Review: Oceans of Slumber - Winter (2016)


Podemos definir o contraste como a oposição entre coisas, eventos ou pessoas, cujas diferenças acabam fazendo uma sobressair à outra. Um conceito que intensifica as diferenças, e que possui efeito recíproco. Na música, esta ideia de confrontar lados opostos é recorrente. Jimmy Page, por exemplo, denominou-a como “luz e sombra”, explicando os momentos de explosão sonora do Led Zeppelin, frequentemente seguidos de trechos mais calmos e contemplativos. Tony Iommi fala em sua biografia da necessidade intrínseca de uma boa composição possuir movimentos variados, que contrastem entre si e, dessa maneira, produzam momentos de destaque.

No heavy metal, uma das interpretações mais comuns para essa abordagem foi traduzida no que muitos começaram a chamar de o confronto entre a bela e a fera, que nada mais era do que uma linda vocalista com voz limpa e suave dividindo os vocais com um cantor com timbre gutural. Exemplos temos aos montes: Theatre of Tragedy, Lacuna Coil e um sem fim de bandas que acabaram associadas, em sua maioria, às cenas do metal gótico e sinfônico. Uma fórmula que chegou ao ponto de saturação nos anos 2000, forçando as bandas a procurarem outros caminhos.

É aí que chegamos ao Oceans of Slumber. A banda norte-americana, formada em Houston em 2011, lançou o seu disco de estreia, Aetherial, em 2013. A sonoridade da estreia pode ser classificada como uma espécie de prog groove metal, uma música original que colocava no mesmo caldeirão influências de Meshuggah, Hammers of Misfortune e Leprous. 

Só que a coisa mudou de figura. Ronnie Allen, o vocalista, saiu. Para seu lugar, a banda chamou Cammie Gilbert. Saiu uma voz masculina, entrou uma feminina. Além disco, o tecladista Beau Beasley se juntou ao grupo, abrindo novas possibilidades de arranjos e caminhos sonoros. Winter, segundo álbum do agora sexteto, reflete esse novo momento. A música soa diferente com Cammie e Beau. Está menos grooveada, menos agressiva, mais contemplativa. Ainda é heavy metal, só que com mais profundidade e mais experimentação. A banda saiu da pancadaria e adentrou um mundo construído por sonoridades sutis e elegantes, que mostra uma maturidade e uma evolução absolutamente incríveis em relação ao disco anterior.


A bela voz de Cammie Gilbert é um dos elementos principais do Oceans of Slumber. Mas o que isso tem a ver com todo aquele papo sobre contraste lá do início do texto? Um dos guitarrista faz as vezes da fera, encaixando vocais guturais aqui e ali, realçando a beleza e a agressividade, o claro e o sombrio, a luz e a sombra, trazendo refrescância a um conceito para muitos já batido e estagnado.

O principal trunfo de Winter, no entanto, passa longe disso. A união dos músicos produziu um álbum com uma sonoridade que traz toda a magia da melancolia, amparada aqui por bem encaixadas doses de peso. Essa característica tem como protagonista principal a voz de Gilbert, que, não canso de falar, é magnífica. Mas por trás dela temos a banda mandando ver no instrumental, que se comporta como movimentos de uma sinfonia, de uma orquestra. Há desde dedilhados até blast beats, demonstrando a amplitude do universo sonoro explorado pelo Oceans of Slumber.

O trabalho de composição é inspirado, bem pensado, inteligente. As canções são genuinamente lindas e tem a capacidade de pausar o seu dia a dia, tirando o ouvinte do cotidiano. É algo tão intenso que fica até difícil de colocar em palavras. Algo tão bem executado que um clássico como “Nights in White Satin”, gravado originalmente pelo Moody Blues em 1967, soa totalmente integrado às criações da própria banda em Winter, como se tivesse surgido do mesmo processo criativo que deu à luz ao álbum.

Winter é um melhores álbuns não apenas de metal, mas de música de modo geral, que ouvi nos últimos anos. A nota máxima aqui vai muito além de uma simples avaliação: ela tem o papel, a função, de instigar a curiosidade de cada leitor em relação ao trabalho. Trata-se de um disco especial e único, e que faz por merecer todos os elogios já ditos e os que ainda virão.

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