A caçada infinita


A mente de um colecionador funciona de maneira curiosa. Além de obter os itens que deseja, de organizar a sua coleção frequentemente e de ouvir seus discos, quem coleciona CDs, LPs e outros formatos possui também uma característica em comum: a caçada constante por novos títulos.

Faz parte da personalidade de pessoas como eu e você deixar o alerta sempre ligado em busca de novos discos. Sabemos exatamente onde estão as lojas e sebos ao nosso redor, conhecemos seus acervos mais profundamente que seus próprios donos, e reservamos um tempo semanal para garimpar novos "soldados para nossos exércitos sonoros". E isso vale também para o mundo online, com sites devidamente favoritados e que recebem visitas quase diárias.

Uma das coisas que mais curto aqui na minha Collectors Room é sentar, tomar um café e colocar um CD pra rodar. De maneira completa e sem pular nenhuma faixa, obviamente, pois é assim que se ouve um álbum. Por mais que muitos não acreditem nisso, os discos foram feitos para tocar (no player e com as mãos) e não para ficarem expostos na estante como troféus inacessíveis. Eles precisam respirar, viver e entregar as músicas que carregam, essa é a sua função.

E o outro ponto emocionante desse mundo do colecionismo é a busca quase inconsciente por novos títulos, a caçada infinita por novos álbuns. No meu caso, em que vivi grande parte da adolescência e da vida adulta tendo as lojas de discos como santuários sagrados, visitar esses pontos de venda ainda é um hábito que mantenho. Claro que o fato de morar em uma cidade que possibilita isso é reconfortante, e sei que muitos municípios pelo Brasil já não possuem lojas de discos há anos, o que me entristece. Porém, sair sem rumo e sem objetivo definidos e apenas visitar as lojas, folhear os CDs e ver o que aquela semana reservou para os meus ouvidos é algo que, só de pensar, faz o coração bater mais forte. E é uma pena que toda uma geração, e as futuras, não saibam o que é sentir a emoção dessa caçada sonora.

Ir em um busca de novos itens, ser surpreendido por aquele disco que você não via há anos e sempre quis, chegar em casa e colocá-lo para tocar: essa sequência de acontecimentos é vital para manter o sentimento único do colecionismo sempre vivo. Pelo menos para mim – e tenho certeza que para muitos de vocês também.


Comentários

  1. Você resumiu nesse texto boa parte do que foram os primeiros trinta anos da minha vida. Depois disso, veio casamento, família, contas pra pagar, e ficou quase impraticável manter o hábito de garimpar lojas e sites. Coleções de bandas que eu acompanhava avidamente, lancamento por lançamento, foram ficando defasadas com o tempo. Veio a mudança de residência e, entre quartos de crianças para decorar e cozinha para montar, a grana ficou curta e o MEU espaço na casa foi ficando para depois. Quando finalmente consegui organizar minimamente meu canto aqui em casa, os CDs já tinham ficado três anos encaixotados. Abrir tudo aquilo e recolocar em minha vida deveria ser algo prazeroso e muito esperado. Mas não foi tanto quanto eu esperava. Aquilo tudo não representava mais aminha realidade. "Apenas uma crise", pensei, e tratei de remontar as coidas, exatamente como eram no passado. Passado: essa é a palavra. Não há mais aquele sentimento, aquela excitação do passado. Não havia mais aquela vontade de correr atrás do tempo perdido.
    Algumas bandas que antigamente eu ficava de plantão na frente da loja para comprar o novo CD, hoje em dia já lançaram mais 4 ou 5 álbuns e não me dei sequer o trabalho de ouvir no Spotify.
    Os anos de renúncia pessoal em prol dos interesses da família vobratam um preço: a magia da música se foi. Eu tento, ponho as velhas bandas para ouvir, algumas delas ainda me dão algum prazer, enquanto outras hoje ne ferem os ouvidos. Não queria que tudo terminasse assim. Ainda insisto.
    Mas fica difícil concentrar apenas na música, quando seus intérpretes vivem dando declarações imbecis, que vão contra os valores que abracei.
    Olho para a parede, ainda lotada de Cds do passado e vejo que aquilo não representa mais quem sou. Parece que estou olhando um velho álbum de fotos amareladas que mostram o quanto fui diferente no passado.
    Mas, sou teimoso. Continuo tentando. Quem sabe, um dia amagia volta...

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  2. Para mim o mais importante sempre foi a música! Ouço mais música hoje do que sempre ouvi e tenho acesso a artistas e gêneros que nunca pensei que teria, então como vou reclamar disso? Com as mudanças que ocorreram na sociedade, coisas que para mim eram importantes desapareceram ou perderam o sentido. Garimpar discos em sebos charmosos, velhos e empoeirados, passar o dia jogando conversa fora com o pessoal de sua loja de discos favorita, reunir a galera para ouvir aquele lançamento na surrada fita K7, isto feliz ou infelizmente, faz parte do passado e se feito hoje por mim seria como mero "exercício de nostalgia". Evidente que escrevo isso com uma grande dose de melancolia, mas a vida é assim e agora entendo perfeitamente as palavras, certas ou não, que meu avô me dizia quando eu era criança: "meu neto, o mundo em que cresci e envelheci não existe mais!".

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  3. Fala, Ricardo. Cara, tomar café pela manhã e ouvir disco é uma lei aqui em casa.

    Apesar de eu ter loja, infelizmente eu costumo encomendar muito nela ou comprar online, por conta sãs promoções. Isso se deve porque a minha coleção é recente, vc já viu no vídeo.

    Agora se tem algo que me deixa muito feliz é ficar as vezes um bom tempo sem ouvir um disco ou artista, e do nada bate aquela vontade ouvir e você lembra: tenho essa mídia.

    Nossa, impagável essa sensação.

    Grande abraço!

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