TNT e a construção da sonoridade do “rock gaúcho”


Com a explosão nacional de bandas como Engenheiros do Hawaii, Nenhum de Nós e Garotos da Rua durante a década de 1980, rapidamente todas foram incluídas em uma mesma cena batizada, de forma apressada e sem muita criatividade, simplesmente como “rock gaúcho”. Não haviam muitas similaridades musicais entre os grupos integrantes dessa cena, como as influências prog do Engenheiros, o flerte com a música tradicionalista do Nenhum e o purismo rocker do Garotos deixaram claro álbum após álbum. Porém, apesar das óbvias diferenças, um tipo de som ficou cristalizado no senso comum como sendo o tal do “rock gaúcho”. E muito disso veio do TNT.

Formado em Porto Alegre em 1984, o quarteto contou com Flávio Basso, o futuro Júpiter Maçã, em suas formações iniciais. No entanto, Basso logo deixou o grupo e formou os Cascavelletes ao lado do guitarrista Nei Van Sória. A formação clássica do TNT se estabilizou com Charles Master (vocal e baixo), Márcio Petracco (guitarra), Luis Henrique “Tchê” Gomes (guitarra) e Felipe Jotz (bateria), que gravou o autotintitulado álbum de estreia, lançado em 1987. Esse disco, que conta com uma linda capa com uma pintura de um arranjo de flores, é o epítome do rock gaúcho, o símbolo perfeito da sonoridade associadas às bandas vindas do Rio Grande do Sul.

E como é essa sonoridade, afinal de contas? A música executada pelo TNT bebe direto no rock inglês do final dos anos 1960, influenciada pela primeira fase dos Beatles e Stones. É uma música inocente e direta, com letras que exploram temas comuns à juventude como amores, sexo e situações do cotidiano, tudo amparado por riffs simples e ritmos contagiantes. É rock para dançar e se divertir. O próprio Júpiter Maçã, ao iniciar a sua carreira solo com o clássico A Sétima Efervescência (1996), partiu dessa sonoridade e a turbinou mergulhando sem medo na segunda fase da carreira dos Beatles, emergindo com um som lisérgico e psicodélico mas que nunca perdeu a sua aura de diversão e irreverência. Já bandas como Cachorro Grande beberam enormemente na sonoridade de TNT e a amplificaram, e nunca esconderam essa influência.


O TNT gravou apenas três álbuns no seu período inicial – a já citada estreia de 1987, TNT II (1988) e Noite Vem, Noite Vai (1991) -, apresentando pequenas mudanças de formação no período. O sucesso foi enorme, mas restrito ao RS. Todos estes discos estão fora de catálogo, foram lançados apenas em LP na época e são bastante difíceis de serem encontrados, infelizmente. A única edição em CD da discografia do grupo é a compilação Hot 20, lançada em 1999 e relançada em 2012 pela BMG/RCA. Aliás, essa série também trouxe compilações do Garotos da Rua, Os Replicantes e DeFalla, atendendo a demanda por material dessas bandas, que também possuem pouco material lançado em CD.

O Hot 20 do TNT exemplifica, de forma didática, o tamanho da influência do quarteto na construção da sonoridade do rock gaúcho. É um álbum delicioso, com faixas que toda pessoa que cresceu no Rio Grande do Sul durante os anos 1980 e 1990 sabe cantar sem esforço. “Quem Procura Acha”, música do terceiro álbum e que abre a coletânea, traz uma letra que é uma espécie de carta de intenções da banda. O tracklist é dividido entre faixas dos três primeiros discos do grupo, com destaque para pérolas como “Nunca Mais Voltar”, “Não Sei” (um dos maiores clássicos do rock gaúcho), “Ana Banana”, “Identidade Zero”, “Cachorro Louco” (outro hino do rock RS) e as inocentes e deliciosas “A Irmã do Doctor Robert”, “Oh, Deby” e “Entra Nessa”, presentes no primeiro álbum.

O TNT foi um fenômeno local, mas sua música merece ser descoberta, ou redescoberta, por ouvintes de todo o Brasil.

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