Corrections House: crítica de Last City Zero (2013)


O Corrections House é um daqueles projetos musicais que desde a sua idealização já vêm carregados com a impressão de que será um evento único, uma exploração momentânea que provavelmente não voltará a render novos frutos, independente de resultados comerciais ou criativos. Mas essa definitivamente não parece ser uma das preocupações de Scott Kelly (Neurosis), Mike IX Williams (Eyehategod), Bruce Lamont (Yakuza) e Sanford Parker (Minsk).


A colaboração que originou o álbum Last City Zero, lançado pela Neurot Recordings, traz oito faixas com a proposta de ser uma viagem tortuosa de desconstrução e reconstrução da música, utilizando-se de poesias brutas para entregar uma atmosfera controversa, quase uma vívida experiência construída apenas com linhas de guitarra, saxofone, efeitos eletrônicos e baterias programadas, em conjunto com os versos tensos de Seward Fairbury (embora não fique claro quem ele realmente seja).


Linhas monótonas e constantes iniciam o tom em “Serve or Survive”, uma hipnótica introdução que lentamente torna-se mais e mais opressora e distorcida, com efeitos saturados ao máximo em um ritmo quase marcial servindo de pano de fundo à interpretação desesperada de Williams, de forma que as mudanças de andamento são levadas de forma natural, mesmo com a artificialidade instrumental ao longo de seus oito minutos.


“Bullets and Graves”, porém, vem em seguida como uma versão reprocessada daquele hardcore que serviu de base para a maioria das bandas de sludge em seus primórdios, enquanto “Party Leg and Three Fingers” retoma a cadência dos loops programados em batidas marciais sob riffs que beiram o doom metal e um saxofone tocado de forma quase esquizofrênica, sem nenhum controle.


Com uma virada completamente inesperada, “Run Through the Night” traz uma atmosfera western das mais melancólicas, assombrando a faixa desde os primeiros acordes acústicos até a entrada da linha de guitarra tipicamente black metal que toma a frente na metade da música. A confusão retoma em “Dirt Poor and Mentally Ill”, praticamente uma continuação de “Party Leg and Three Fingers”, porém com a percussão eletrônica atuando ditatorialmente no seu desenvolvimento, facilmente ofuscando os outros instrumentos.


Arrastadíssima e com aura de trilha sonora de filme de baixo orçamento, “Hallows of the Stream” se baseia em acordes obscuros, com notas soltas do sax que praticamente acompanha a desordem na marcação do tempo pela bateria. A atmosfera criada permanece intacta em “Last City Zero”, e desce para profundezas ainda mais carregadas com um post rock contemplativo conduzido pela guitarra de Kelly, por baixo das letras severas recitadas e cuspidas sem a menor serenidade.


“Drapes Hung By Jesus” é o semi-instrumental que encerra o álbum sem fugir da linha criada pelos momentos mais agressivos nas faixas anteriores, embora seja possível notar sutis toques diferenciados, como alguns trechos que chegam a esbarrar no dubstep em meio ao clima agonizante criado pelas intermináveis passagens que se equilibram entre o drone, sludge e o post metal e vão gradativamente implodindo até o último segundo do trabalho.


A bem da verdade, para quem já ouviu qualquer um dos infinitos projetos nos quais os músicos do Corrections House estiveram envolvidos ao longo dos anos, Last City Zero não é exatamente uma grande novidade, mas sim uma interpretação reciclada, os mesmos estilos musicais vistos de pontos de vista ligeiramente diferentes. E exatamente por isso, este definitivamente não é o melhor ponto de partida para se aprofundar no trabalho destas bandas: a música aqui beira o perturbador, aonde cada detalhe de composição e produção cumpre a prometida desconstrução da própria.


A atmosfera carregada e hipnótica não se prende a qualquer formato, e aliado à brutalidade em cada verso e berro insano, oscila por diversas vertentes ao longo de cada música sem a menor preocupação, ainda que de alguma forma todas incomodem e desafiem à sua maneira, deixando bem claro que este não é um disco a ser ouvido em segundo plano (se é que é possível), mas sim algo a ser absorvido lentamente, enquanto se é mentalmente sugado para a desnorteada e, por vezes, incompreensível linha de raciocínio do grupo.


É uma jornada um tanto quanto complicada, e ao invés de sair “corrigido” após a audição, é muito mais provável que saia mais danificado ainda. E talvez essa seja exatamente a grande ironia em aqui.


Entre na casa. Mas com cuidado.


Nota 8,5


01. Serve Or Survive
02. Bullets And Graves
03. Party Leg And Three Fingers
04. Run Through The Night
05. Dirt Poor And Mentally Ill
06. Hallows Of The Stream
07. Last City Zero
08. Drapes Hung By Jesus


Por Rodrigo Carvalho

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