Livro: Nöthin’ But a Good Time – A História Completa e Sem Censura do Hard Rock Anos 80, de Tom Beaujour e Richard Bienstock (2022, Estética Torta)


O hard rock foi uma das trilhas sonoras da década de 1980, e isso se deve às bandas norte-americanas do período, notadamente as vindas da Califórnia. Los Angeles foi o epicentro de uma cena marcante que entregou o som que marcou uma geração de jovens e mudou também a moda, o comportamento e a própria cultura pop.

Nöthin' But a Good Time, livro organizado pela dupla Tom Beaujour e Richard Bienstock, conta tudo isso através de depoimentos dos músicos que viveram e construíram essa cena. Em mais de 600 páginas somos apresentados a centenas de relatos que trazem muita informação sobre bandas, álbuns e canções, mas também a histórias envolvendo sexo e drogas que beiram o surreal.

Exagerada e extravagante, a cena hard oitentista foi um revival da diversão no rock através de uma abordagem musical simples e que bebeu muito nos anos 1970, notadamente em bandas como Led Zeppelin, Aerosmith, Alice Cooper e New York Dolls. O som era visceral, cheio de energia e atitude, ainda que muitas vezes acabasse sufocado pelo excesso de plumas e laquês. O livro traz literalmente milhares de depoimentos de músicos que fizeram parte da cena em todas as suas fases, iniciando no período embrionário, passando pela consolidação, testemunhando o apogeu, assistindo aos primeiros sinais da queda, tendo que viver em uma nova realidade e ressurgindo como fênices temporariamente adormecidos. Ouvimos da boca de lendas como David Lee Roth, Slash, Axl Rose, Dee Snider, Alice Cooper e muitos outros como tudo ocorreu, e também temos os testemunhos de nomes menos celebrados como Brian Forsythe, Greg Leon, Mark Knight e Steven Sweet. Não sabe quem esses caras são? Não se preocupe, pois o livro traz um índice, logo no início, com informações sobre cada um dos músicos, produtores, executivos, fotógrafos, managers e quem mais participou da obra, e que se revela muito útil no decorrer da leitura.

É interessante como Nöthin' But a Good Time deixa claro, de forma inequívoca, o quanto o hard rock oitentista tem cinco bandas como o seu alicerce: Van Halen, Mötley Crüe, Bon Jovi, Guns N’ Roses e Poison. Os depoimentos de músicos de diversas outras bandas atestam o quanto essas cinco moldaram o estilo musical e esteticamente, e não à toa tornaram-se referência quando falamos do gênero. Acho importante mencionar isso porque, aqui no Brasil, com exceção do culto ao Guns, não sinto que o público e a própria imprensa especialidade dão o devido crédito ao impacto fenomenal do Van Halen, à originalidade avassaladora do Mötley Crüe, ao sucesso gigantesco do Bon Jovi e à influência do Poison, todos aspectos que são exemplificados e reverenciados por diversos depoimentos presentes na obra.

Há, como comentei, inúmeras histórias de bastidores que deixam a leitura mais leve em diversos momentos, e um tanto chocante em outros. O consumo industrial de drogas e o sexo infinito transbordam das páginas, assim como doses maciças de rock and roll. E é muito legal perceber o quanto os próprios protagonistas dessas histórias, principalmente as que envolvem sexo, admitem o quanto tratavam as mulheres de forma errada na época e como o comportamento daquele período é inaceitável atualmente. Isso tem nome: evolução. E a evolução não é um mimimi ou uma imposição do politicamente correto, muito pelo contrário: ela é sempre muito bem-vinda porque nos torna melhores e mais completos.

Um capítulo que merece atenção especial é o que fala da queda do gênero no início da década de 1990, período que uma parcela dos fãs e jornalistas sempre atribuíram - e alguns ainda atribuem - ao surgimento da cena grunge de Seattle, percepção essa que é devidamente incinerada. Fica claro que os motivos que levaram o hair metal deixar de ser atraente para o público foram a mega exposição e a estagnação criativa do estilo, e esses aspectos são admitidos e relatados pelos próprios músicos. O papel do grunge nessa história toda só foi ser o próximo movimento musical a ser abraçado pela indústria.

Outro ponto que merece atenção é como o ressurgimento das bandas hard vai ao encontro do nascimento e consolidação do mercado de classic rock, movimento esse que ocorreu a partir do final da década de 1990 e mostrou que veio para ficar nos anos 2000, época em que vimos uma enxurrada de reuniões e retornos de nomes lendários dos mais variados gêneros do rock.

A edição brasileira, publicada pela Estética Torta, segundo vários relatos de quem pegou em mãos a edição norte-americana do livro, é superior em todos os aspectos. Pra começar, são quase cinquenta páginas a mais – 560 contra 608 -, além de uma capa e projeto gráfico exclusivos desenvolvidos por Ale Santos. A edição nacional traz tradução de Marcelo Vieira, um trabalho muito bem feito e que deixa a leitura extremamente fluída. A capa dura valoriza ainda mais não só a arte, mas o excelente conteúdo que o livro entrega aos leitores.

Se você é fã do hard rock oitentista, essa é uma leitura essencial. E se você gosta de música, esse é um livro que não pode faltar em sua biblioteca.


Comentários

  1. livro excelente assim como a análise supra, parabéns, pra quem viveu a época a obra reflete beirando a perfeição todas as características do período, inclusive, não falando apenas dos exageros mas também da qualidade musical, dos músicos e de quanto eram trabalhadores em busca de seus sonhos de sucesso semelhante aos seus ídolos, tratando com respeito e reverencia que a impressa dita descolada e na verdade profundamente preconceituosa e tacanha, leia-se rolling stone e adjacências, nunca tratou

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