A perfeição pop de Confessions on a Dance Floor, de Madonna


Assim como acontece com todos os grandes nomes da música, ao olharmos para a discografia de Madonna temos a tendência a apontar os seus primeiros álbuns como os melhores. Mas um mergulho mais fundo mostra que não é bem assim. Com quatorze discos lançados entre 1983 e 2019, a artista norte-americana possui uma obra que manteve sua qualidade nesses quarenta anos de carreira. E Confessions on a Dance Floor é um dos melhores exemplos disso.

Lançado em 9 de novembro de 2005, é o décimo álbum de Madonna e o sucessor da trilogia Ray of Light (1998), Music (2000) e American Life (2003), álbuns que, cada um a seu modo, revitalizaram a música da Rainha do Pop. Em Confessions on a Dance Floor, como o título e capa antecipam, Madonna entregou um disco voltado para as pistas de dança. Musicalmente, há uma enorme influência da disco music dos anos 1970, do eletropop da década de 1980 e da música eletrônica dos anos 2000, unidas de forma cirúrgica em doze faixas. Trabalhando com o produtor inglês Stuart Price (Pet Shop Boys, Kylie Minogue, New Order), Madonna escreveu letras expondo sua visão sobre o amor e a religião, em contraste com o álbum anterior, American Life, que é um trabalho conceitual com fortes críticas ao modo de vida norte-americano e a obsessão do país pelo consumo, pelo materialismo e pelas armas. Em Confessions on a Dance Floor a atmosfera é mais leve, em uma espécie de tributo a ídolos da artista como o produtor italiano Giorgio Moroder e outros ícones da disco music.

As faixas são estruturadas como um set de um DJ, todas unidas e sem intervalos. Há diversas referências a ícones da música voltada para as pistas de dança. A canção de abertura, “Hung Up”, por exemplo, tem um sample de “Gimme! Gimme! Gimme! (A Man After Midnight)”, lançada em 1979 pelo ABBA. Citações a Donna Summer, Pet Shop Boys, Depeche Mode e Daft Punk também podem ser percebidas ao longo do álbum.

Tudo isso faz de Confessions on a Dance Floor um dos trabalhos mais coesos de Madonna. É difícil escolher os destaques do álbum, ainda que os singles acabem chamando mais a atenção, principalmente em uma análise retrospectiva. Três deles estão em sequência nas primeiras faixas do disco. “Hung Up” é uma das melhores músicas da carreira de Madonna e um dos grandes exemplos da capacidade melódica da artista, em uma composição pop que esbanja bom gosto e refinamento, e que tem Benny Andersson e Björn Ulvaeus, do ABBA, creditados como co-autores. “Get Together” traz influências de Daft Punk e até mesmo de Chemical Brothers – notadamente na cama de teclados -, e é um exemplo didático de como o pop pode soar universal sem ser apelativo. Já “Sorry” mergulha na disco music e é uma das músicas mais fortes do disco.


Na sequência temos “Future Lovers”, parceria com o produtor francês Mirwais Ahmadzaï, que trabalhou com Madonna nos dois álbuns anteriores, Music e American Life. Outra gema pop deliciosa, e que musicalmente é um tributo a Donna Summer. “I Love New York”, apesar de pouco falada, é outra faixa excelente. “Let It Will Be”, introduzida com um quarteto de cordas, é belíssima e elegante sem jamais perder o seu apelo dançante. “Forbidden Love” conversa com o público LGBTQIA+ que sempre esteve ao lado de Madonna, em uma letra que apresenta a força do amor acima de tudo. “Jump”, quarto e último single do álbum, tem um refrão fortíssimo e que mostrou a sua força durante a turnê do álbum, literalmente levantando o público a cada show.

“Isaac”, com mais de seis minutos, é a canção mais longa do álbum e leva a um final com faixas mais densas. Suas melodias são inspiradas na música oriental, assim como a instrumentação, característica que é acentuada pela participação de Yatzhak Sinwani, que canta um poema hebraico na canção. Essa faixa, que é a mais contemplativa do trabalho, recebeu críticas de um grupo de rabinos israelenses, que acusaram Madonna de estar cometendo blasfêmia contra o judaísmo. Andamentos bem marcados conduzem “How High” e “Push”, com uma experiência quase marcial na primeira e uma sensação mais pesada na segunda. “Like It Or Not” fecha o álbum conduzida pela união entre uma instrumentação acústica e batidas dançantes, resultando em uma atmosfera mística que conversa, em certos aspectos, com o que a artista havia feito em Ray of Light.

Confessions on a Dance Floor foi aclamado por crítica e fãs, instantaneamente elevado ao status de um dos melhores álbuns de Madonna. O disco chegou à primeira posição em quarenta países, vendeu aproximadamente 4 milhões de cópias em sua primeira semana e superou a marca de 10 milhões em todo o mundo. Uma prova da longevidade e genialidade de Madonna, uma artista que esteve sob os holofotes desde o início de sua carreira e nunca teve medo de se reinventar.


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