Desde o início da fase atual do Iron Maiden, que teve por marco inicial o mês de fevereiro de 1999 com a volta de Bruce Dickinson e Adrian Smith e a demissão de Blaze Bayley, a dinâmica de lançamentos e turnês da banda inglesa seguiu algumas alterações para se adaptar ao mercado musical. A receita com a venda de discos não é mais rentável o suficiente para justificar longos períodos em estúdio para se criar novas músicas. A maior parte dos fãs não tem disposição ou necessidade de pagar por música. As mídias físicas cada vez mais estão limitadas ao nicho dos colecionadores - no caso do Iron Maiden, os fãs conquistados durante as décadas de 1980 e 1990 praticamente.
Portanto, manter a banda anualmente com agenda disponível para turnês se tornou a prioridade em termos econômicos. Com isso, o intervalo entre o lançamento de novos discos foi se distanciando cada vez mais, mas o grupo estava nos palcos praticamente todos os anos.
Para que isso fosse possível, a estratégia ficou clara: intercalar turnês de novos álbuns com shows que focam nos discos clássicos lançados entre 1980 e 1988. Deu muito certo! No caso do Brasil, só pra citar dois exemplos, tivemos a oportunidade de assistir aos shows da World Slavery Tour repaginados na turnê Somewhere Back in Time em 2008 e 2009 e a turnê do álbum Seventh Son of a Seventh Son reeditada na Maiden England Tour, de 2013.
Quando esse DVD Early Days surgiu como a primeira parte da série The History of Iron Maiden, foi imediata a conclusão de que haveria uma continuação com outros episódios, documentários com entrevistas e a reedição dos vídeos de shows lançados oficialmente. E isso, a princípio, aconteceu com os relançamentos em DVD de Live After Death em 2008 e Maiden England em 2013. Estes dois relançamentos originaram, como já dito, turnês bem sucedidas mundo afora, além do filme/documentário Flight 666 e o início da logística de se fazer turnês com um avião alugado e personalizado, batizado de Ed Force One, com Bruce Dickinson pilotando e comandando a visibilidade que o Iron Maiden ganhou nos noticiários comuns com essa iniciativa.
Mas eis que após o fim da tour de divulgação do álbum The Book of Souls (2015), chegaria a vez de contar a história do Iron Maiden nos anos 1990, apresentando o que aconteceu com a banda durante os discos No Prayer For The Dying (1990), Fear of The Dark (1992), The X Factor (1995) e Virtual XI (1998) até os eventos que levaram à reformulação da banda para chegar à formação atual com seis integrantes. Mas isso não aconteceu e tudo leva a crer que não ocorrerá.
Além destes dois episódios nos lançamentos de coletâneas e relançamentos em vinil, a turnê de hits seguinte à Maiden England, que, por lógica, poderia ser focada na década de 1990 e ter o lançamento em DVD da parte quatro da History of Iron Maiden, talvez com a disponibilização dos shows de Donington de 1992 e do Raising Hell de 1993, deu lugar à franquia Legacy of the Beast, novamente focada em cima dos álbuns Piece of Mind (4 músicas), The Number of the Beast (3 músicas) e Powerslave (2 músicas), com outras faixas apanhadas de outros álbuns, inclusive duas das principais canções dos discos com Blaze Bayley, “Sign of the Cross” e “The Clansman”. Tudo conduz à conclusão de que após concluir a Legacy of the Beast Tour, o Iron Maiden irá trabalhar no futuro com um novo álbum e uma turnê correspondente. Os anos 1990 serão deixados pra lá. E, pra piorar, o Iron Maiden não acredita mais na viabilidade comercial do formato DVD e Blu-ray. Disponibilizou as imagens de seu último registro oficial ao vivo The Book of Souls: Live Chapter no YouTube, rompendo com uma tradição iniciada em 2002 com o Rock in Rio.
O questionável concurso de fitas para encontrar o substituto de Bruce Dickinson também precisaria ser mencionado. Dizer como Blaze Bayley foi escolhido é algo que nunca foi feito de forma muito convincente, sejamos francos.
Seria necessário colocar o Blaze Bayley nesse eventual documentário para contar a já conhecida história dele na banda. Ele se recusaria a participar? Claro que não, mas vamos lá ... Na coletânea From Fear to Eternity as músicas “Man on the Edge”, “Sign of the Cross” e “The Clansman” estão ali em versões ao vivo com Bruce Dickinson nos vocais. Apesar de Blaze ter um comportamento e uma ética exemplares como ex-funcionário, sabemos que os chefões do Maiden preferem deixar ele lá no canto dele.
Os eventos da carreira solo de Bruce Dickinson precisariam ser adicionados para fornecer o contexto e as circunstâncias que conduziram à volta do vocalista, com Adrian a tiracolo, à banda. O distanciamento atingiu seu ponto máximo em 1996 com o disco Skunkworks e declarações ácidas dos dois lados. Porém, como Bruce explica em sua biografia, o insucesso do projeto e a falta de rumo para onde seguir tomou novos contornos com uma ligação de Roy Z, que mostrou ideias que resultariam no retorno de Bruce ao heavy metal. Accident of Birth (1997) foi o início do movimento de reaproximação de Bruce Dickinson ao padrão musical do Iron Maiden, ainda mais com a junção de Adrian Smith ao projeto. Essa parceria resultou em shows memoráveis com “2 Minutes to Midnight”, “Flight of Icarus”, “Powerslave” e “Run to the Hills” no setlist e a primeira vinda de Adrian ao Brasil desde 1985. Na sequência, Bruce concebe, ao lado de Roy Z e Smith, o maior álbum de sua carreira solo, The Chemical Wedding (1998), e foi impossível ao fã não confrontar esse material com aquele que o Iron Maiden estava lançando com Blaze Bayley.
Fora tudo isso, a atmosfera em torno de Steve Harris enquanto compunha o álbum The X Factor não era das melhores. Além do período complicado na vida pessoal, a insatisfação com a recepção da imprensa com o disco resultou em inéditas reações polêmicas até por parte de Harris e na música “Virus”, que abre a coletânea Best of the Beast (1996). O disco Virtual XI, por sua vez, não teve resultados comerciais muito bons e foi lançado na sombra dos álbuns excelentes que Bruce Dickinson estava gravando com Adrian Smith e que empolgaram mais a maioria dos fãs.
Esses são apenas alguns dos pontos pelos quais entendo que a história dos anos 1990 do Iron Maiden dificilmente será revisitada em um documentário oficial com a suficiente contextualização. Pelo lado bom, todos os desentendimentos do passado aparentemente foram superados ou deixados de lado. A rotina de trabalho foi adaptada para garantir uma maior longevidade e uma melhor adaptação às demandas do show business. O padrão atual que equilibra turnês clássicas com novos discos demonstra ser o mais viável economicamente, embora resulte em extensos hiatos para quem sempre deseja ouvir material novo.
São apenas reflexões e opiniões pessoais. Ninguém é obrigado a concordar exatamente com o que escrevi aqui, mas espero com esse artigo fornecer pelo menos pontos de reflexão para que aqueles que gostam do Iron Maiden consigam compreender porque os anos 1990 trazem temas sobre os quais poucos querem falar.
Por Dyllan Leandro Christofaro
Concordo com o raciocínio. Até hoje, a saída e volta do Bruce teve mais detalhes "oficiais" somente na biografia do mesmo, o restante sempre foi especulação.
ResponderExcluirA Real Live One e A Real Dead One com qualidade de audio inferior a bootleg, não brinca os albuns são o verdadeiro Maiden ao vivo da época, som cru e muitas faixas rápidas ao vivo. Essa sujeira no som é o que deixa esse lives tão bons pra mim.
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ResponderExcluirConcordo bastante com esse ponto de vista. Até pouco tempo atrás eu me perguntava a respeito disso: "Será que teremos uma revisita da banda a esse período mais "escuro" ? Mas diversas das conclusões citadas nesse texto, era o que havia pensado, desde o fato de que o Iron abandonou o formato de DVD, e também o fato de aquele período não era realmente dos melhores. De qualquer forma, está bem claro que a banda superou tudo isso, felizmente estão aí na ativa até hoje.
ResponderExcluirVale destacar o descaso com o Somewhere In Time tbm... O disco até nomeou a turnê que retrataria ele, mas não foi disponibilizado nenhum material da época e no DVD pouco falam deste clássico...
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