No dia 16 de setembro de 1977, às cinco da manhã, Marc Bolan morria num acidente automobilístico em Londres. Estava prestes a completar 31 anos e foi uma imensa perda para o meio musical, dada a influência que exerceu (e continua exercendo) sobre várias tendências do pop contemporâneo. Como profeta-mor do glitter, Bolan tornou-se um caso à parte no universo do rock, com sua voz manhosa e anasalada junto a uma incrível capacidade de conceber canções repletas de calafrios e sensibilidade em carne viva.
A princípio integrado ao movimento mod, Bolan lançou dois compactos solo sem maiores consequências antes de se reunir ao grupo John's Children, nos idos de 1967. No ano seguinte formaria o Tyrannosaurus Rex ao lado do vocalista/multiinstrumentista Steve Peregrine Took. Nesta fase inicial - que se estendeu até o início de 1970 - as composições de Bolan eram verdadeiras viagens, calcadas em devaneios intimistas ao som de flutuantes violões e percussão com tendências orientalistas. Um peculiar som lisérgico, que foi registrado em seus quatro primeiros álbuns.
Com a substituição de Peregrine por Mickey Finn e a redução do nome simplesmente para T. Rex, o grupo debutou com o álbum homônimo lançado em dezembro de 1970, que marcava uma nova guinada na carreira de Bolan. As nuances psicodélicas tornaram-se apenas um tempero a mais numa receita aparentemente simples, mas de uma eficiência a toda prova, que incluía também boogie, rhythm and blues e hard rock.
O LP seguinte, Electric Warrior (1971), fez explodir na Inglaterra o termo glitter rock, estilo pelo qual o T. Rex foi o maior responsável e, por que não, seu mais significativo expoente. O glitter consistiu em fundir o cósmico com um paraíso de cosméticos, na exacerbação da cor (paetês e purpurina em primeiro plano), na construção da imagem em um teatro existencial decorado por afetações, sarcasmos e certa dose de romantismo. Este estilo, também chamado de glam rock, seria consolidado de forma definitiva por Bolan no trabalho seguinte do T. Rex, The Slider.
Lançado originalmente em julho de 1972, o disco foi gravado em Paris e Copenhagen com produção de Tony Visconti (que também vinha trabalhando com David Bowie, a quem foi apresentado pelo próprio Bolan). Acompanhado pela bateria de Bill Legend, o baixo de Steve Currie, os backing vocals afetadíssimos dos ex-Turtles Howard Kaylan e Mark Volmah, além da percussão e vocais de Finn, a voz penetrante e a guitarra psico-espacial de Bolan conduziram aqui algumas das mais marcantes canções de toda a sua carreira. Verdadeiros hinos glitter como a arrepiante "Metal Guru" (com sutis intervenções de cordas arranjadas por Visconti), a faixa-título (uma boogie ballad imersa em tristeza e escapismo) e "Telegram Sam" (posteriormente regravada pelo Bauhaus). Outras músicas memoráveis eram aclimatadas em narcotizantes inflexões de boogie - como "Rock On", "Baby Boomerang" e "Baby Strange", o lado mais dançante do T. Rex - junto às incursões pelo heavy metal de "Buick Mackane" e "Chariot Choogle".
Mais encantos podiam ser encontrados em baladas com atmosferas espaciais como "Mystic Lady", "Spaceball Ricochet" e a pungente "Ballrooms of Mars", na qual eram citados John Lennon, Bob Dylan e Alan Freed (o DJ que lançou Chuck Berry em troca da co-autoria de "Maybellene"), e também nos delicados climas bluesísticos de "Rabbit Fighter" e na lisergia folk de "Main Man".
Um álbum único, que se tornou a grande obra-prima do glitter.
(Texto escrito por Fernando Naporano, Bizz #056, março de 1990)
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