Nocturnal: crítica de Storming Evil (2014)

O sincretismo entre thrash metal e black metal remonta aos primórdios dos anos 80, com nomes que vão desde Venom e Hellhammer, passando por Bulldozer, até chegar a Sodom, Sabbat e inúmeros outros. É um fenômeno que está longe de ser algo banal e fechado em si mesmo, tendo em vista que os próprios gêneros ainda se desenvolviam individualmente quando, lá atrás, começaram a se fundir. Aos poucos, tal mescla passou a ser algo um pouco mais palpável, delimitando-se não somente por aspectos sonoros, mas também por uma forte estética lírica e visual.

Tendo como base um recorte mais recente, porém, é possível afirmar que existe uma espécie de 'antes e depois' do que se convencionou a chamar de blackned thrash metal. Coube ao Nocturnal, um quarteto de Mainz, na Alemanha, a tarefa de estabelecer as diretrizes desse híbrido músical nos últimos dez anos. Tudo por conta de um álbum que virou ponto de inflexão dentro do cenário underground: Arrival of the Carnivore (2004). Não que o debut da banda tenha sido um sopro de originalidade e inovação. Nada disso. Contudo, foi um marco no sentido de resgatar elementos do black metal que estavam dizimados em uma cena até então tomada pela onda revival do thrash.

Sim, nomes como Desaster, Bestial Mockery, Nocturnal Breed e até mesmo o Toxic Holocaust, que na época ainda dava os primeiros passos, já faziam algo parecido. No entanto, nada tão sólido, consistente e inspirado quanto Arrival of the Carnivore. Em 2014, o disco completa uma década. Nada melhor, portanto, do que celebrar com um novo trabalho. E foi justamente o que o Nocturnal resolveu fazer. Storming Evil, lançado em 28 de fevereiro pela gravadora alemã High Roller Records, é um prato cheio para quem aprecia o som típico da banda: unholy thrash metal, como a própria gosta de definir. A versão nacional ficou a cargo da Kill Again Records. O selo de Ceilândia, no Distrito Federal, soltou uma ótima edição, com booklet farto e caprichado, além de ter acabado de relançar não apenas Arrival of the Carnivore, mas também Violent Revenge (2009), segundo álbum dos alemães e que marcou a estreia da vocalista Tyrannizer.

Gravado, mixado e masterizado em outubro de 2013, no Underworld Studio, Storming Evil mostra um Nocturnal afiado e que sabe exatamente o que quer. O disco transcorre de forma homogênea e bastante eficaz. Uma unidade black/thrash letal e impiedosa. Fundador da banda, Avenger (guitarra) divide com Tyrannizer o processo de composição, sendo que, das dez faixas, quatro são dele e seis são da bela vocalista, que se mostra muito mais solta nesta segunda incursão. Após substituir Metallic Mayhem, cantor original, a garota soube conquistar espaço no quarteto, completado por Vomitor (baixo) e pelo novato Skullsplitter (bateria), que entrou no ano passado.

Apesar de as músicas serem semelhantes e terem conexão entre si, é fácil apontar os destaques, a começar pela trinca inicial. "Storm from the Graves" abre o play com vigor e em grande estilo. O cartão de visitas ideal, sobretudo pela levada insana e com cheiro de enxofre que dá as caras a partir dos 3:15. Em seguida, "Rising Demons", que ganhou um vídeo bacana, eleva ainda mais o nível. Grudenta e dona de um refrão sensacional, mostra a capacidade que o Nocturnal tem de trabalhar bem a conexão entre riffs e linha vocal. "Tyrants of Damnation" tem um ritmo marcial de entrada e depois desemboca na velocidade tradicional do black/thrash teutônico. Além das três, vale ressaltar o peso descomunal de "Taken by Fire", na qual Tyrannizer ensina como uma mulher deve cantar em uma banda de metal extremo. Dá até pena de Arch Enemy e congêneres...

"Perish in Darkness" e "Ripping Knives" apresentam bons momentos, seguindo uma linha direta e calcada nos pilares do thrash metal alemão, principalmente na veia do Destruction. Por falar nesses expoentes, a arte da capa é de autoria de Philip Lawvere, famoso pelo trabalho em clássicos do Kreator, tais como Endless Pain (1985), Pleasure to Kill (1986) e Terrible Certainty (1987) - também desenhou para Celtic Frost, Deathrow, Hirax e até Helloween.

Em comparação a Arrival of the Carnivore, o Nocturnal apresenta hoje uma gravação melhor, bem como tem em Tyrannizer uma vocalista mais efetiva e versátil do que Metallic Mayhem, o antecessor. São dois importantes pontos positivos para Storming Evil. Em contrapartida, os tempos são outros e, possivelmente, o novo trabalho não consiga atingir o grau de relevância atribuído ao álbum de estreia. Todavia, nem precisa, pois trata-se de um disco extremamente bacana, feito por quem entende do riscado e que mantém o quarteto alemão no pelotão de frente do black/thrash. Sempre dedicado e sincero com sua sonoridade subterrânea. Se de cinco em cinco anos o Nocturnal lançar algo assim, está excelente. É o tipo de música que não precisa de novidades para ser boa.

Nota: 8,5



Faixas

1. Storm from the Graves 5:12
2. Rising Demons 5:08
3. Tyrants of Damnation 5:38
4. Preaching Death 2:35
5. Perish in Darkness 4:59
6. Crushing the Bones 4:45
7. Taken by Fire 6:54
8. Ripping Knives 2:27
9. Blessed Death 3:38
10. Ruthless Darkness 3:59

Por Guilherme Gonçalves

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