Quadrinhos: O Último Homem, de Jérôme Félix e Paul Gastine (2024, QS Comics)


O Último Homem
é uma história de faroeste nada convencional. Escrita por Jérôme Félix e ilustrada por Paul Gastine, foi publicada na França em 2019 e agora chega ao Brasil pela QS Comics em uma edição de capa dura no formato 21,29,5 cm, com 80 páginas impressas em papel offset colorido e tradução de Alessandra Bonrruquer.

O quadrinho de Félix e Gastine chama a atenção, primeiramente, por abordar um período que muitas vezes passa batido nas histórias de faroeste, que é o fim da era dos caubóis. Ambientada nos anos finais do Velho Oeste, mostra os Estados Unidos passando por uma grande transformação estrutural, com o país sendo coberto por rodovias de norte a sul e leste a oeste. Essa modernização conduziu os EUA a um período de progresso acelerado que, simultaneamente, foi aos poucos extinguindo antigos hábitos e profissões. O clássico caubói montado em seu cavalo enquanto liderava sua equipe atravessando o país com centenas e milhares de cabeças de gado foi substituído pelo transporte muito mais seguro e rápido dos vagões de trens, onde o gado passou a ser levado até o seu destino.

O roteiro é chocante. Em um primeiro momento, parece apresentar uma trama até certo ponto previsível, com um veterano vaqueiro decidindo se aposentar e migrando para uma nova função ao mesmo tempo em que adota o filho de um velho amigo. No entanto, a cada virada de página as coisas vão se revelando mais complexas. Os personagens são todos multifacetados, ao mesmo tempo bons e maus, com objetivos contrastantes e todos lutando pelo que acreditam ser o certo. O protagonismo muda de curso, fazendo com que quem conduzia a história até certo momento deixe de ser o ator principal do roteiro, passando esse papel para alguém que parecia estar ali apenas como figurante. E tudo isso é feito de uma maneira extremamente crua por Félix, que não economiza na violência, nos momentos chocantes e nas passagens trágicas. A sensação ao final da leitura é de espanto e surpresa tanto pelos caminhos que a história tomou quanto pelas emoções intensas que ela nos faz sentir.

A arte de Gastine é espetacular. As páginas são cinematográficas, com ilustrações lindas, caracterizações detalhadas e personagens ricos em expressões. A narrativa é muito fluída, o que facilita a leitura. A colorização, predominantemente em cores marcantes porém com tons mais brandos, é um dos pontos altos. A diagramação também chama a atenção, com telas widescreen dividindo espaço com quadros verticais, o que transmite uma sensação de muito dinamismo.

A edição da QS Comics está excelente como sempre, sem qualquer deslize editorial ou gráfico, e inclui no final uma galeria de artes em tela cheia, estudos de capas e de personagens. Além disso, a HQ vem com lindas guardas internas com ilustrações que acentuam a imersão.

O Último Homem é mais um excelente quadrinho publicado pela QS Comics, que vem construindo um catálogo de títulos irretocável. Uma leitura indicada não apenas para fãs de faroeste, mas também para quem gosta de histórias que mostram o quanto o ser humano é, ele mesmo, o condutor de suas próprias tragédias.


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