Os Filhos de El Topo é uma das maiores críticas do escritor chileno
A HQ é, na verdade, uma sequência de El Topo, filme de 1970 escrito, dirigido e estrelado por Jodorowsky,
O quadrinho conta a história dos dois filhos do personagem principal. Caim, abandonado pelo pai, foi marcado por seu progenitor, que lhe aplicou uma maldição proibindo as pessoas de olharem e falarem com ele, o que faz com que todos virem as costas e fiquem em silêncio sempre que Caim está em um local. Já Abel foi criado pela mãe e é doce, inocente e puro, mas, ao perdê-la, pede ajuda ao irmão para enterrá-la junto ao pai, no santuário onde ele descansa. Os dois começam então uma jornada repleta de violência e personagens peculiares, como uma voluptuosa e bela mulher chamada Lilith e o capitão de um exército de querubins que possui hábitos alimentares bastante incomuns. Para quem conhece a história bíblica, não é difícil descobrir o destino final de Caim e Abel.
O roteiro, como sempre, é muito bem escrito, e promove transformações substanciais nos personagens ao mesmo tempo em que não economiza em momentos de violência, choque, nudez e outros elementos costumeiramente presentes nas obras de Jodorowsky.
A arte de José Ladrönn é um capítulo à parte, começando pelo fato de a maioria das páginas da HQ serem divididas em três quadros widescreen, acentuando ainda mais a narrativa épica e, literalmente, cinematográfica. O traço é primoroso, com os personagens carregando expressões autênticas e detalhadas, enquanto os cenários e paisagens são belos e carregados de autenticidade. As cores, também assinadas por Ladrönn, são vivas e trabalham a favor da narrativa, com o artista conseguindo traduzir o roteiro de Jodorowsky em ilustrações que nos fazem crer na história e mergulhar em uma experiência rica e transformadora, que leva a um questionamento sobre o papel da religião e nossas próprias crenças.
Os Filhos de El Topo proporciona uma leitura fantástica e se coloca entre as principais trabalhos do artista chileno. Trata-se não apenas de um dos melhores quadrinhos publicados no Brasil em 2024, mas, sem dúvida alguma, em uma das mais excepcionais HQs que chegaram ao mercado brasileiro no século XXI. E, acima de tudo, comprova o quão único é Alejandro Jodorowsky, que do alto dos seus mais de 90 anos se mostrou capaz de produzir uma obra tão confrontadora, densa e crítica como esta.
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