Nas Paredes da Pedra Encantada: psicodelia brasileira na tela grande!


Por Leonardo Lichote

Inscrições rupestres misteriosas, mitos indígenas, boas doses de psicodelia, uma busca para reconstruir as obscuras origens de uma lenda da música brasileira. O roteiro tem elementos que parecem moldados para a ficção, algo como um Indiana Jones lisérgico. Mas Nas Paredes da Pedra Encantada, filme de Cristiano Bastos e Leonardo Bonfim, é um documentário - um "road doc", como define Cristiano, que investiga a história do disco Paêbirú, de Zé Ramalho e Lula Côrtes, lançado em 1975.


"Há vários motivos para se falar de Paêbirú", defende Cristiano. É o disco mais caro do Brasil, sua última cotação está entre R$ 4 mil e R$ 5 mil, o dobro do Louco por Você, o primeiro de Roberto Carlos (existe uma edição pirata, em vinil, de Paêbirú, lançada na Europa, mas que não vem com o livro que acompanhava o original, trazendo estudos sobre a região e informações sobre a lenda do caminho da montanha do sol). "Mais que a raridade, ele é o fundador de uma psicodelia genuinamente brasileira, com elementos da cultura indígena. E sua história tem toda uma mística. Das únicas 1.300 cópias da prensagem original, 1.000 foram perdidas numa enchente no Recife", completa o cineasta.


Jornalista, Cristiano tomou contato com a fantástica história quando fez uma reportagem para a revista Rolling Stone sobre o disco. Quando percebeu que sua apuração poderia render um documentário, se lançou com Leonardo Bonfim na aventura de tentar reconstituir os fatores que permitiram o surgimento do álbum.

O termo aventura não é exagero. Cristiano morou entre Pernambuco e na Paraíba por três meses, investiu dinheiro do seu bolso no filme - atualmente em fase de montagem - e penou para encontrar seus personagens. Mais que isso, quase foi preso durante as filmagens. "Estávamos na cidade do Ingá do Bacamarte (município da Paraíba onde se localiza a Pedra do Ingá, onde estavam as inscrições que serviram de estopim para o processo criativo que gerou o disco), quando a polícia nos abordou, com vários carros e armas apontadas para nós. Estava havendo uma onda de assaltos a bancos na região, e eles acharam que éramos ladrões. Tivemos que ser libertados pelo prefeito, que sabia do projeto e colaborou com dinheiro para as filmagens".

O filme traz entrevistas com personagens como os músicos Lula Côrtes e Alceu Valença (que toca no disco), o arqueólogo Raul Córdula (que apresentou a Pedra do Ingá a Lula e a Zé Ramalho) e a cineasta Kátia Mesel (companheira de Lula então e sócia dele no selo Abrakadabra, que lançou o disco). As gravações registram muitos momentos musicais espontâneos e até cenas que reforçam as lendas do disco.


Zé Ramalho - que até hoje visita a Pedra e acredita que extraterrestres estão por trás de suas inscrições - não dá depoimento para o filme. Mas autorizou os diretores a usar todas as músicas para contar a história. "Existe uma rusga entre Zé e Lula, e ele preferiu não falar sobre o álbum. Mas todos no filme falam dele com muito carinho", nota Cristiano. "Apesar de negar a entrevista, Zé foi gente fina, fez um documento liberando a música".

Segundo os diretores, o cantor se pergunta por que não falaram do disco quando ele foi lançado (o álbum foi completamente ignorado na época). "Aquilo foi muito decepcionante. Além de tudo, Zé Ramalho considera a obra que ele fez solo, posteriormente, muito mais importante", emenda Cristiano. Como o disco tinha um aspecto coletivo, ele ali não tem o peso de ser o portador da mensagem, é só mais uma das vozes.

Mesmo antes da finalização, os diretores já receberam convites para apresentar o filme em festivais. "Nosso desejo é estrear no É Tudo Verdade", diz Cristiano. "Seria ótimo também ter a exibição na TV, num espaço como o Canal Brasil". Para tanto, eles contam com a força da história. E os poderes de Sumé.

(agradecimento especial ao leitor Izaias Arruda pela dica)

Comentários

  1. Documentário que terá de ser assistido obrigatoriamente, não só pela qualidade que com certeza terá, mas também pela importância do disco na música nacional.

    Tomara chegue logo ao circuito comercial...

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  2. O documentário deve ser interessantíssimo, mas eu não gosto muito do Paêbirú, prefiro os discos solo do Zé Ramalho.

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  3. Que isso Ricardo, o Paêbirú é um dos melhores discos de progressivo do mundo. Psicodélia nordestina aliada á música progressiva mundial rendeu um belo trabalho que mereçe ser relançado com pompa e circustânçia. Dê mais uma chance pois ele merece. E a discografia de Zé Ramalho é exemplar tb. São poucos os deslizes deste conterrâneo de Brejo do Cruz.Quanto ao documentário estou louco para assistir.

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  4. O pior deslize da carreira de Zé Ramalho é a versão que ele fez de "Knocking on Heaven´s Door", do Bob Dylan. Bate, bate, bate na porta do céu o caralho ... hehe ...

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  5. O pior é que tem piores Ricardo...
    O disco "De gosto, de água e de amigos" é trsite de tão ruim, faz essa versão parecer uma das clássicas versões de Roberto e Erasmo.

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  6. Ah, eu já penso ao contrário, meu negócio mesmo é o Paêbirú, a carreira solo do Zé Ramalho pra mim tem mais baixos do que altos.
    Fantástico, lindo, maravilhosa, transcedental essa iniciativa! faço questão de ir na pré-estréia, o que for, compro ingresso antecipado! tô nessa!
    Isso me deixa muito feliz e otimista, é o Brasil caminhando pra deixar de ser um país sem memória.
    Abraço a todos!
    Ronaldo

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