Review: Judas Priest – Rocka Rolla (1974, reedição 2021)


O Judas Priest foi formado em 1969 em Birmingham, mesma cidade que viu o Black Sabbath surgir um ano antes. Inicialmente, a banda contava com o vocalista Al Atkins, o guitarrista John Perry, o baixista Brian Stapenhill e o baterista John Partridge. Perry cometeu suicídio logo após a formação do grupo e foi substituído por K.K. Downing. O nome foi dado por Stapenhill inspirado em uma canção de Bob Dylan, “The Ballad of Frankie Lee and Judas Priest”, que faz parte do álbum John Wesley Harding (1967). A pouca repercussão da demo gravada no final de 1969 pelo quarteto, com as canções “Good Time Woman” e “We’ll Stay Together”, aliada à falência da gravadora que tinha contratado a banda, fez com o grupo chegasse ao fim.

O passo seguinte derivou desse primeiro capítulo. Atkins se juntou ao Freight, banda que tocava hard rock e tinha Downing como guitarrista, seu amigo de infância Ian Hill no baixo e o baterista John Ellis. Chegaram a um consenso e assumiram o nome Judas Priest, que soava melhor aos ouvidos, e fizeram seu primeiro show em 6 de março de 1971. Ellis foi logo substituído por Alan Moore, e em julho de 1971 a banda voltou ao estúdio e gravou uma nova demo, dessa vez com as músicas “Mind Conception” e “Holy is the Man”. Chris Campbell entrou no lugar de Moore e os caras seguiram compondo, com Atkins assumindo o papel principal e escrevendo uma canção chamada “Whiskey Woman”, embrião de um dos maiores clássicos do grupo, a imortal “Victim of Changes”, lançada em 1976. Como a banda não conseguia dar a volta e se tornar viável financeiramente, Al Atkins e Chris Campbell pularam fora entre o final de 1972 e o início de 1973.

Reduzido a K.K. Downing e Ian Hill, o Judas Priest deu um restart e foi atrás de dois integrantes de uma banda local chamada Hiroshima: o vocalista Rob Halford (irmão da namorada de Hill) e o baterista John Hinch. Esse line-up estreou nos palcos em maio de 1973 e fez a sua primeira turnê pela Europa no início de 1974. De volta à Inglaterra, assinaram um contrato com a gravadora Gull, que sugeriu a adição de um segundo guitarrista para deixar o som mais encorpado. Glenn Tipton, da The Flying Hat Band, assumiu o posto, e estava formado o time que gravaria o disco de estreia do Judas Priest.

Rocka Rolla, com sua icônica capa fazendo referência ao logo da Coca-Cola, chegou às lojas em 6 de setembro de 1974. O disco foi produzido por Rodger Bain, que assinou a produção dos três primeiros álbuns do Black Sabbath, e traz um som bem diferente do heavy metal épico que tornou o Judas conhecido em todo o mundo e que surgiria somente no disco seguinte, o clássico Sad Wings of Destiny, lançado no final de março de 1976. Muitas das músicas ainda trazem co-autoria do ex-vocalista Al Atkins, como “Winter”, “Never Satisfied” e a instrumental “Caviar and Meths”, que aparece apenas com a sua introdução mas cuja versão original ultrapassava os quatorze minutos e foi revelada ao mundo somente no álbum Victim of Changes, lançado por Atkins em 1998.


Outro ponto que chama a atenção é o visual dos músicos. Estamos acostumados a ver o Judas Priest carregado de couro e tachinhas, mas na época de Rocka Rolla os caras se pareciam mais com hippies do que com headbangers. Halford com cabelo longo,  além de batas e cores, marcam essa fase. E acabam conversando com a parte musical, já que as canções de Rocka Rolla são orientadas para o blues rock e para o hard, além de leves pitadas prog, bem na linha do que se fazia na primeira metade da década de 1970.

O disco abre com o balanço maroto de “One For the Road”, com andamento cadenciado e totalmente diferente do Judas Priest que o mundo conheceu com o estouro planetário de British Steel (1980). A música que batiza o trabalho é um hard agradável e com apelo radiofônico, e em seguida a banda emenda três composições com clima mais “viajante” e psicodélico, a trinca “Winter”, “Deep Freeze” e “Winter Retreat”. “Cheater” é uma faixa sem grande brilho, enquanto “Never Satisfied”, um hard hipnótico, se transformou em uma das músicas mais celebradas da fase inicial da banda inglesa.

Em seguida temos as duas maiores canções de Rocka Rolla. “Run of the Mill” ultrapassa os oito minutos e é uma balada psicodélica onde Halford já deixa claro os motivos que o levariam a se transformar em uma das maiores vozes do rock nos anos seguintes. Enorme canção, em todos os sentidos. Já “Dying to Meet” é dividida em dois movimentos, o primeiro com um clima contemplativo e meio cansativo até, enquanto na segunda parte a banda solta a mão. O disco se encerra com “Caviar and Meths”, que funciona como uma espécie de epílogo instrumental do trabalho.

A nova edição que a Hellion Records lançou no Brasil vem com uma música bônus, a versão para “Diamonds and Rust”, canção de Joan Baez que o Judas Priest incorporou como sua. Além disso, o CD conta com embalagem slipcase e encarte de dez páginas com fotos da época e um ótimo texto escrito por Andreas Neuderth, jornalista e que também possui uma longa carreira como músico e ocupa atualmente a bateria do Manilla Road e do Trance.

Rocka Rolla é um disco histórico por ser o início da trajetória do Judas Priest. Musicalmente, ainda que não possa ser chamado de irregular, não difere muito das centenas de álbuns lançados nos anos 1970 por bandas obscuras e que ficaram pelo caminho. O Judas teve inteligência e talento para desenvolver uma identidade sonora única, processo que teve início no álbum seguinte, o obrigatório Sad Wings of Destiny (1976).

O mundo perdeu uma esforçada banda de hard rock e ganhou um gigante do heavy metal. Uma troca mais do que justa.


Comentários

  1. Perfeito.
    Longe de ser um disco ruim, é muito agradável de se ouvir e muito divertido.

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  2. muito obrigado grande hellion records por mais este relançamento clássico e com muita qualidade em nosso combalido mercado musical

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