chocolate ... 10000 membros" e "amo chocolate ... 10000 membros". As pessoas ficaram bipolares e acham que gostar de uma coisa é odiar a outra. E fora que vc é expulso dos lugares se discorda (nas redes sociais .. só se pode curtir,concordar ... nunca discordar). Nisso, eu acho vc muito forte, Ricardo. Fica o elogio. Tem hora que até eu sou hiper agressivo e contundente contigo. E tu segura a onda bem. Tu tem o emocional muito forte e é um cara firme e convicto. Fica aqui meio elogio, reforço.
Fico impressionado que, com youtube e wikipedia, tenha tanta gente ignorante em música hoje, do tipo "curti a fanpage da banda X e vomito tudo o que dizem lá".
Mas todo jovem tem dessas merda. Coisa de menos de 25 anos. Sempre vai ser assim. Na minha época, havia um protocolo de quem andasse de SK8 deveria odiar os do patins. Quem gostasse de rock odiaria a eletrônica. Quem tocasse um instrumento diria que DJ não é música (e é ... como produtor ... não é como apertador de botão em festa). E por aí vai. Passou. Outros protocolos vieram e vão passar também. Jovem é sempre jovem.
Tem disco que até hoje eu escuto e lembro das frases de alguma resenha ou da capa da revista que tinha resenha dele. Quando surgiu a internet também eu peguei e comecei a vender todos os vinis e cd's dos meus pais pra arrecadar grana pra comprar os meus cd's. Andava os sebos da cidade toda também procurando a melhor cotação pros meus discos de criança também (Balão Mágico, Bozo). Tudo era motivo pra eu vender e levantar grana pra comprar cd. Tinham as importadoras de cd's pra pegar títulos não editados no Brasil e eu fiz um amigo numa dessas lojas. Nossa, o cara ganhava muita cortesia de gravadora, daqueles que vinham com selo de "cópia não vendável".
ResponderExcluirTambém tinha a coisa do reembolso postal das revistas. Teve uma do Pantera e outra do Doors que eu pedi reembolso na editora. As revistas ficavam na banca durante a periodicidade delas e depois eram recolhidas. Aí, vc falava o seu endereço e eles mandavam a revista pra agência dos Correios mais próxima da sua casa. Tu ia lá, pagava o preço cheio da revista na tabela e a taxa do reembolso.
http://produto.mercadolivre.com.br/MLB-505781055-rock-brigade-n-129-abril-1997-pantera-revista-_JM
http://produto.mercadolivre.com.br/MLB-506005433-showbizz-n-6-edicao-131-junho-1996-capa-doors-revista-_JM
http://produto.mercadolivre.com.br/MLB-513616401-show-bizz-letras-traduzidas-the-clash-the-cure-doors-_JM
http://produto.mercadolivre.com.br/MLB-509269836-rock-brigade-212-melhores-03-iron-sepultura-exodus-cannibal-_JM
Apesar de ralhar muito com o Whiplash, não posso deixar de creditá-lo pq já acessei muito e ele me abriu oportunidade pra outros blogs.
Também já fui muito do Lágrima Psicodélica e Rockwave
Sempre fui muito de resenhas pra gastar bem o meu dinheiro de mesada. Chegava nas lojas de cd's e escutava lá nos fones todos os discos que eu conseguisse. Quando lançou em 2007 o 1001 discos pra escutar antes de morrer, que era uma compilação de resenhas, eu me interessei muito. Foi nessa época que conheci um portal de sebos virtuais. Se te interessar (aceitam até paypal):
www.estantevirtual.com.br
Sempre tem muita revista, biografia, livros, além daqueles catálogos de cifras e letras que as bandas lançavam com uma capa toda especial e vendia nas lojas de discos.
Gostei da referência ao Gentle Giant, uma banda espetacular e raramente lembrada na Collector's.
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