Em 1981, Lobão era apenas um baterista. Fazia parte de um
grupo, Blitz, e ganhava como músico profissional tocando com uma jovem cantora
(Marina) e com a banda Gang 90, que tinha recém despontado para o Brasil num
festival de ... MPB! Lembrando hoje, ele compara: "O rock brasileiro era
uma viagem na maionese".
Lobão compunha sem grandes pretensões, nunca havia pisado
num palco como artista solo e sequer imaginava como sua voz soaria gravada. Não
tinha nem mesmo uma guitarra decente - precisou comprar uma Rickenbacker de Zé
da Gaita para encarar a história.
Foi assim, na aventura, que ele entrou num estúdio
carioca de oito canais para gravar, em sete dias, uma demo. Ação entre amigos:
o parceiro Bernardo Vilhena, semi conhecido no Rio como poeta marginal, Lulu Santos e Ritchie - velhos colegas dos tempos de
Vímana, o guitarrista Ricardo Barreto, o baixista Antonio Pedra e o tecladista
William Forghieri, companheiros nas gigs com Marina, mais a própria Marina.
Inácio Machado, outro camarada, pagou a conta.
Entre os solos e as partes de guitarra de Lulu
("Squizotérica") estão algumas das jóias do pop nacional dos anos 1980.
Lobão levou a coisa a sério: na hora de gravar os vocais de apoio da
música título, expulsou o inglês Jim Capaldi (ex-baterista do Traffic, casado
com uma brasileira e figura fácil no Rio na época) aos gritos de "sai
daqui, xô!". Motivo: o gringo queria entrar de bicão no coro duramente
ensaiado.
Infelizmente, esse clássico só pôde ser ouvido mais de um
ano depois, quando entrou na programação da rádio Fluminense FM. O trabalho na
Blitz estava decolando, mas a banda não queria gravar as músicas de Lobão. O
baterista, que havia sugerido a entrada de cantoras, pensando numa coisa "meio
Frank Zappa", andava decepcionado com "as vocalistas esganiçadas"
e com os "novos rumos iê-iê-iê". Levou a fita de Cena de Cinema e
uma revista Isto É com a foto da Blitz na capa para uma reunião na
RCA e pronto: não precisava gravar mais nada, aquela demo iria valer como
disco.
A criatividade e espontaneidade presentes compensavam a
precariedade técnica. A bateria, inusitadamente deixada para o final, foi
gravada nos últimos 40 minutos do horário de estúdio. Marcelo Sussekind, que
tocou baixo e trabalhou como técnico nas sessões, teve de registrar no esquema
"o que foi, foi". Com verve malandra Zona Sul (gatas, baganas
manchadas de batom), bom humor e jovialidade, o repertório que foi sucesso no
Circo Voador em históricos shows em 1983 ainda é relevante, acima de nostalgias
barrigudas pelo sabor wave dos sintetizadores.
Texto escrito por Pedro Só e publicado na Bizz #180, de
julho de 2000
Gosto muito desse disco,me traz frescor com doses cavalares de vigor kkk
ResponderExcluirPena que as gravadoras nunca mais lançaram os primeiros trabalhos dele em cd, uma falha grave das gravadoras que insiste em acusar o consumidor de consumir produtos piratas, um absurdo.
ResponderExcluirNa verdade lançaram, remasterizado. Acho que era aquela série do Charles Gavin, que recuperou excelentes obras nacionais. Mas hoje é difícil de achar também (não comprei e me arrependi).
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