Quadrinhos: Sombras da Morte, de Richard Corben (2023, Comix Zone)


Acho importante iniciar esse review deixando claro que, apesar de gostar de histórias de terror, o gênero não é uma prioridade quando consumo quadrinhos. E outro ponto é que não sou o maior fã do trabalho do artista norte-americano Richard Corben. Apesar disso, gostei muito muito de Sombras da Morte. Como pode?

Conheci o trabalho de Corben através de Hellblazer, onde ele colaborou com Brian Azzarello em uma das minhas fases favoritas de John Constantine, em que o mago britânico mergulha no interior dos Estados Unidos e descobre o lado sombrio da América. No entanto, seu traço caricato e exagerado não me conquistou. O que muda em Sombras da Morte então? O contexto.

Publicada pela Comix Zone no final de 2023, a HQ reúne histórias de terror curtas escritas e ilustradas por Richard Corben tendo como inspiração principal as histórias que o marcaram quando criança, publicadas pelas editoras EC Comics e Warren durante as décadas de 1950 e 1960. Com 288 páginas, formato 17x25, capa dura e tradução de Dandara Palankof, Sombras da Morte impressiona pela qualidade editorial irretocável, característica sempre presente nos títulos da Comix Zone.


Corben trabalha seguindo a fórmula de títulos como Contas da Cripta e da brasileira Spektro, com um personagem que introduz todas as histórias. São tramas curtas, variando geralmente entre quatro e oito páginas, onde os vilões invariavelmente se dão mal. Os roteiros não são os mais originais do mundo, e isso fica evidente através da repetição de alguns plots, como o dos parentes com problemas financeiros que querem afanar idosos abonados, mas isso não chega a incomodar. O fato é que Sombras da Morte agrada por todo o contexto que apresenta: contos de terror que variam entre tramas distantes da realidade e outras assustadoramente próximas de fatos reais, todos escritos de forma direta e sem enrolação. A arte de Corben aqui funciona de forma perfeita, com seu traço caricato, muitas vezes exagerado e até mesmo deformado sendo essencial para a construção de personagens que possuem a estranheza e aspectos sombrios como elementos em comum. O fato de toda a HQ ser em preto, branco e tons de cinza é essencial para valorizar a arte singular de Corben, que fica muito melhor dessa forma do que em páginas multicoloridas.

Sombras da Morte fecha com uma história chamada Denaeus, que contrasta com todas as demais. Pra começar, é uma trama de quase oitenta páginas sobre um mito grego, e que, ainda que apresente a violência como tema em comum, não conversa com as demais presente no quadrinho. E isso não quer dizer que seja ruim, muito pelo contrário, já que é a história mais bem desenvolvida e aprofundada de toda a HQ. Sua inclusão como fechamento da obra funciona bem, pois se fosse incluída entre as tramas curtas ficaria totalmente deslocada das demais.

Me surpreendi muito com Sombras da Morte, que me proporcionou uma leitura divertida e assustadora e, mais do que isso, fez com que eu finalmente entendesse a força da arte de Richard Corben. A edição é linda, um livro realmente muito bonito, bem impresso e impecável, à altura do legado de um dos artistas mais cultuados dos quadrinhos.

Leia sem medo – ou com, dependendo do horário em que você se debruçar sobre essas páginas assustadoras.


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