Review: Metallica – Master of Puppets (1986)


Terceiro álbum do Metallica, Master of Puppets encerrou de forma trágica a fase inicial da maior banda de metal do planeta. Foi durante a turnê do disco, em um acidente com o tour bus do grupo no dia 26 de setembro de 1986 após um show realizado em Estocolmo, capital sueca, que o baixista Cliff Burton faleceu.

Master of Puppets chegou às lojas pouco mais de seis meses antes, em 3 de março de 1986. O disco foi gravado em Copenhague, país natal do baterista Lars Urich, com o produtor Flemming Rasmussen, que havia trabalhado com a banda em Ride the Lightning (1984). Kill 'Em All (1983), estreia do quarteto, lançou as bases de um novo gênero, o thrash metal, e os dois álbuns seguintes desenvolveram e aprimoraram o thrash à perfeição. Repleto de agressividade, mudanças bruscas de andamento e letras abordando temas reais e distantes da fantasia habitual do heavy metal, o thrash revolucionou a cena underground americana e inspirou um dos movimentos mais populares das décadas de 1980 e 1990. E o Metallica se transformou na principal referência do estilo com seus três primeiros álbuns.

Desde o início, a banda de James Hetfield e Lars Ulrich se mostrou aventureira e nada acomodada, experimentando sem medo caminhos musicais que não eram necessariamente alinhados com a abordagem mais tradicional do metal, como bem mostrou a espetacular balada “Fade to Black” em Ride the Lightning. A sonoridade do Metallica foi evoluindo rapidamente para algo cada vez mais sofisticado, e isso foi percebido pelos críticos e fãs. Havia também o desejo de James e Lars em se afastarem definitivamente da sombra de Dave Mustaine, antigo guitarrista e um dos principais compositores do grupo, que mesmo tendo sido expulso do Metallica antes da gravação do disco de estreia, seguia tendo composições suas gravadas pela banda. Em Master of Puppets, o Metallica se desligou completamente das ideias de Mustaine, e o álbum foi o único dos três primeiros trabalhos a não trazer nenhuma composição do líder do então nascente Megadeth.

O Metallica abordou Geddy Lee, vocalista e baixista do Rush, para produzir o álbum, mas a parceria acabou não rolando devido às agendas não alinhadas das duas bandas. A escolha então recaiu sobre Rasmussen, que havia feito um excelente trabalho no disco anterior. Quase todas as músicas foram compostas antes da banda entrar em estúdio, com exceção de “The Thing That Should Not Be” e “Orion”, que foram concluídas durante o processo de gravação.

Master of Puppets é um álbum ainda mais complexo que Ride the Lightning. Os dois discos dividem uma estrutura semelhante nas músicas, como que se um espelhasse o outro, percepção acentuada pelas belas introduções acústicas que abrem os dois. Extremamente dinâmico e com arranjos densos, Master of Puppets apresenta uma sonoridade pesada, poderosa e épica, com riffs antológicos e solos repletos de melodia, além de um trabalho percussivo exemplar de Lars Ulrich e o baixo sempre virtuoso e surpreendente de Cliff Burton. Em termos líricos, o álbum aborda temas como violência em “Battery” e “Damage Inc.”, dependência química na música título, loucura em “Welcome Home (Sanitarium)”, críticas contra a guerra em “Disposable Heroes” e televangelismo em “Leper Messiah”, além da inspiração na obra de H.P. Lovecraft presente em “The Thing That Sould Not Be”


A arte da capa, concebida pela banda, desenhada por Peter Mensch e pintada por Don Brautigam, retrata um cemitério com cruzes brancas amarradas a cordas, manipuladas por um par de mãos em um céu vermelho-sangue. A arte original foi vendida em 2008 durante um leilão no Rockefeller Plaza, em Nova York, por 28 mil dólares. E, infelizmente, acabou se tornando profética, com o “mestre dos fantoches” mencionado no título mexendo os seus pauzinhos e alterando a história da banda com a morte precoce de Burton. A turnê foi cancelada após o trágico acidente, com o grupo retornando aos palcos somente quase um ano depois, já com o novo baixista Jason Newsted, no festival Monsters of Rock, em Donington, que aconteceu no dia 22 de agosto de 1987.

Master of Puppets alcançou a posição 29 na Billboard 200 e recebeu ampla aclamação da crítica. O disco é amplamente considerado um dos melhores e mais influentes álbuns de metal de todos os tempos, vital para a consolidação da cena thrash metal nos Estados Unidos. Seu impacto foi tão grande que, em 2015, se tornou o primeiro álbum de metal escolhido pela Biblioteca do Congresso dos EUA para preservação no Registro Nacional de Gravações, por ser considerado “cultural, histórica e esteticamente significativo”.

O disco se tornou o primeiro álbum de thrash metal a ser certificado como platina no mercado norte-americano, atestando como o estilo havia chegado ao mainstream e redefinido o conceito de metal para o público. Master of Puppets é amplamente reconhecido como o álbum mais bem-sucedido do gênero e abriu caminho para o desenvolvimento subsequente do estilo, tanto pelas bandas norte-americanas contemporâneas como Slayer, Megadeth, Anthrax, Overkill e Testament, quanto por grupos vindos dos mais diversos pontos do planeta como Kreator, Sepultura e outros.

O disco vendeu aproximadamente 8 milhões de cópias somente nos Estados Unidos, e superou a marca de 14 milhões no mundo inteiro, atestando a popularidade do Metallica, que nos anos seguintes alcançaria níveis estratosféricos com o sucesso planetário do Black Album (1991).

Master of Puppets possui uma força imensurável e que nunca se esgota. A recente inclusão da música título na trilha sonora da série Stranger Things mostrou isso, apresentando a banda para uma nova geração e renovando o seu público. O disco mudou a história do metal de forma definitiva, apresentando uma nova forma de fazer música pesada e influenciando profundamente o gênero através de canções que se tornaram hinos como “Battery”, “Welcome Home (Sanitarium)”, a fenomenal instrumental “Orion” e a imortal “Master of Puppets”.

O metal não seria o que é hoje se não existisse Master of Puppets, e isso diz muito sobre toda a força, impacto, magia e tragédia que envolvem o terceiro álbum do Metallica.


Comentários

  1. A força e a vitalidade que esse álbum possui é algo visceral! Não haverá ninguém nesse mundo que faça algo igual ou parecido, tudo isso graças ao baixo de Cliff e a guitarra de Kirk.

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Você pode, e deve, manifestar a sua opinião nos comentários. O debate com os leitores, a troca de ideias entre quem escreve e lê, é que torna o nosso trabalho gratificante e recompensador. Porém, assim como respeitamos opiniões diferentes, é vital que você respeite os pensamentos diferentes dos seus.