Quadrinhos: Virgem Depois dos 30, de Atsuhiko Nakamura e Bargain Sakuraichi (2019, Pipoca e Nanquim)
Publicado originalmente em 2016 no Japão pelo site Leed Café, Virgem Depois dos 30 teve como base o livro documentário Virgens de Meia Idade, da Editora Gentosha.
Com o fervor da publicação no oriente, a obra ganhou novos
horizontes, sendo publicada na França, obtendo peso crítico e a atenção de
editoras do mundo todo, para em seguida chegar ao Brasil pelo selo Drago, como
primeiro mangá lançado pela editora Pipoca e Nanquim.
Por ser embasado em um documentário, o nível de detalhes dos
relatos impressiona. No último capítulo do mangá é mostrado como Nakamura foi atrás
dos virgens de meia idade para saber de suas experiências e inexperiências, como
forma de entender o que os faz ser tão peculiares.
O material apresenta oito personagens reais, todos com nomes
fictícios, com idades que variam de 33 a 44 anos. Quase todos são virgens (Quase
todos? -Logo vocês entenderão), cada um com uma forma diferente de se relacionar
com pessoas do sexo oposto.
Por se tratar de um assunto delicado, primeiramente precisamos entender que os personagens desta história, mesmo que reais, são vítimas de um mundo no qual a tecnologia retrai as relações interpessoais, ao invés de favorecê-las. Além disso, há as relações abusivas e autoritárias com pais e responsáveis, e um fator quase que unânime em todos os casos: o bullying.
A estrutura e a ordem de cada personagem foi pensada de
forma minuciosa pelo artista Sakuraichi e Nakamura, tudo para gerar propositalmente
desconfortos no leitor. Para cada capítulo, cada personagem alimenta um
sentimento diferente , indo de asco até pena.
Nakamura apresenta personagens que cultivam pensamentos e atitudes
muito parecidos, homens que culpam as mulheres por serem virgens, outros que
mentem para si mesmos, dizendo que não são virgens, na tentativa de encaixar-se na sociedade. Há quem opte por
relações homossexuais por serem incapazes de sequer conversar com uma mulher,
ou quem transe com profissionais. No que entendemos como sexo estes não seriam
mais virgens, mas, na cultura japonesa, só se perde a virgindade quando o ato
sexual ocorre em um relacionamento fechado e sem pagamentos envolvidos.
Entretanto, há casos de extrema preocupação, visando o âmbito social como um todo.
Homens que divergem da cultura otaku e projetam desejos
sexuais e afetuosos por personagens bidimensionais, pegando repúdio de mulheres
de verdade. São estas pessoas que alimentam o mercado de animes, mangás e
demais produtos com personagens femininas com características e fisionomias de
crianças. Este assunto é tão preocupante que há um pedido da ONU realizado no ano de
2015 para que seja abolido o conteúdo erótico com crianças no Japão.
No Japão, o suicídio tem uma associação de larga data com a
salvação do nome ou da fama do indivíduo ou da sua família. A análise sobre estes
fatos tem tido campos importantes para a compreensão da cultura, sociedade e do
povo japoneses, que desde os tempos dos samurais praticam o ato como forma de
honra ou vingança. Segundo a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), os principais fatores ligados ao suicídio nos dias atuais são
o desemprego, a depressão e as pressões sociais. Esses fatores são relacionados de
forma orgânica e impactante em Virgem Depois dos 30, e vão além do
simples fato de se ter ou não relações sexuais, visto toda a composição
histórica e cultural do seu povo. É preciso entender que estas pessoas,
incluindo os personagens aqui apresentados, podem ser vistas por alguns
como pessoas doentes, com depreciação pelo seu modo de viver, pensar e
agir em sociedade.
A estrutura no qual o mangá é narrado ganha forma conforme o leitor passa os capítulos e absorve cada informação, seja da história ou dos dados documentados de Nakamura. O mangaká responsável por esta obra, Sakuraichi, soube dosar os momentos de drama, comédia e realismo em sua narrativa. Não abusou em nenhum momento das características dos personagens, não houve extravagância em querer demonstrar atos forçados ou manipular os personagens a situações que não existiram. Tudo o que há neste mangá faz parte do documentário de Nakamura, portanto, é real.
O material, lançado recentemente pela Pipoca e Nanquim, encontra-se disponível na Amazon pelo valor de R$ 49,90, contem 244 páginas,
acabamento em capa cartão, papel off white, com sobre capa. Edição muito
bem revisada, diagramada e traduzida pela Drik Sada.
Por Pablo Peixoto
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