Echoes of the Soul, a notável estreia da Crypta


Não sei explicar o motivo, mas eu tenho um delay no meu consumo de música, e ele se manifesta de uma maneira curiosa: quanto todo mundo está falando de um álbum ou uma banda, eu instintivamente me afasto daquele disco e daquele artista. Traduzindo: eu fujo do hype, mesmo não sabendo por que. Até que, por algum motivo geralmente aleatório, o interesse finalmente me fisga e eu vou ouvir aquilo que todo mundo já ouviu. Isso já aconteceu muitas vezes, e o exemplo mais recente ocorreu com a Crypta.

Com a separação da Nervosa, a banda se dividiu em duas: a própria Nervosa anunciou uma nova formação excelente e lançou o ótimo Perpetual Chaos em 2021 (e acabou implodindo mais uma vez um tempo depois e passando por inúmeras alterações no line-up desde então), enquanto Fernanda Lira e Luana Dametto anunciaram a criação de uma nova banda, batizada como Crypta. As duas, mais as guitarristas Tainá Bergamaschi e Sonia Anubis, gravaram e lançaram Echoes of the Soul, seu álbum de estreia, também em 2021. E, convenhamos, o debut da Crypta é um discaço!

O que ouvimos em Echoes of the Soul é um death metal extremamente cativante e bem tocado, e que impressiona e conquista até mesmo ouvintes como eu, que não não tem o estilo como audição costumeira. Isso, por si só, é um grande elogio, pois trata-se de um trabalho com força suficiente para ir além das fronteiras do gênero, fazendo a banda conquistar novos públicos. Produzido por Thiago Vakka, mixado por Arhur Rizk (Kreator, Power Trip, Soulfly) e masterizado por Jens Bogren (Amorphis, Powerwolf, Sepultura), o disco possui uma sonoridade muito bem definida, com todos os instrumentos soando cristalinos e fortes, o que intensifica a sonoridade do quarteto. Isso, somado ao trabalho de composição muito bem desenvolvido, faz de Echoes of the Soul um álbum merecedor de todos os elogios.

O trabalho de Tainá e Sonia (que deixou a banda em 2022 para se dedicar ao Cobra Spell, onde faz um hard rock oitentista, e foi substituída pela excelente Jéssica di Falchi) nas guitarras explora melodias e harmonias sombrias sustentadas por bases pesadíssimas, e ambas brilham nos solos, que soam sempre muito melodiosos e envolventes. Fernanda varia entre um gutural mais agudo (que se aproxima do black metal, diga-se de passagem) e intervenções certeiras onde canta de forma mais grave, o que produz uma dinâmica muito eficiente. E seu trabalho no baixo é competente, deixando o brilho para as guitarras. Mas o grande trunfo do Crypta é a espetacular baterista Luana Dametto. Se ela já chamava a atenção antes, Luana se solta de vez na Crypta e toca de forma fenomenal, com linhas intrincadas, rápidas e repletas de viradas. É impossível ouvir o álbum e não ficar impressionado com a verdadeira força da natureza que a baterista se releva a cada música.

O disco tem dez faixas, sendo uma delas uma breve introdução. “Starvation” abre o álbum e é a mais rápida do disco, e também uma das melhores do trabalho. “Possessed” entrega harmonias de guitarra e um riff com inspiração mais tradicional, e então se desenvolve em uma quebradeira irresistível. “Death Arcana” é uma composição fortíssima, com muitas variações de dinâmica e que cresce muito ao vivo, enquanto “Shadow Within” traz a dupla de guitarristas soando de forma fascinante. O tracklist inteiro é muito forte, com outros momentos de destaque como a pesadona e mais cadenciada “Under the Black Wings”, a poderosa “Kali”, a grandiosa “Dark Night of the Soul” e o encerramento com “From the Ashes”, maior hit do quarteto.

Com o apoio e o investimento da gravadora austríaca Napalm Records, que assinou com a banda e lançou Echoes of the Soul na Europa e nos Estados Unidos, a Crypta tem se destacado muito e conquistado um público que cresce a cada dia, comprovando a aceitação da sua música e mostrando o quanto o primeiro disco caiu nas graças do público. No Brasil, o álbum foi lançado pela Dynamo Records em CD jewel case, com encarte de dezesseis páginas trazendo todas as letras.

A qualidade desse primeiro álbum da Crypta justifica todos os elogios, pois trata-se de um disco excelente em todos os sentidos. O novo álbum da banda, intitulado Shades of Sorrow, será lançado em agosto, e a julgar pelas músicas já divulgadas, manterá o alto nível apresentado na estreia.

Dessa vez, garanto que o meu “delay pessoal” não se manifestará.



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