Paracuellos, de Carlos Giménez (2024, Comix Zone)


Paracuellos
é uma história triste, trágica e comovente. Contada pelo quadrinista espanhol Carlos Giménez, conta a sua experiência nos abrigos sociais do país nas décadas de 1940 e 1950, durante a ditadura franquista. Esses locais eram para onde eram levados os meninos cujos pais não tinham condições financeiras para criá-los, e que, na esperança de oferecerem uma educação melhor, confiavam essa tarefa ao estado. Só que a história não era exatamente o que parecia ser.

Na prática, os abrigos sociais eram instituições onde os jovens garotos passavam por uma grande doutrinação política adornada por doses generosas de religião, tudo isso enquanto sofriam na mão de professores, educadores e profissionais que, em sua maioria, pouco se importavam com o destino dos internos.

Gimézez foi um desses internos, e eternizou a sua experiência em Paracuellos. No total, a série teve um total de oito edições, e, após anos inédita no Brasil, foi lançada pela Comix Zone. O primeiro volume reúne os quatro primeiros números e saiu por aqui em julho de 2020, foi um sucesso entre leitores e crítica e, após passar um tempo esgotado, foi reimpresso pela editora no início de 2024. Os quatro números seguintes foram publicados em Paracuellos 2, e Carlos Giménez contou também a história de sua adolescência em Barrio, ambos igualmente publicados pela CZ.



O que lemos são histórias curtas que mostram o dia a dia do abrigo social. Um local repleto de meninos vindos das mais variadas regiões da Espanha, e que passavam a viver, ainda pequenos, em um ambiente não apenas estranho e cheio de desconhecidos, mas sobretudo em um local onde sofriam maus tratos, abusos físicos e mentais, eram mal alimentados, recebiam assistência médica deficitária e ficavam à mercê dos professores e educadores, católicos fervorosos e dispostos a usar a força para “educá-los” à base de surras e espancamentos frequentes. Em suma, um ambiente violento e que acabava gerando conflitos entre os próprios meninos.

Os relatos contados por Giménez são chocantes, e muitas vezes tornam a leitura desconfortável. Ao mesmo tempo, algumas situações acabam se revelando cômicas, o que gera um certo alívio durante a leitura. A arte transmite vivacidade e é toda em preto e branco, com uma atenção especial às expressões faciais, enquanto os textos abordam temas como abandono familiar, autoafirmação, descobertas, fome, dor e sofrimento, elementos que acabam criando um ambiente de união entre os internos, que se protegem uns aos outros dos absurdos cometidos pelos adultos e também por alguns garotos que, na tentativa de passarem imunes ao terror do abrigo, agem como instrumentos da direção da instituição contra seus próprios amigos.

A edição da Comix Zone teve tradução de Jana Bianchi e traz um excelente prefácio escrito pelo pesquisador de quadrinhos Pedro Bouça. O livro vem em capa dura, tem 208 páginas em papel offset e formato europeu 29,2x21,6 centímetros.

Uma leitura necessária e mais atual do que nunca em tempos onde a violência e os atos de ditaduras de décadas passadas, como a que ocorreu na Espanha e também a que vivemos aqui no Brasil, parecem terem sido esquecidos por uma parcela cada vez maior de pessoas.


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