Edguy: crítica de Space Police - Defenders of the Crown (2014)

Além de vocalista, principal compositor e líder do Edguy, Tobias Sammet também tem sido o seu grande garoto-propaganda. Nos últimos meses, fazendo uso de uma brilhante estratégia de divulgação em redes sociais, o músico foi nos apresentando passo a passo do processo de confecção do décimo disco de estúdio dos caras, Space Police – Defenders of the Crown.

E se você prestasse um tantinho de atenção, entenderia claramente qual a proposta da bolacha. As pistas estavam todas lá, antes mesmo de ouvirmos a primeira canção da dita cuja. Desde o título – a junção dos nomes de duas músicas do álbum e que a banda achava igualmente ideais, ainda que um tanto ópera rock demais, mais David Bowie do que heavy metal – até à capa com um gostinho de ficção científica pulp dos anos 70, estava nítida a intenção do quinteto. Mais uma vez, fãs saudosistas se enganaram com uma falsa promessa de que este seria um retorno do Edguy ao power metal de suas origens. E não consigo entender o motivo.

Senhoras e senhores, já disse isso um monte de vezes e repito: a cada disco, estes respeitáveis senhores estão se distanciando mais e mais da sonoridade germânica do Helloween, outrora enraizada em seu DNA. Este é um Edguy flertando abertamente com o hard rock. E que parece pouco disposto a voltar atrás neste momento. Ainda bem.

Parte da imprensa especializada gringa se apressou em dizer que este era o melhor disco de power metal lançado nos últimos anos. Cuidado, minha gente. Como eu disse à ocasião do lançamento de Age of the Joker, o Edguy é hoje muito mais uma banda de hard 'n heavy do que uma unidade power metálica. E esta é uma ótima notícia, porque eles continuam construindo uma sonoridade única, própria, e estão se divertindo horrores com ela. Space Police – Defenders of the Crown tem doses cavalares de humor inteligente, é carregado de uma irreverência que é evolução natural de Rocket Ride (2006), por exemplo. Só que a sonoridade não deixa de ser, em partes iguais, pesada e melódica. Numa análise do disco como obra, eu refaço a frase da imprensa estrangeira: este é um dos melhores discos de metal lançados nos últimos anos. Acho que fica mais justo. E acrescento: Space Police – Defenders of the Crown é, de longe, o melhor lançamento do Edguy desde Hellfire Club (2004). E isso não é pouco. É um Edguy em seu auge criativo.

Não se deixe enganar pela excelente faixa de abertura, “Sabre & Torch”, que tem na letra uma declaração clara de que estes sujeitos estão dispostos a explorar, a ir até onde nenhum homem (ou músico) jamais esteve. Suas guitarras encorpadas são heavy metal, mais metal britânico até do que o típico power metal alemão. Mas repare na interpretação de Tobias e nos corais que ele incita no momento do pré-refrão. Bingo. Pura farofa. O mesmo acontece em “Defenders of the Crown”, uma elegia ao fato do Edguy ser um "bastião da resistência da coroa metálica" (sarcasmo pouco é bobagem), quando eis que surge mais um acerto brilhante de Tobias na hora de fazer um refrão contagiante e grudento. E em “Space Police”, igualmente acelerada e divertida, a mensagem mais certeira: um certa polícia espacial o tempo todo tentando dizer o que os músicos devem fazer e que regras devem seguir. "You're all about to make a fool of yourself / Goes the space police / Cause you're about to negate their rules / Watch out for the space police". Entenderam o recado?

“Shadow Eaters” pode, talvez, ser aquela faixa que mais se pode dizer que está próxima da herança metálica dos caras - enquanto, pelo outro lado, “Alone in Myself” é exemplar típico de seu flerte com o pop, uma balada que tocaria tranquilamente em qualquer rádio dos anos 80. E embora “The Realms of Baba Yaga” (a respeito de uma bruxa bizarra das lendas do leste europeu) e “Do Me Like a Caveman” (composição do guitarrista Jens Ludwig, o que é coisa rara nos discos da banda, já que 99% do material sai da cabeça de Sammet) sejam boas canções, e “The Eternal Wayfarer” seja um belo épico de 8 minutos com um trabalho brilhante de guitarras duplas de Ludwig e Dirk Sauer, existem dois grandes pontos altos na obra que precisam ser destacados.

O primeiro deles é “Love Tyger”, canção que se tornou o primeiro videoclipe do álbum, e que desde já eu carimbo como uma das melhores músicas do ano. Assim mesmo, sem pensar muito. Concebida como um tributo de Tobias a si mesmo, a faixa é uma espécie de "o que aconteceria se a Sunset Strip fosse na Alemanha?". É farofa da pura, da boa, do tipo que gruda na sua cabeça por dias. Fico, de coração, torcendo para que o Tobias pire de vez e, em dado momento, resolva fazer um disco inteiro assim. A outra pequena obra-prima dentro deste Space Police é a versão deles para “Rock Me Amadeus”, hit do cantor pop austríaco Falco e que fez os fãs estranharem bastante no momento de seu início. Nada a temer. A faixa não ficou apenas mais densa e pesada. Ela ficou totalmente com a cara do Edguy, como se fosse originalmente sua. E com direito até ao cantor do grupo exercendo seu lado mais Mike Patton, no Faith No More, numa passagem meio falada, meio rap, sem os gritinhos aos quais está acostumado. Genial.

Vale lembrar ainda que a versão dupla do álbum traz, no segundo disco, duas pérolas que mereceriam, com méritos, constar na versão original. A primeira delas é “England”, uma declaração de amor à Inglaterra, cantada com o coração rasgado por Tobias - que enumera todas as qualidades que a Terra da Rainha tem em relação a localidades como Paris e Roma. Algumas delas são Bob Catley (cantor do Magnum, seu parceiro no projeto Avantasia), Def Leppard, Mr.Bean. E a mais importante delas, rapazes, é Steve Harris. É isso. Ele é a melhor coisa da Inglaterra. Quem é fã do Maiden, com certeza vai concordar. Simplesmente hilária também é “Aychim in Hysteria”, homenagem às desventuras do engenheiro de som da banda. O grande trunfo não está, no entanto, na letra, mas sim na forma que ela é executada - afinal, como entrega o título, a sonoridade é exatamente igual ao Def Leppard em sua fase Hysteria. Reparem que até os vocais que Tobias faz são construídos para se parecerem com Joe Elliott. Um tributo e tanto.

Space Police – Defenders of the Crown é prova viva e pulsante de que, diferente do que defendem alguns, Tobias não passou a ficar mais preocupado com a ópera metálica Avantasia, deixando o Edguy de lado. Isso aqui é Edguy, puro e dos bons. Com o bom humor e sarcasmo que lhe são peculiares, Tobias disse recentemente em seu Twitter: "Bem, para aqueles que estão querendo ouvir o som do Mandrake, eu lhes digo: comprem o Mandrake". Agora que foi o próprio cara quem disse, creio que não preciso explicar mais nada, correto? :)

Nota 9,5

Tracklist
1.    Sabre & Torch
2.    Space Police
3.    Defenders of the Crown
4.    Love Tyger
5.    The Realms of Baba Yaga
6.    Rock Me Amadeus
7.    Do Me Like a Caveman
8.    Shadow Eaters
9.    Alone in Myself
10.    The Eternal Wayfarer

Por Thiago Cardim

Comentários

  1. Ótimo álbum! E realmente, como fã de Mike Patton do Faith no more, também reparei que "Rock me Amadeus" tem uma pegada meio "epic" do mesmo. Disco bacana de se escutar, bem divertido e empolgante. Recomendo certamente.

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  2. Tobias é o cara!
    Ele não é um vocalista acima da média, mas é um artista incrivelmente inovador e criativo. Pra variar, mandou bem nas composições e mostrou que a música do Edguy é livre.
    As guitarras estão mais escancaradas nesse cd e gostei muito da composição de "Do Me Like a Caveman".
    Tudo na medida certa.

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  3. O Edguy é uma das minhas preferidas, sendo uma das minhas portas de entrada para o heavy metal, quando tinha treze anos e ouvi Tears of a Mandrake pela primeira vez. Amo de coração Mandrake, Theatre of Salvation e Vain Glory Opera, mas essa fase do Edguy, que foi se moldando lá no Hellfire Club (melhor álbum da banda pra mim), seguindo firme com Rocket Ride, Tinnitus Sanctus e Age of The Joker, eu gosto muito mais. E esse novo disco ta aí pra mostrar que esses alemães são sim um dos bastiões do metal na atualidade! Vida longa ao Edguy e a Tobias Sammet.

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  4. Acho que o Edguy foi esperto em pegar esta estrada para o hard rock para moldar o seu som, ao contrário do Helloween que até tentou ir nesse caminho, mas se acovardou...e deu no que deu.

    O disco é o melhor deles na minha opinião. Confirma que o Tobias, além de ser demente, é uma das principais forças criativas do metal atual, além do que o humor sempre terá espaço no heavy metal (outra bandeira que o Helloween deixou escapar).

    É como é bom ouvir um álbum tão divertido e ficar achando as referências nas letras e no som, o que é muito legal.

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  5. A versão do Edguy pra "Rock Me Amadeus" ficou realmente bacana! (quem desconhece, é uma música do cantor austríaco Falco - que tem uma pinta de Mike Patton mesmo - e coverizada por uma porrada de gente).

    Só não supera a feita pelos Simpsons e com "Dr. Zaius" hehehe.

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  6. Aqui a versão original de "Rock Me Amadeus": http://youtu.be/bMuDtfxAIKk

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  7. Uma banda de "metal" fazer cover de Maiden, Metallica, Dio e bandas clássicas é "fácil". Agora, de um louco chamado Falco, tem que ter culhão, rs.
    Ao vivo deve ficar ainda melhor.

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  8. Estou surpreso comigo mesmo por dizer isso, mas é o melhor álbum que ouvi até agora em 2014.

    Abraços,

    Vinícius - Florianópolis/SC

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  9. Tá um espetáculo esse álbum novo do Edguy, dá gosto de ouvir!!

    Só não foi o melhor de 2014 ainda, porque estou digerindo os novos do H.E.A.T., do Epica e do Winger, que são outras três pedradas de 2014.

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  10. Acho que só conseguirei curtir Edguy quando a quantidade de vibratos por minuto do Tobias reduzir a 80%...Em todo caso, sempre darei chance aos caras, pois sempre tentam fugir do lugar comum!

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  11. Fantástico álbum mereceu nota 9,5.A faixa The eternal wayfarer eu simplesmente não consigo parar de ouvir,melhor do álbum na minha opinião.Esse disco e o novo do HEAT são dois grandes discos!

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