Triptykon - Eparistera Daimones (2010)


Por Ricardo Seelig
Colecionador
Collector´s Room

Cotação: *****

Em 2006, um dos grupos mais influentes da história do heavy metal extremo parecia ter um futuro promissor pela frente. Após mais de uma década de hibernação, o Celtic Frost havia voltado à ativa com um álbum excelente - Monotheist, muito bem aceito pelos fãs e pela crítica -, e tudo indicava que o grupo suíço iria engatar uma sequência de ótimos discos.

Mas não foi o que aconteceu. Divergências pessoais e diferenças musicais fizeram com que seu principal integrante, o vocalista e guitarrista Tom Warrior, saísse da banda em maio de 2008, deixando para trás, segundo informações do próprio músico, material já composto para aquele que seria o sucessor de Monotheist.

Um dos artistas mais criativos, talentosos e influentes do heavy metal, Tom Warrior não poderia ficar parado por muito tempo – e, para nossa sorte, não ficou. Logo após o anúncio de sua saída do Celtic Frost Warrior montou uma nova banda, batizada de Triptykon, ao lado do guitarrista V. Santura, da baixista Vanja Slajh e do baterista Norman Lonhard.


A banda começou a gravar a sua estreia, batizada como
Eparistera Daimones (“demônios à esquerda”, em grego), em agosto de 2009. As sessões se estenderam até o final de novembro. Com o disco pronto, a banda assinou com a Century Media, que lançou o álbum no dia 22 de março de 2010.

Eparistera Daimones é um disco muito mais sombrio, pesado e agressivo que Monotheist. O simples ato de apertar o play no CD player deixa tudo ao seu redor mais denso, escuro e sinistro.

É difícil classificar o álbum em um gênero específico. É black metal, mas não é só isso. Há também elementos de doom, gótico e thrash em suas nove faixas. O uso de andamentos mais arrastados, casados com perfeição com guitarras afinadas em tons mais baixos, fazem com que o peso seja uma das principais características de
Eparistera Daimones. Gigantescas doses vindas diretamente da mãe de todas as bandas de heavy metal, o Black Sabbath, carregam as guitarras com riffs arrastados e pesadíssimos. Os arranjos levam as faixas por caminhos inusitados e sempre criativos.


O nível das composições de Tom Warrior é altíssimo, e mostram que o músico suíço, apesar de ter uma carreira que já dura mais de vinte e cinco anos e conta com passagens por nomes seminais do som pesado como Hellhammer e Celtic Frost, tem muitas cartas na manga ainda. “Goetia” é uma odisséia de onze minutos de duração que abre o disco de maneira espetacular. Quem sente calafrios só de olhar para a duração de faixas mais longas, julgando-as automaticamente como chatas e repetitivas, deveria ouvir esse som todos os dias.

“Abyss Within My Soul” é construída a partir de um riff totalmente doom, e conta com uma grande interpretação vocal de Tom Warrior. “In Shrouds Decayed” conta com uma introdução bem climática de guitarra, temperada com a voz de Warrior carregada de efeitos que a deixam ainda mais sombria. “A Thousand Lies” é a mais rápida do disco, com riffs bem thrash.

“Descendant” é um dos melhores momentos do álbum, com riffs pesadíssimos e rastejantes bem na escola de Tony Iommi. “Myopic Empire” é outra ótima faixa. Nela, os vocais lembram claramente, nas passagens mais lentas, o Alice in Chains. “Myopic Empire” conta também com uma soberba passagem de piano combinada a um vocal feminino arrepiante, e que dá um acento gótico bastante interessante à composição. A influência gótica é elevada ao máximo em “My Pain”, uma belíssima composição com vocais femininos que destoam completamente do restante do disco.

O álbum fecha com “The Prolonging”, uma perturbadora jornada de quase vinte minutos que transita com absoluta competência e naturalidade pelo black, doom, thrash e metal clássico. Um encerramento espetacular para um álbum excelente.


Vale mencionar também a arte da capa do álbum. Warrior mantém uma longa relação com o lendário artista plástico suíço H.R. Giger. Uma das obras de Giger ilustra a capa do clássico
To Mega Therion, lançado pelo Celtic Frost em 1985. Além disso, Giger é reconhecido mundialmente pelo seu trabalho, tendo recebido inclusive um Oscar pela concepção visual do filme Alien: O Oitavo Passageiro. A obra que ilustra a capa de Eparistera Daimones é um trabalho de Giger intitulado Vlad Tepes. Já a arte do encarte ficou a cargo do norte-americano Vincent Castiglia, que pintou retratos dos integrantes da banda como se os tivesse produzido com sangue, alcançando um resultado final ao mesmo tempo belo e aterrorizante.

A julgar pelo que se ouve em
Eparistera Daimones, o Celtic Frost perdeu demais com a saída de Tom Warrior. Se, como ele já disse em inúmeras entrevistas, as músicas que compõe o disco de estreia de seu novo grupo estariam, a princípio, no sucessor de Monotheist, o Celtic Frost deixou de gravar mais um clássico em sua discografia. Em compensação, Thomas Gabriel Fischer mostra porque é considerado, com imensa justiça, um dos músicos mais influentes da história do heavy metal. Eparistera Daimones é um ótimo disco, que já nasce com cara de obra fundamental.

Extremamente recomendável!


Faixas:
1 Goetia 11:00
2 Abyss Within My Soul 9:26
3 In Shrouds Decayed 6:55
4 Shrine 1:43
5 A Thousand Lies 5:28
6 Descendant 7:41
7 Myopic Empire 5:47
8 My Pain 5:19
9 The Prolonging 19:22


Comentários

  1. Não poso evitar de cair no clichê de dizer que sou suspeito para falar da carreira de Thomas Gabriel Fischer, pois isso é um fato que nunca escondi. Assim como não posso evitar de afirmar que esse é um disco que já nasce clássico, marcante na carreira de um músico que quase sempre esteve à frente do seu tempo, não apenas musicalmente. Algo que merece receber especial atenção é a evolução vocal de Tom. Abismos separam seu trabalho em discos como "Morbid Tales", "Cold Lake" e esse "Eparistera Daimones". Aliás, até de "Cold Lake" eu gosto, um disco que cairia muito bem na classificação de disco injustiçado, pois este acabou sendo muito mais julgado pelo visual adotado pela banda e pela comparação com álbuns anteriores do que por sua qualidade.

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  2. Muito bom o primeiro trabalho do Triptykon, que na minha visão está para o Celtic Frost como este está para o Hellhammer, é a continuação da obra desse ícone do Metal.

    Quanto ao Cold Lake, respeitando a opinião do Diogo, é um trabalho que não dá pra engolir nem olhando isoladamente como álbum de hard rock, tamanha a falta de intimidade com o assunto por parte do Tom. Álbum que eu considero horrível, uma performance vocal que que sempre achei meio caricatural, e um resto de banda que, se por um lado consegue emular o cacoete hard rock farofa, por outro não faz idéia do que está fazendo quando toca Metal. Rola no Youtube uma versão ao vivo de Jewel Throne dessa época que é constrangedora.

    http://www.youtube.com/watch?v=Y37HRrdVzTk&feature=related

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  3. Sim, Marco... assisti ao vídeo e a banda realmente soa muito estranha, perdida... tirando o Stephen Priestly, que parece estar se divertindo pacas, com todos os cacoetes de um bom discípulo de Eric Carr e Tommy Lee.

    Não avalio o "Cold Lake" como um álbum de hard rock, glam metal ou o que valha, mas como um álbum de música, apenas isso. Ao mesmo tempo que não o comparo com "To Mega Therion" e "Into the Pandemonium", também não o comparo com "Dr. Feelgood", "Invasion of Your Privacy" ou "Long Cold Winter". Avalio apenas pelo que sai do disco, e várias músicas soam legais para mim.

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  4. O disco do Triptykon é sensacional. Pra mim, até agora, o melhor do ano. Ele não saiu nacional ainda, certo?

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  5. Entendo o seu enfoque Diogo, aliás foi por isso que eu comecei colocando que respeitava a sua opinião. Achei interessante a sua observação, não é sempre que se encontra alguém que genuinamente goste do Cold Lake, um dos álbuns mais polêmicos da história do Metal, se não for "o" mais polêmico.

    Por outro lado, falar sobre o Eparistera é ser redundante, tamanha a qualidade do disco. Clássico instantâneo.

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  6. Em se tratando de um disco avaliado apenas por fatores intrínsecos à sua produção, o "Cold Lake" corre sim o risco de ser o mais polêmico da história do heavy metal. Digo isto pois, citando outro exemplo de disco polêmico, o "St. Anger" (Metallica), este teve toda a repercussão negativa por uma série de fatores extrínsecos ao disco em si, como a saída de Jason Newsted da banda, o fato de James se internar em uma clínica, a gravação do vídeo "Some Kind of Monster" contando com a presença daquela espécie de analista, sem contar o fato do Metallica ser uma banda gigante, o que acabou atraindo muito a atenção da imprensa não-especializada.

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