Hard Candy, a doce pérola pop de Madonna


O décimo disco de Madonna, Confessions on a Dance Floor (2005), é uma obra-prima e um dos melhores trabalhos da Rainha do Pop. Tudo isso elevou a expectativa a respeito do seu sucessor, que chegou três anos depois. Hard Candy mantém o apelo pop e dançante de seu antecessor, mas explora sonoridades mais contemporâneas, contrastando com a enorme influência de disco music presente no disco de 2005. Tendo nomes consagrados como Justin Timberlake, Timbaland e Pharrell Williams assinando a produção e colaborando na composição das músicas, o álbum é deliciosamente pop e traz elementos de R&B e hip-hop – um exemplo é a participação de Kanye West em “Beat Goes On” -, dando um ar de frescor para as músicas.

Hard Candy intensifica qualidades marcantes e sempre presentes na discografia de Madonna, notadamente duas delas: a capacidade de se renovar e atualizar a sua música para novos tempos e novos públicos ao não ter medo de experimentar com novas sonoridades, e a maneira como faz isso, sem jamais abrir mão do enorme domínio das melodias, elemento sempre presente em suas canções e que elevou muitas delas a hits globais.

A sequência inicial entrega algumas das melhores canções que Madonna gravou no século XXI. “Candy Shop” é sexy e possui uma ponte fortíssima antes do refrão, daquelas que levantam o público de qualquer show. “4 Minutes”, com participação de Justin Timberlake, é um dos singles mais fortes que Madonna já gravou. “Give It 2 Me” é absolutamente contagiante, com uma sonoridade orgânica que faz qualquer ser vivo pulsar infinitamente. “Heartbeat” é uma daquelas pérolas sempre presentes nos álbuns da cantora, e que acabam meio esquecidas com o tempo. “Miles Away” é excelente, com uma levada de violão e melodias vocais certeiras, além de um refrão que fica na cabeça já na primeira audição.


“She’s Not Me” parece saída das sessões de Confessions on a Dance Floor, com a mesma atmosfera disco music do álbum anterior, e seu refrão, curto e direto, é um dos mais fortes do álbum. “Incredible” vem carregada de elementos de R&B, porém é um tanto esquecível. Com participação de Kanye West, “Beat Goes On” é um pop delicioso e maduro, onde as linhas vocais de Madonna e Pharrell Williams se sobrepõe criando harmonias cativantes.

O álbum caminha para a sua parte final com “Dance 2Night”, e entrega na sequência a surpreendente “Spanish Lesson”, onde Madonna revisita mais uma vez a cultura latina sempre presente em sua obra – “La Isla Bonita” é o maior exemplo disso – em mais uma parceria com Pharrell, com trechos cantados ora em inglês, ora em espanhol. A balada “Devil Wouldn’t Recognize You” foge do habitual pelo arranjo muito mais contemporâneo, e é outra das pérolas esquecidas do álbum. “Voices” encerra o disco com o clima pop que marca o trabalho, e deixa um gostinho de quero mais.

A turnê, intitulada Sticky & Sweet Tour, teve o show realizado no estádio do River Plate, em Buenos Aires, lançado em CD, DVD e Blu-ray, com uma performance energética e com momentos de emoção como o resgate de “Don’t Cry For Me Argentina”, da trilha de Evita, que levou o público às lágrimas. Além disso, Madonna empunhou a sua guitarra em uma versão rockeira de “Hung Up”, do álbum anterior, com direito à citação do riff de “A New Level”, do Pantera, na parte final.


Hard Candy
escorregou feio na parte estética, com o encarte trazendo fotos da cantora que parecem jogadas sem muito cuidado sobre uma textura de doces, chamando a atenção de forma negativa. Isso pode ter ocorrido pela indecisão na escolha do título e da conceito visual do trabalho, que chegou até a contar com uma sessão onde Madonna pintou o rosto de preto em uma encarnação moderna da Black Madonna, fazendo referência às estátuas e pinturas da Virgem Maria e do Menino Jesus que trazem ambos representados com pele escura e podem ser encontrados na iconografia da Igreja Católica. Porém, a cantora acabou mudando de ideia na última hora, o que, olhando de maneira retrospectiva, foi uma decisão acertada, já que a ideia poderia ser confundida com as infames “black faces”, onde pessoas brancas pintam o rosto na cor preta com o propósito de representarem pessoas negras.

Hard Candy é um álbum que é deixado um tanto de lado na discografia de Madonna, porém apresenta inegável qualidade e mostra uma artista que, mesmo sem ter que provar nada para ninguém, conseguiu se manter relevante explorando novas sonoridades com a inspiração e criatividade que sempre marcaram sua obra. Trata-se de um trabalho que vale a pena ser redescoberto, e essa experiência proporcionará momentos de diversão autêntica.


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